10/02/2023 - 0:10
Todos aguardam com muita expectativa o projeto de reforma tributária que o governo Lula promete lançar com a maior brevidade — o ministro Haddad fala em um primeiro esboço de arcabouço fiscal já para abril próximo. Ele e sua equipe procuram elaborar medidas centradas, em um primeiro momento, no controle de gastos, como forma de demonstrar a boa vontade do Executivo em colaborar no esforço geral da Nação para arrumar as contas públicas. O foco no reequilíbrio decerto não deve ser o do aumento da arrecadação. Ao contrário, a expectativa do mercado é de uma redução na carga, considerada demasiadamente elevada. Antes de agosto, o ministro precisa mesmo, obedecendo à PEC da Transição, mostrar o que o governo pretende fazer para a rearrumação do rombo. As ideias passam também por uma tentativa de substituição da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), em funcionamento há mais de duas décadas. Não apenas Lula, como os demais adversários na corrida às urnas (Bolsonaro entre eles) falaram sempre que a regra do teto dos gastos tinha ficado obsoleta, fora da realidade. Daí é crível imaginar que ela também não deve vingar daqui para frente. De todo modo, algum tipo de trava legal será necessária para impedir os impulsos de dispêndio sem freio dos seguidos mandatários. Mesmo o ministro Haddad está convencido disso. O presidente Lula, em pessoa, quer acenar com vantagens aos seus apoiadores habituais. Passou a falar em uma isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 2.640 – promessa, aliás, feita durante a campanha. Hoje a isenção vai até o limite de R$ 1.903,98 de salário mensal. Para reajustar a faixa de isenção os técnicos se dividem entre duas alternativas. A primeira seria a de atualizar toda a tabela a partir da faixa de isenção, o que mexeria com toda a cadeia de trabalhadores. A segunda possibilidade seria beneficiar apenas quem recebe até dois salários mínimos, com os demais contribuintes seguindo como está. Um levantamento da Receita Federal mostra que a permanente distorção na tabela do IR já retirou mais de R$ 100 bilhões da renda dos brasileiros apenas nos últimos 12 meses. Outro estudo recém-concluído, da Associação Nacional dos Auditores da Receita, aponta que ao menos 18 milhões de brasileiros se beneficiariam da isenção na cobrança do IR neste ano, caso a tabela fosse corrigida integralmente pela inflação desde 1996. Isso equivaleria a isentar todos aqueles com valores de renda até R$ 4.723,77. De uma forma ou de outra, a reforma tributária que brotará dessas discussões deverá reduzir os impostos sobre o consumo dos mais pobres e elevar o dos mais ricos. O recém-eleito presidente da Câmara, Arthur Lira, quer garantir o avanço da proposta que encontra-se em análise na casa. Prometeu criar grupos específicos nas próximas semanas para discutir o assunto com celeridade. A opção de um imposto como o IVA sobre o consumo é a que tem angariado mais interesse. O BNDES promete entrar no meio dos debates e, segundo Aloizio Mercadante, já elabora a sua própria proposta para contribuir no tal arcabouço fiscal. Existe muita gente envolvida nas negociações e, naturalmente, muito lobby e pressão dos setores mais poderosos interessados. O temor é que dessa pajelança saia um bicho de sete cabeças, transformando a sonhada reforma em um Frankenstein tributário.
Carlos José Marques
Diretor editorial