A família Feffer ergueu um império industrial, com receita anual de R$ 4,5 bilhões, a partir de uma pequena tipografia no centro de São Paulo. Fundada em 1924, pelo imigrante ucraniano Leon Feffer, a Suzano Papel e Celulose começou suas operações através da revenda de papéis nacionais e importados, utilizados como insumo para cartões de visita, blocos para anotações e papel-carta. Quase 90 anos depois, o grupo está prestes a rever, literamente, o seu papel. A companhia confirmou, na segunda-feira 19, que não descarta a hipótese de vender ativos da área de papel ou ainda participações nos novos projetos de celulose, setor do qual é a segunda maior empresa do País, logo após a Fibria, do grupo Votorantim. Essas unidades estão sendo erguidas no Maranhão e no Piauí e deverão consumir investimentos da ordem de  R$ 5,9 bilhões. A necessidade de fazer uma correção de rota se deve à administração conservadora das finanças da família Feffer. No estatuto da empresa consta que os gestores da companhia têm de manter o nível de endividamento abaixo do patamar de 3,5 vezes o Ebitda (receita excluindo juros, taxas, depreciações e amortizações). 

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Maciel Neto, CEO da Suzano: “Estamos sendo punidos pelo mercado porque estamos investindo”

E isso está próximo de acontecer. Até 2013, a Suzano prevê desembolsos de R$ 9,7 bilhões, sem considerar a totalidade dos aportes necessários à operação na fábrica de celulose do Piauí, cuja decisão de compra de equipamentos foi postergada para o início de 2014. Ao mesmo tempo, a empresa terá de amortizar R$ 3,34 bilhões em dívida de curto prazo, para respeitar o limite de endividamento. “Nosso plano de crescimento é consistente e leva em conta um horizonte de longo prazo, típico do setor”, disse Antonio Maciel Neto, CEO da Suzano, em entrevista exclusiva à DINHEIRO. Para ele, alguns analistas estão fazendo uma leitura errada dos números da companhia. Para sustentar sua tese, Maciel Neto cita dados do balanço do trimestre encerrado em junho. “Dispomos de R$ 3 bilhões em caixa e todos os projetos estão lastreados em uma equação financeira sustentável”, afirma. 

 

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A dinastia empresarial da Suzano: David Feffer (à dir.), presidente do conselho,

é quem define a estratégia do grupo erguido pelo avô Leon e o pai, Max (centro) 

 

Esse discurso otimista de Maciel Neto, no entanto, não foi suficiente para impedir um duro golpe. Na quarta-feira 21, a agência americana de classificação de risco Moody’s Investors Service colocou em  análise, para possível rebaixamento, a nota dos papéis da Suzano. A medida caiu como uma bomba sobre o mercado. No dia seguinte, a ação da companhia caiu 7,92%, encerrando o pregão cotada a R$ 9,07, na Bolsa de Valores de São Paulo. Os analistas da agência negam qualquer relação entre a decisão de revisão da nota e o fato relevante divulgado pela Suzano, no dia anterior, no qual defendia sua estratégia de crescimento. “Nosso trabalho consiste em acompanhar e monitorar continuamente as empresas e já vínhamos notando que seria necessário revisar o rating da Suzano”, diz Brian Oak, diretor da Moody’s, baseado em Nova York. “Mais que julgar se é certo ou errado o que a empresa está fazendo, vamos procurar entender a lógica de seu plano de crescimento.” 

 

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À venda? Parte da divisão de papel, que contribui com quase 60% das receitas da Suzano, pode ser vendida para melhorar o caixa

 

Diante disso, cabe a pergunta: como a Suzano vai crescer? “Nosso futuro inclui as áreas de celulose, papel, energia e biotecnologia”, afirma Maciel Neto. A companhia, no entanto, já tem até uma lista dos possíveis ativos que pode se desfazer. Um deles é a fatia de 17,9% que detém na usina hidrelétrica Amador Aguiar, em Minas Gerais. A empresa também deve desfazer-se de  terras que possui em São Paulo. Outra alternativa para aliviar a necessidade de desembolso de recursos é a atração de parceiros estratégicos nas áreas de celulose e na Suzano Energia Renovável. A empresa deverá consumir US$ 1 bilhão e vai produzir pellets (partículas desidratadas e prensadas de madeira moída) para sistema de cogeração de energia, por meio da queima de biomassa. Caso se decida pela venda dos ativos de papel, uma das meninas dos olhos do clã Feffer, a Suzano não teria dificuldades de encontrar compradores, mesmo em um momento de crise global. “Se essa for a opção, haverá interessados dispostos a pagar um preço justo por seus ativos”, afirma o diretor da Moody’s. “Até porque o mercado brasileiro continua sendo atraente para quem atua neste nicho em nível global”. 

 

O executivo da Suzano diz que ainda é cedo para bater o martelo. Maciel,  no entanto, enumera as vantagens competitivas dos ativos da companhia nesta área, que inclui a Conpacel, comprada por R$ 1,45 bilhão no final de 2010. Com isso, passou a dominar 36% do setor. “Temos o portfólio mais amplo do mercado, que inclui produtos que não perderão valor com o avanço da era digital”, afirma. Na lista está o papel-cartão para embalagem de alimentos e remédios, item no qual a Suzano diz deter uma fatia de 50% do mercado. A decisão terá de passar pelo crivo de David Feffer, neto de Leon e presidente do Conselho de Administração da Suzano. A mudança de humor dos investidores em relação à Suzano, na verdade, começou após a apresentação do balanço do segundo trimestre deste ano. Isso porque tanto seu lucro (de R$ 103,6 milhões) quanto seu Ebitda (R$ 331 milhões) ficaram abaixo do esperado por analistas consultados pela agência Reuters.

 

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A explicação se deve, em parte, à continuidade na queda dos preços da celulose, cuja tonelada está cotada, em média, em US$ 736, valor 59% menor em relação ao mesmo período de 2010. O complicador, nesse caso, é que a expectativa de recuperação no curto e médio prazos é pequena. Os planos do setor de construção de novas fábricas no Brasil, que deverão consumir US$ 20 bilhões, no período 2011-2021, colaboram para aumentar a oferta desta matéria-prima, de acordo com Oak, da Moody’s. Por  outro lado, as vendas de papel, restritas ao mercado interno, correm o risco de encolher, devido ao acirramento da concorrência, com a maior entrada de produtos importados da China, e ao desaquecimento da economia brasileira. A celulose é vital para a sobrevivência da Suzano, pois representa 42% de suas receitas. O restante é obtido com a venda de papel. “Estamos apanhando do mercado porque estamos investindo muito”, afirma Maciel Neto.

 

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Colaborou Rafael Freire