Em 2004, a fabricante de computadores Lenovo não passava de uma obscura empresa de alcance regional e de quase nenhuma expressão global. Seu faturamento beirava os US$ 3 bilhões. Fora da China e de alguns países da Ásia, poucos a conheciam. Foi então que o executivo Yang Yuanqing, que havia assumido a presidência em 2001, fez seu lance mais ousado. Em dezembro de 2004, ofertou US$ 1,7 bilhão pela divisão de computadores pessoais da IBM. O negócio, concluído no ano seguinte, alçou a Lenovo para a terceira posição do concorrido mercado mundial de PCs. 

 

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Valor da marca: Yuanqing, CEO da Lenovo, quer usar força da Motorola para ganhar

mercado fora da China, onde é líder 

 

Foi uma década de ouro para a Lenovo, que multiplicou suas receitas por 11 desde então, passando a US$ 33 bilhões em 2013, o que lhe garantiu a liderança na produção e nas vendas de PCs, com uma fatia de 16,7%. A estratégia na área de computadores deu tão certo que Yuanqing, que ainda continua no comando da Lenovo, resolveu repetir o lance. Na quarta-feira 29, ele anunciou a compra da fabricante americana de smartphones Motorola, que pertencia ao Google, por US$ 2,9 bilhões. Trata-se de um negócio literalmente da China, considerando-se que a empresa de internet pagou nada menos de US$ 12,5 bilhões pela Motorola em 2011. 

 

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De sorriso aberto: o CEO do Google, Larry Page (à esq.), e Yuanqing comemoram

o acordo, classificado como positivo por ambos

 

O Google já havia, contudo, vendido uma divisão de equipamentos da Motorola por outros US$ 2,6 bilhões há um ano. “A Lenovo tem provado que consegue abraçar e fortalecer grandes marcas, como fizemos com o notebook ThinkPad, da IBM”, disse Yuanqing. Mesmo com o negócio, que ainda precisa ser aprovado pelas autoridades reguladoras dos Estados Unidos, a Lenovo permanece num distante terceiro lugar no ranking global de smartphones, atrás de Samsung e Apple. Afinal, a Motorola, a inventora do celular e líder de mercado nos anos 1990, é um fornecedor menor, que ocupa a 17ª posição em aparelhos inteligentes, com uma fatia de 1,2%. 

 

Com a Motorola, no entanto, a Lenovo ganha musculatura para competir globalmente no mercado de smartphones, que registrou vendas de 1 bilhão de aparelhos em 2013, de acordo com dados da consultoria americana IDC. A atuação da Lenovo, até agora, estava concentrada na China e em alguns países da Ásia. Fora do continente asiático, ela ainda é uma ilustre desconhecida em smartphones. A Lenovo deve se beneficiar da presença da Motorola nos Estados Unidos e na América Latina. “Nos EUA, ela mantém um reconhecimento de marca construído no passado”, diz Leonardo Munim, analista da IDC. No Brasil, por exemplo, a Motorola é a terceira colocada, atrás de LG e Samsung, mas está à frente da Apple. 

 

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Sucesso de crítica: o smartphone Moto G foi um dos principais

produtos lançados pela Motorola durante a gestão Google

 

No Chile, Argentina, México e Peru, ela figura entre os cinco principais fabricantes de smartphones, enquanto nos Estados Unidos aparece entre os dez maiores. Uma indagação, no entanto, se impõe: será que a tática que deu certo no passado com a IBM funcionará na área de celulares inteligentes? “O mercado de smartphones é muito diferente do de PCs”, diz Tuong Nguyen, analista da consultoria Gartner. “Existe muito mais concorrência na área de mobilidade.” Duas empresas, pelo menos por enquanto, têm larga vantagem nessa disputa. De um lado, a coreana Samsung. De outro, a Apple, que reinventou a área de smartphones em 2007, com o seu iPhone. 

 

Por fora, corre a Microsoft, que adquiriu a combalida Nokia, no ano passado. Em um primeiro momento, a Lenovo contará com a força de um portfólio renovado da Motorola. Destaque para os celulares Moto X e Moto G, cujos principais atributos são sua integração com o sistema operacional Android, do Google. Apesar das boas vendas desses modelos, a Motorola é uma empresa deficitária. No terceiro trimestre de 2012, perdeu US$ 248 milhões, um aumento de 22% sobre o mesmo período do ano passado. As vendas encolheram 33%, para US$ 1,1 bilhão. É cedo, portanto, para concluir que Yuanqing conseguirá dar um xeque-mate no mercado de smartphones, assim como fez na área de computadores.

 

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