A modelo Isabeli Fontana viaja numa nave espacial, que se revela no formato do Museu de Arte Contemporânea de Niterói, saído das pranchetas do arquiteto carioca modernista Oscar Niemeyer. Na trilha sonora, a inspiração é o compositor alemão de óperas Richard Wagner. A combinação improvável entre Wagner e Niemeyer, dois gênios da arte de épocas diferentes, faz parte da nova propaganda de tevê da varejista Riachuelo, por sugestão de outro nome de peso, este da moda, o estilista alemão Karl Lagerfeld, fã de ambos.

O comercial tem como objetivo divulgar a coleção desenhada por Lagerfeld para a marca brasileira, que chegou às lojas na quarta-feira 27. “É provavelmente a campanha mais bonita que a gente já fez”, diz Flávio Rocha, presidente da rede. “E isso é bem conveniente, já que Lagerfeld talvez seja o nome mais importante da moda hoje.” A parceria com o estilista é um símbolo do novo momento da Riachuelo, que reformulou a sua identidade visual em 2014 para marcar a sua adesão ao modelo de negócios do fast fashion, de fazer moda de qualidade com a troca rápida de coleções e preços baixos.

A presença de 75 itens com a assinatura de Lagerfeld, que custam entre R$ 50 e R$ 350, nas lojas da rede brasileira consiste na segunda grande parceria da Riachuelo com um grande estilista – depois de Donatella Versace – e é bastante simbólica. A pioneira da fast fashion, a sueca H&M, fez a sua primeira coleção com um grande nome da moda também com o alemão, em 2004. Em poucas horas, todas as peças foram vendidas, no dia do lançamento.

Dessa forma, a varejista inaugurou a era de parcerias de empresas de varejo popular com grandes nomes da alta costura. Na época, o movimento foi polêmico porque, até então, o nome de Lagerfeld estava fortemente vinculado ao da marca de luxo Chanel. “A moda sempre foi um mundo elitista e exclusivo”, afirma Rocha. “Através de um modelo inovador, abriu-se espaço para transformar a moda em algo inclusivo, que todo mundo pode pagar, mas sem nenhuma concessão de qualidade. A escala permite combinar qualidade e bom preço.”

Agregar grandes nomes para coleções especiais completa a transição estratégica da Riachuelo para o fast fashion. “Claro que é sempre bom ter lucro em uma ação como essa, mas, mais do que isso, ela liga a marca à alta moda”, diz Amnon Armoni, coordenado dos cursos de pós-graduação em moda da Faap. O plano é esse. Segundo Rocha, as coleções especiais não devem representar 1% das vendas, que atingiram R$ 4 bilhões, no ano passado. “Apesar de não ser uma fatia muito grande, tem um efeito de contágio muito grande”, diz o empresário.

Para criar todo o visual da campanha, a Riachuelo contou com o trabalho da TEMPODESIGN, o escritório do designer e cineasta Ricardo van Steen, que fez a remodelagem da marca em 2014 e tem liderado todas as principais ações visuais que envolvem a empresa. A importância do escritório, nessa fase da companhia, pode ser percebida na abrangência de seu trabalho. Van Steen renovou o desenho dos cartões de crédito da Riachuelo, a comunicação visual do seguro oferecido pela empresa, e agora inicia o reposicionamento das submarcas, começando pela Pool, e a renovação da arquitetura e da fachadas das lojas.

Encarregado da direção criativa, foi van Steen quem recebeu a sugestão da equipe de Lagerfeld de combinar Niemeyer e Wagner na preparação da nova campanha, formatando as referências num visual atraente. “Não dava pra ter um ponto de partida melhor. Qualquer associação entre os dois resulta em alguma coisa intensa”, diz ele. “Não é sempre que recebemos um briefing tão rico.” Van Steen também pôde contar com oito meses de preparação, um tempo de antecedência adequado para campanhas estratégicas, mas que não costuma ser comum no mercado brasileiro.

E, por esse período, a interação com os executivos da Riachuelo foi quase que diária. “Há uma dificuldade no mercado de as empresas dedicarem tanto tempo e esforço a aspectos institucionais”, afirma van Steen. “Em especial na atual situação econômica, que gera maior preocupação com as vendas.” Para a afinação do projeto, também jogou a favor a boa relação que o designer mantém com Rocha. Os dois trabalharam juntos nos anos 1980, na criação da Pool, ainda hoje a mais importante marca própria da rede.

A confiança mútua fez a Riachuelo apostar numa produção que pode ser considerada independente. A agência Bigman, de Ralph Choate, contratou toda a equipe criativa. Além de Ricardo, fizeram parte Nicole Heiniger, que assina as fotos e a co-direção do filme, e o diretor de fotografia Andreas Heiniger. “A Riachuelo tem essa preferência por independentes. Os processos entre as empresas pode criar um filtro que atrapalha. Em especial, em moda, em que se precisa pensar mais na estética”, diz Nicole. O resultado está nas imagens bem cuidadas de Isabeli Fontana em sua nave espacial.

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