No começo do ano, o empresário Jorge Ribeiro, presidente da Gertec, uma das maiores empresas de automação comercial do País, instalada em Diadema, no ABC paulista, avaliou a possibilidade de abrir um novo centro de serviços para a companhia. Durante o planejamento, Ribeiro identificou a necessidade de  contratar 50 profissionais da área de engenharia e tecnologia da informação para o projeto. 

Decisão tomada, ele já se preparava para enfrentar a dificuldade de encontrar mão-de-obra qualificada, num momento em que o mercado de trabalho está tão aquecido. Mas o obstáculo maior foi outro. Antes mesmo de contratar a equipe, o empresário percebeu que não teria onde alojar esses novos colaboradores – que passariam a integrar um setor junto com outros 70 funcionários. “Vasculhamos toda a cidade de São Paulo em busca de um local para instalar o novo centro, sem sucesso”, diz Ribeiro. “Não há, caras ou baratas, áreas disponíveis na capital.”

 

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Cidade valiosa: o preço do metro quadrado de aluguéis comerciais no

Rio de Janeiro já supera o de cidades como Nova York, Paris e Milão

 

Esse tipo de périplo não é exclusivo da Gertec. A vertiginosa alta do mercado imobiliário no País atingiu em cheio a rotina das empresas. O último levantamento da seção paulista do Secovi, o sindicato das empresas da construção civil, mostra que o descompasso entre a oferta de terrenos, a expansão do crédito e o crescimento da economia promoveu alta de até 250% no valor dos imóveis – residenciais ou comerciais – em cidades como São Paulo e Rio de Janeiro, nos últimos dois anos. 

 

A espiral que favoreceu a valorização, ao que tudo indica, não perderá o ritmo tão cedo. Neste ano, o aluguel comercial no Rio de Janeiro se tornou o quarto mais caro do mundo. O valor do metro quadrado está acima do cobrado em cidades como Paris, Milão e até Nova York. Enquanto o metro quadrado no Rio custa, em média, R$ 179, para locação, em Nova York cai para R$ 171. Questão de demanda.“O rápido crescimento de empresas, especialmente nas áreas de energia e tecnologia, traz novos investidores que há muitos anos se afastaram da cidade”, diz Ronaldo Coelho, vice-presidente do Secovi-RJ. 

 

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Jorge Ribeiro, da Gertec: “Vasculhamos São Paulo em busca de uma

área para ampliar a empresa. Mas, caro ou barato, não encontramos”

 

Segundo ele, a obsessão das empresas por áreas estratégicas, como locais próximos a estações de metrô, ajudou a alimentar a tendência de valorização dos imóveis. Os investimentos para a Copa de 2014 e a Olimpíada de 2016 também têm influenciado o preço final do metro quadrado na Cidade Maravilhosa, constata Célia Ramires, responsável pela expansão da rede Casa & Vídeo. 

 

Prestes a inaugurar a 67ª loja  da rede nesta semana, Célia diz que é preciso negociar muito para fechar ou renovar os contratos de aluguel dentro de uma margem aceitável. “Há bairros onde o metro quadrado está valendo o dobro que há dois anos”, afirma.

 

A falta de disponibilidade de áreas comerciais afeta, inclusive, a estratégia de quem é do ramo. A construtora Rossi, de São Paulo, por exemplo, já começa a evitar as grandes capitais em função dos preços sobrevalorizados dos terrenos. Para driblar a alta dos custos de aquisição de novas  áreas, a  Rossi decidiu diversificar seus mercados rumo ao interior do País, especialmente fora da região Sudeste. 

 

“Depois que adotamos essa tática, nosso segundo mercado passou a ser o Rio Grande do Sul, seguido pelo Distrito Federal”, diz Cássio Audi, diretor de investimentos da construtora. “Assim, conseguimos reduzir o impacto da rápida valorização das áreas em São Paulo e no Rio.” O interior paulista também tem grande peso para a Rossi atualmente – um terço dos investimentos está concentrado em municípios com mais de 300 mil habitantes no Estado. “Como temos cerca de R$ 20 bilhões em terrenos, diversificar mostrou-se a estratégia mais acertada”, afirma Audi.

 

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Fabio Mendunekas, da Syncreon: ao se instalar em Jundiaí (SP), reduziu em 30%

o custo de locação e ficou mais próximo dos grandes clientes 

 

O caminho do interior como alternativa à capital também foi trilhado pela  Syncreon, multinacional do setor de logística. Principal transportadora de componentes da indústria automobilística do ABC e das empresas de tecnologia da região de Campinas, a Syncreon encontrou espaço para um novo centro de distribuição em Jundiaí, a 60 quilômetros da cidade de São Paulo, por um custo 30% menor que na capital. “Toda a Grande São Paulo está impraticável”, diz Fabio Mendunekas, vice-presidente da Syncreon.

 

A valorização acentuada dos imóveis  é notória em outras capitais do País, ainda que não no mesmo ritmo do eixo Rio-São Paulo. De acordo com Moacyr Schukster, presidente do Secovi gaúcho, a valorização média nos últimos dois anos em Porto Alegre, por exemplo, ficou entre 60% e 80%. No Distrito Federal, no último ano, o preço de venda dos imóveis de porte médio passou de R$ 150 mil para quase R$ 300 mil, segundo Paulo Simão, presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC). “O custo dos terrenos já afeta, inclusive, o governo”, diz Simão. “Esse é o principal entrave, atualmente, para a expansão do programa Minha Casa Minha Vida entre as camadas populares, nas maiores cidades: não se encontram áreas para construção a custos acessíveis.”

 

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O aumento nos preços alimentou o debate sobre uma eventual bolha imobiliária. Especialistas, no entanto, argumentam que não se trata de valores de especulação, mas de uma recuperação de preços num mercado que estava, há muito, subavaliado. João da Rocha Lima Júnior, professor da Universidade de São Paulo, e especialista no setor da construção civil, diz que o quadro atual decorre de décadas de estagnação de preços e, sobretudo, reflete a melhoria das condições macroeconômicas. “Se os preços sobem puxados pela necessidade, não há bolha”, afirma.  De acordo com Lima Júnior, só há bolha quando o anseio é maior do que a necessidade, como o que aconteceu com os ‘subprime’ (empréstimos de alto risco), nos Estados Unidos. 

 

A crise de 2007 e 2008 surgiu pela farra do crédito concedido sem rigor  pelos bancos americanos a milhares de cidadãos que tinham, inclusive, histórico de inadimplência. Um quadro diferente do Brasil, onde o endividamento do consumidor ainda é relativamente baixo e está sob controle. “O brasileiro tem absorvido as altas de preços nos últimos anos graças ao aumento de renda, o que elimina sinais de altas artificiais de preço”, afirma Fernando Terra, diretor da área corporativa da consultoria CB Richard Ellis.