Uma movimentação de rabinos e pessoas vestidas de quipá toma conta diariamente da sede da construtora e incorporadora Cyrela Brazil Realty, por volta das 17 horas, na zona oeste de São Paulo. Esse é o horário da reza nos escritórios da empresa, fundada pelo judeu sírio, nascido em Aleppo, Elie Horn. Até pouco tempo atrás, toda a empresa parava por volta de 30 minutos para o ritual. Como mais de 60% de suas ações estão em mãos de fundos de investimentos e acionistas minoritários, algumas de suas tradições foram flexibilizadas, incluindo aquela em que nenhum negócio – mesmo as vendas de imóveis – podia ser fechado da sexta-feira à noite até o sábado à noite, em respeito ao shabat, o dia de descanso judaico. 

 

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Em reforma: Florêncio, vice-presidente (ao centro), e Hochman, diretor-geral para São Paulo

(nas laterais), estão em busca de novo patamar de rentabilidade

 

Esse processo de secularização da empresa é apenas uma das mudanças pelas quais ela está passando. A Cyrela está saindo de um período difícil, cujos sintomas eram a queda de 30,7% no valor de suas ações em 2011, perda da rentabilidade e atraso na entrega de obras. “Crescer com qualidade requer disciplina e estratégia, competências que estamos adquirindo nos últimos anos”, disse Horn, com um inconfundível sotaque sírio, durante conferência de resultados do terceiro trimestre deste ano com os analistas – o empresário não dá entrevistas ou posa para fotos. 

 

Em 2012, a companhia dá sinais de ter reencontrado o seu caminho. Neste ano, suas ações já se valorizaram 19%. É a sexta maior alta do setor de construção na bolsa – atrás apenas da Helbor, Eztec, JHSF, Even e Direcional, bem menores do que ela. No terceiro trimestre, sua margem bruta de lucro atingiu 30,9%, com uma projeção de bater na faixa de 34% no próximo ano. É uma evolução apreciável, se comparada com os 24,5% registrados no último trimestre de 2010. “Vamos terminar de reconhecer os resultados das safras ruins, lançadas entre 2008 e 2009, já no primeiro trimestre de 2013”, diz José Florêncio, vice-presidente financeiro da Cyrela. 

 

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Nova ortodoxia: segundo o controlador da empresa, Elie Horn, a Cyrela

está aprendendo a crescer com disciplina e estratégia

 

Além disso, a companhia recuperou a posição de maior incorporadora listada em bolsa, perdida para a PDG nos últimos dois anos. De janeiro a setembro, a empresa de Horn vendeu R$ 4,4 bilhões e alcançou um lucro líquido de R$ 459 milhões. O primeiro ponto da reformulação da Cyrela foi o abandono das metas agressivas de crescimento. A companhia chegou a prometer, para 2012, o lançamento de empreendimentos com valor de vendas de R$ 10,2 bilhões. Agora, seus executivos trabalham com uma meta na faixa entre R$ 6 bilhões e R$ 7 bilhões. “Ao nos expandirmos muito rapidamente, perdemos o nosso DNA, de entregar produtos bem elaborados”, afirma Gilson Hochman, diretor-geral para São Paulo. 

 

Os parceiros de construção, trazidos para expandir o número de projetos simultâneos, que foram incapazes de terminar as obras em tempo acertado, acabaram afastados. Das 11 joint ventures feitas pela Cyrela sobraram apenas quatro. Mas a responsabilidade pelos problemas não foi creditada apenas ao pessoal de fora. Como prova disso, a empresa mudou a sua política de remuneração variável. Anteriormente, os executivos recebiam bonificações por lançamentos feitos. A atual política prevê que elas estejam relacionadas à entrega de resultados financeiros dos empreendimentos. “O realinhamento da remuneração mostra que a empresa estava muito voltada ao fator crescimento, e não à execução”, diz Luiz Mauricio Garcia, analista do Bradesco BBI.

 

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