Era para ser uma viagem sem sobressaltos e grandes surpresas. Criada no final de 2011, a Brasil Travel consistia de uma holding que reunia 35 grupos de turismo brasileiro, com presença em 21 Estados e mais de 12 mil agentes independentes de viagem. Juntas, essas empresas haviam sido responsáveis por um volume de vendas de R$ 3 bilhões nos nove primeiros meses de 2011 e emitido três milhões de passagens aéreas. Era um desempenho e tanto, superior inclusive ao da CVC, fundada pelo empresário curitibano Guilherme Paulus na década de 1970 e controlada atualmente pelo fundo de private equity Carlyle. Tal resultado a colocava na 23ª posição no mundo, segundo o ranking da Euromonitor International. 

 

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Pedro Guimarães, presidente do Conselho da Brasil Travel: “eles (investidores) querem a consolidação antes de ir para a bolsa”

 

Com todos esses atributos, a abertura de capital (IPO, da sigla em inglês) era um caminho natural. E foi. Em fevereiro deste ano, a Brasil Travel fez uma oferta que poderia chegar a R$ 1,4 bilhão, considerando-se a faixa de preço máximo da operação. Mas os investidores não se interessaram pelos papéis da nova companhia e a emissão de ações foi cancelada. “Ninguém tinha parâmetro”, afirma Pedro Guimarães, presidente do conselho da Brasil Travel e idealizador do negócio, alegando que houve dificuldade do mercado em chegar a um preço justo para as ações da empresa pelo fato de não haver outra empresa de turismo naquele momento na Bolsa de Valores – o IPO da CVC, previsto para o primeiro semestre de 2012 também não foi adiante. 

 

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Com a desistência do IPO, a Brasil Travel começa uma segunda viagem em sua recente trajetória – desta vez, cheia de turbulências pelo caminho. Dos 35 grupos de turismo iniciais, restam agora apenas 20. Em nove meses, a companhia teve dois CEOs diferentes. Edmar Bull, sócio-diretor da Copastur e de mais duas outras empresas que se uniram à Brasil Travel, que havia assumido a operação em maio deste ano, no lugar de Paulo Castello Branco, que já deixou o cargo e a sociedade. “Os interesses comerciais já não eram mais os mesmos”, diz Bull. DINHEIRO procurou diversas empresas que deixaram a holding. A maioria prefere não comentar o projeto e as razões pelas quais desistiram de fazer parte da Brazil Travel. 

 

Algumas delas, no entanto, deixam clara a insatisfação pelo rumo tomado após o cancelamento da abertura de capital. Uma delas é a Costa Brava Turismo, de Campinas, interior de São Paulo, com foco em viagens corporativas. “Antes, trocaríamos metade das ações, abriríamos capital e receberíamos parte do dinheiro captado”, afirma Mauro Schwartzmann, fundador da agência. “No segundo momento, passaríamos 100% para a holding, não haveria dinheiro para os acionistas e apenas uma promessa de IPO.” De acordo com Schwartzmann, os interesses de sua empresa acabaram travados pela holding e, por uma decisão familiar, ele resolveu deixar a holding. 

 

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Mauro Schwartzmann, presidente da Costa Brava Turismo: “num segudo momento,

havia apenas uma promessa de abrir o capital”

 

Essa é a mesma situação da VTC Viagens, de Santa Cataria. “Ali ninguém era mais dono”, diz Maurício Voss, presidente da agência. Todas as empresas que saíram nessa segunda fase tiveram de pagar multa contratual, mas não revelam o valor do prejuízo que tiveram. O modelo de negócio da Brazil Travel é conhecido pelo jargão do setor de “roll-up”. O objetivo é transformar donos de pequenos negócios em sócios minoritários de uma grande empresa. Geralmente, nessas negociações, não há dinheiro envolvido. Um grupo financeiro ou um fundo de private equity decide criar uma holding, prospecta o mercado e convida empresas a participar do novo negócio em troca de uma participação. 

 

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O argumento usado para convencer os potenciais parceiros é baseado numa expressão popular: “Antes rabo de baleia do que cabeça de sardinha.” Essa estratégia já deu certo em vários negócios no País, como a Brasil Brokers, união de 26 imobiliárias, e a Brasil Insurance, reunião de 43 corretoras de seguro (veja outros exemplos no quadro ao final da reportagem). Criadas pelo fundo de investimento Gulf, elas abriram o capital em 2007 e 2010, respectivamente. Em alguns casos, quando o IPO não acontece, essas holdings deixam de existir sem nenhum prejuízo para os sócios minoritários. Esse não é pelo menos o plano de Guimarães, ex-sócio do BTG Pactual, que idealizou o projeto da Brasil Travel. 

 

De acordo com ele, a preocupação no momento é fazer a fusão das empresas que ainda fazem parte da holding. Com isso, a companhia poderia ser vendida para um fundo de investimento ou mesmo retornar o projeto de abrir o capital. “Foi isso que o mercado sinalizou”, afirma Guimarães. “Eles querem a consolidação antes de ir para a Bolsa.” O foco atual é reduzir custos e criar uma rede de abrangência nacional. O número menor de subsidiárias também não é considerado um problema, na visão do presidente do conselho da Brasil Travel. “Os investidores acharam 35 empresas um número muito alto”, diz Guimarães. No ano passado, o mercado turístico brasileiro movimentou R$ 238,5 bilhões, de acordo com o Ministé­rio do turismo, o que corresponde a 3,7% do Produto Interno Bruto (leia mais sobre Turismo na entrevista do ministro Gastão Vieira). 

 

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