10/10/2012 - 21:00
Demorou, mas aconteceu. A tão aguardada retomada industrial já está em curso no Brasil e a sua intensidade, daqui para a frente, dependerá da maturação das medidas adotadas pelo governo e dos rumos da economia mundial. Na terça-feira 2, o IBGE anunciou o crescimento de 1,5% na produção industrial de julho para agosto, o melhor resultado em 15 meses. E mais: 20 dos 27 segmentos pesquisados mostraram reação. Esse cenário de alívio, agora oficialmente mapeado, já havia sido antecipado há dois meses na edição 774 da DINHEIRO, na matéria “Queima de Estoque”, mostrando que a desova de mercadorias era um prenúncio da reativação do setor produtivo.
De lá para cá, a indústria nacional assumiu a recuperação que, embora não seja suficiente para salvar o ano de um resultado negativo – a projeção é de fechar 2012 com queda acumulada de 1,9% –, gera perspectivas alvissareiras para 2013. “Deixamos para trás o período de crescimento fraco, agora o crescimento começa a acelerar e vai nessa direção até o fim do ano”, disse o ministro da Fazenda, Guido Mantega, na terça-feira, em Brasília, repercutindo os números do IBGE. É exatamente esse ciclo econômico – morno no início do ano e mais aquecido agora no final – que a Furukawa, fabricante de fibra ótica para os setores de telecomunicações e tecnologia da informação, no Paraná, está vivenciando.
A busca da indústria brasileira por mercados em outros países
já mostrou reflexos positivos na balança comercial
Em janeiro, predominava o otimismo, com uma previsão de crescimento de 10% do faturamento. Logo nos primeiros meses, no entanto, veio a constatação de que a economia não teria a expansão de 4% a 5% prevista pela maioria dos analistas e, portanto, a empresa teria de adequar os planos para um crescimento da receita em torno de 3%. “Felizmente, agora, uma série de projetos de TI e Telecom está sendo desengavetada no mercado”, diz Foad Shaikhzadeh, presidente da Furukawa no Brasil, que investiu US$ 20 milhões neste ano para aumentar a capacidade de produção de cabos em 70%. “A proximidade dos eventos esportivos nos dá a garantia de que esses setores crescerão daqui para a frente.”
Para driblar o mercado interno mais tímido dos últimos meses, a Furukawa aproveitou a desvalorização do real e buscou clientes na América do Sul. O câmbio, aliás, tem sido a válvula de escape de outros setores, como o dos fabricantes de ônibus e carrocerias, que ainda não estavam encontrando uma demanda aquecida no Brasil. “O dólar a R$ 2 ajudou a devolver a competitividade às empresas”, diz José Fernandes Martins, presidente da Associação dos Fabricantes de Ônibus (Fabus) e vice-presidente da montadora de ônibus Marcopolo. A desoneração da folha de pagamento e a política de compras governamentais também beneficiaram a retomada do setor.
Foad Shaikhzadeh, presidente da Furukawa: ”uma série de Projetos
de Telecom e Ti está sendo desengavetada no mercado”
“Se não fossem essas medidas, estaríamos vendendo 15% menos”, diz. A busca da indústria por mercados em outros países já mostrou reflexos positivos na balança comercial. Segundo o Ministério do Desenvolvimento (MDIC), houve um crescimento de 2,9% das exportações de produtos manufaturados no mês de setembro, na comparação com o mesmo mês do ano passado. A variação pode até parecer pequena, mas é alentadora perto da queda de 7,9% nas vendas de produtos básicos. “Os produtos manufaturados foram importantes para evitar uma queda ainda maior das exportações totais, de 5,1%”, disse Tatiana Prazeres, secretária de Comércio Exterior do MDIC, em Brasília, na segunda-feira 1º.
Embora o comércio exterior tenha ajudado o setor produtivo, o governo tem claro que a aposta principal para impulsionar a indústria ainda é o mercado interno. Além da redução dos juros pelo Banco Central, cujos efeitos começam a ser sentidos na ponta, já foram anunciados vários pacotes de estímulo ao consumo e ao investimento. Até o presente momento, no entanto, o impacto está sendo mais favorável no consumo, como é possível observar nas vendas de carros com IPI reduzido. O comércio de automóveis cresceu 7,2% de janeiro a setembro, e as montadoras já colocaram o champanhe na geladeira à espera de mais um recorde anual. Enquanto isso, as festas de fim de ano dão um impulso para os fabricantes de bens de consumo de menor valor.
José Fernandes Martns, VP da Marcopolo: ”O dólar a R$ 2
e as desonerações devolveram a competitividade às empresas”
É o caso do setor de calçados e roupas, que amargou uma retração de 5% na primeira metade do ano, mas começou a reagir com os pedidos do varejo. A Kidy, por exemplo, uma fabricante de grande porte de calçados infantis, de Birigui, no interior de São Paulo, sofreu desaceleração nas vendas no período de abril a julho. Agora, o cenário mudou. “As encomendas para o Dias das Crianças e o Natal nos fizeram voltar a trabalhar em alta velocidade”, diz Sérgio Gracia, diretor-comercial da Kidy. “Driblamos a crise com inovação e novos produtos.” O mesmo otimismo de Gracia começa a ser percebido na indústria como um todo, com os diversos sinais de retomada da produção.
Na quinta-feira 4, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) divulgou que o faturamento do setor industrial cresceu expressivos 4,8% de julho para agosto, a maior alta mensal desde fevereiro de 2011. “Os dados confirmam a expectativa de reação da indústria”, afirma Flávio Castelo Branco, gerente-executivo da CNI. O próximo passo, segundo a entidade, será uma retomada mais vigorosa do emprego, que, no acumulado do ano, registra queda de 0,3%. Esse processo já está em curso no segmento de alimentos e bebidas, que ocupa o segundo lugar no ranking das maiores contratações do ano, do IBGE. Se depender do volume esperado de negócios, o setor continuará em expansão.
Tatiana prazeres, secretária do Mdic: “os produtos manufaturados
evitaram uma queda maior das exportações”
Um levantamento do Ibope Inteligência mostra que os brasileiros, com o bolso ainda cheio, vão gastar R$ 17,75 bilhões em bebidas neste ano, uma alta de 15% ante 2011. Há um segmento industrial, no entanto, que ainda causa preocupações por ser um importante termômetro dos investimentos na economia. Trata-se do setor de bens de capital, que cresceu apenas 0,3% em agosto e acumula queda de 12,2% no ano.Por enquanto, os juros reais negativos e a depreciação acelerada de máquinas não foram suficientes para convencer os empresários a modernizar ou ampliar seu parque fabril. “O número de empresas que relatam estoques excessivos de bens de capital é o maior desde abril de 2011”, diz Rodrigo Nishida, economista da LCA Consultores.
“Por outro lado, o quadro tende a melhorar em 2013 conforme as medidas do governo, como a redução do preço da energia, forem resgatando a confiança do setor produtivo.” Esse processo já está em curso, segundo o Índice de Confiança da Indústria, da Fundação Getulio Vargas. O indicador atingiu, em setembro, o maior nível desde julho de 2011 (veja quadro abaixo). “Cabe à indústria fazer a sua lição de casa e correr atrás dos investimentos em tecnologia”, diz Rogério César de Souza, economista-chefe do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). “É a nossa competitividade que está em jogo.” Está mais do que na hora de vencer essa partida.