Administrar a marca Serasa no Brasil não é tarefa fácil. Fundada em 1968 pela Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) como uma prestadora de serviços que cadastrava os maus pagadores, ela tornou-se a líder no mercado de proteção ao crédito, com um faturamento de R$ 2 bilhões. No entanto, esse mérito é pouco reconhecido. O motivo é simples: ninguém gosta de entrar em contato com a Serasa, especialmente o consumidor que recebe um aviso de que seu nome está na lista dos caloteiros conhecidos na praça. Isso é um problema para o grupo irlandês Experian, que comprou 70% da Serasa em 2007 por US$ 1,2 bilhão e pagou mais US$ 1,5 bilhão pelas ações restantes em 2012.

Desde então, os irlandeses têm suado a camisa para mudar a percepção do público em relação à marca. Esse esforço entrou em uma nova fase em maio, com a chegada do engenheiro carioca José Luiz Rossi, 54 anos, à presidência da companhia, em substituição a Ricardo Loureiro. Com 30 anos de experiência no setor de tecnologia, Rossi tem passagens por companhias como IBM e PwC e desde 2009 comandava a consultoria francesa Capgemini no Brasil. “Queremos que o mercado deixe de nos enxergar como os vilões da história”, diz ele à DINHEIRO, em sua primeira entrevista após assumir o cargo.

“Nosso papel não é impedir o acesso dos clientes ao crédito e, sim, melhorar a qualidade dos empréstimos.” Seu maior objetivo é fazer com que a Serasa passe a ser reconhecida como uma prestadora de serviços de tecnologia corporativa. Atualmente, 80% do seu negócio ainda vem das áreas de crédito. Os 20% restantes distribuem-se por certificação digital, combate a fraudes e pesquisas em suas bases de dados para produzir inteligência empresarial. “Vamos aumentar nossa participação em produtos e serviços para empresas, aproveitando a estrutura da Experian”, diz Rossi.

A estratégia está clara para ele. Nos próximos cinco anos, serão desembolsados R$ 25 milhões para instalar um laboratório de pesquisas em São Paulo, dedicado a mapear tendências e a desenvolver produtos e serviços. Será o terceiro centro de inovação da Experian no mundo – os outros estão no Vale do Silício, na Califórnia, e em Londres. “Esse centro nos tornará cada vez mais uma empresa de big data”, diz Rossi, referindo-se à análise de quantidades maciças de informação para detectar tendências de mercado. Os próximos lançamentos deverão ser um sistema antifraude desenvolvido na Califórnia e que está sendo adaptado ao Brasil desde junho.

Denominado Safety, o sistema é capaz de analisar dados como localização e histórico de transações de um cartão de crédito, para detectar se o plástico foi clonado por um pirata digital. O primeiro cliente a utilizar o serviço será um grande banco, cujo nome Rossi não divulga. “Esse serviço é destinado a grandes empresas que lidam com transações financeiras volumosas.” Todos os anos, os crimes cibernéticos lesam cerca de 22 milhões de brasileiros e causam um prejuízo estimado de R$ 2,3 bilhões. A nova ferramenta mostra que a Serasa quer mudar, mas não tanto.

A entrada nesse novo mercado só foi possível atuando em parceria com os clientes habituais. “Nosso foco inicial foi se aproximar do cliente pessoa física por meio de educação financeira e realizando os feirões. Agora, vamos nos estabelecer entre os clientes corporativos”, afirma o presidente. Parte dessa guinada estratégica também decorreu da necessidade. A Serasa, como os demais birôs de crédito, contava com as receitas do cadastro positivo, que foi regulamentado pelo governo em 2012 e entrou em vigor em agosto de 2013.

Lançado como uma ferramenta gerencial que poderia reduzir o risco dos empréstimos e baixar os juros no Brasil, o cadastro positivo não pegou, principalmente devido à baixa adesão dos bancos. Empresas cadastradoras como a Serasa tiveram de conquistar clientes individualmente e em seu banco de dados há apenas um milhão de nomes, base insuficiente para tornar o cadastro lucrativo. “Seriam necessários 30 milhões de nomes para o cadastro funcionar”, diz Rossi. “Neste momento estamos em uma fase de testes, entendendo o comportamento do consumidor, mas ainda precisamos de volume para que o mercado possa aderir.”

Todos os esforços de Ricardo Loureiro, que presidiu a empresa entre 2010 e maio passado, foram dedicados ao cadastro positivo. A redução da ênfase no projeto fez a empresa demitir mais de 200 funcionários em setembro de 2013. Agora, Rossi quer reverter esse quadro. A Serasa Experian terá de enfrentar não só concorrentes habituais como recém-chegados a esse mercado. A BoaVista SCPC, fundada a partir do Serviço de Proteção ao Crédito mantido pela Associação Comercial de São Paulo, também estuda os mesmos segmentos estratégicos e pretende entrar com força nessas áreas nos próximos anos.

“Investimos 30% de nosso faturamento em tecnologia e no desenvolvimento de novos produtos. Porém, temos muito o que crescer. Apenas 20% da nossa receita vem dos serviços corporativos, o restante ainda é da área de crédito”, diz Dorival Dourado, presidente da Boa Vista SCPC. O objetivo do executivo é que essa fatia represente 70% do negócio nos próximos três anos. “Cada vez mais seremos uma empresa de big data e engenharia da informação”, diz ele.

Atualmente, o mercado de prevenção a fraudes é dominado por gigantes multinacionais, como a americana Symantec, que já utilizam o big data no combate às fraudes. E vem sendo testado por companhias pequenas, como a mineira Cercred, especializada em recuperação de crédito empresarial. Leonardo Coimbra, sócio da empresa, diz que a Cercred está investindo R$ 4,5 milhões na inauguração de uma nova unidade de tecnologia, no Rio de Janeiro. “Esse mercado está em um nível tão exigente de política de segurança e tecnologia que precisamos cada vez mais de investimentos”, afirma.