14/05/2015 - 19:00
No imaginário popular, as gigantes da chamada nova economia compartilham uma história comum. Jovens na faixa dos 20 anos de idade se conhecem em universidades americanas, têm uma ideia genial, recebem aportes de fundos de investimentos e se tornam líderes de mercado. Foi assim com o Google, com o Facebook, e com o Airbnb, entre outros nomes badalados e bem sucedidos. Talvez por isso, pareça estranho quando uma companhia centenária, que vendeu canhões e outros armamentos durante as guerras dos séculos 19 e 20, anuncie ao mercado sua metamorfose em uma empresa de tecnologia.
Empenhada nessa reinvenção, a francesa Schneider Electric já tem um objetivo principal: liderar globalmente a tecnologia de eficiência energética. “Somos uma empresa jovem de 150 anos”, afirma o presidente da Schneider Electric Brasil, Rogério Zampronha. Em Rueil-Malmaison, subúrbio industrial de Paris, onde fica situada a matriz do grupo, a palavra de ordem é inovar, ser reconhecida por isso e ganhar novos mercados. Entre as ações de marketing para tornar-se mais conhecida e mais jovem, está o patrocínio da Maratona de Paris. Na edição deste ano do evento, a companhia calculou a quantidade de energia gerada pelos 54 mil atletas: ela seria suficiente para iluminar a Torre Eiffel por três noites.
“A inovação está no coração do que fazemos”, diz Chris Leong, diretora global de marketing. “Para nos mantermos relevantes, precisamos dos chips, das nuvens, dos aparelhos inteligentes.” Nessa maratona corporativa, a companhia apertou o passo das aquisições. Na última década, foram 180 no mundo todo, incluindo empresas brasileiras como CP Eletrônica, Microsol e Atos. O próprio Zampronha vem de uma empresa incorporada pela Schneider, em 2010, a SoftBrasil. “É muito importante que essas empresas incorporadas não se sintam como se fossem países sendo dominados por outro e, por isso, valorizamos as pessoas”, afirma.
“Isso traz frescor à gestão das ideias e velocidade na adoção de novas tecnologias.” A estratégia tem dado certo. No ano passado, a empresa faturou € 24,9 bilhões. A maior parte desse montante veio da Europa Ocidental, da Ásia e da América do Norte, mas o Brasil é um dos 10 mercados mais importantes. Um exemplo de como a companhia evoluiu nos últimos anos são os 25 mil pontos de monitoramento do consumo de energia no País. No modelo tradicional, ela vendia medidores e os próprios clientes faziam a gestão de seu consumo. Hoje, esse controle é feito pela Schneider remotamente, a um custo muito menor.
Entre os clientes atendidos por esse serviço, está o hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, além da maioria dos estádios construídos para a Copa do Mundo. Às voltas com a redução de encomendas no setor de petróleo e gás, a operação brasileira tem encontrado boas oportunidades no de energia. Segundo o CEO Zampronha, a elevação dos custos da eletricidade está provocando um aumento da demanda por serviços na área de gestão. “Toda energia que o País precisa já está disponível”, diz Zampronha. “Basta usá-la melhor.”
Num setor, como o da Tecnologia da Informação, em que idade e tradição não figuram exatamente entre os ativos mais valorizados, a Schneider quer usar sua credibilidade para garantir segurança e privacidade aos usuários de produtos cada vez mais conectados – e evitar, assim, ter sua imagem associada a vazamentos de dados, como ocorreu recentemente com Sony e Apple. “Nosso legado não é de mais uma companhia que nasceu com o boom da internet”, diz a diretora de marketing Chris. “Queremos assegurar que a distribuição elétrica na próxima geração, que tem tudo a ver com conectividade, venha de grandes players como a Schneider.”
Para Ron Ashkenas, sócio da Schaffer Consulting, de Stamford, nos Estados Unidos, o desafio está em se tornar mais ágil e focada no consumidor. “Empresas antigas fazem negócios pensando mais nos custos e no retorno do investimento, e isso só funciona em mercados tradicionais”, disse. Sócio-diretor da consultoria Place, de São Paulo, Julio Moreira vê a transição como uma forma de levar a boa reputação em produtos que estão se transformando em commodities para bens de maior valor agregado.
“Ampliar seu escopo é um caminho importante para aumentar suas margens”, afirma. Por conta disso, o investimento em pesquisa e desenvolvimento é fundamental, absorvendo 5% do faturamento global do grupo. É um porcentual semelhante ao aplicado pela Volkswagen e pela Samsung, duas das companhias que mais investem em inovação no mundo, segundo a consultoria Strategy&, mas ainda muito abaixo de outras empresas do setor de tecnologia, como Intel (20,1%), Microsoft (13,4%) e Google (13,2%).