12/09/2014 - 20:00
A maneira como a Apple transformou os mercados de música e de smartphones e revolucionou a computação pessoal através dos tablets já virou história, retratada em verso, prosa e filmes. Não custa fazer um breve resumo. O tocador de música digital iPod, de 2001, não foi o primeiro em sua categoria. Muitos outros equipamentos estavam nas prateleiras das lojas. Mas o iPod, além de uma interface inovadora, estava umbilicalmente unido a uma loja que vendia músicas digitais, o iTunes. Em 2007, o iPhone mudou tudo na área de smartphones, com sua interface sensível ao toque.
A finlandesa Nokia, então líder do setor em escala mundial, praticamente virou pó nos anos seguintes, sendo incorporada pela Microsoft em 2013. Com o iPad, de 2010, levou a computação pessoal para outro patamar. Nesses exemplos, há uma constante: mesmo tendo chegado depois, a Apple capturou o mercado com inovações que nenhum outro competidor até então havia produzido. Com o Apple Watch, o relógio inteligente da empresa de Cupertino, divulgado na terça-feira 9, a lendária marca da maçã tenta repetir esse enredo de sucesso.
Trata-se do primeiro grande teste de Tim Cook, o executivo que comanda a empresa desde a morte de Steve Jobs, em 2011. As ações duplicaram de valor nesse período, o que fez a companhia superar os US$ 600 bilhões em capitalização. No entanto, a despeito da montanha de dinheiro que proporcionou aos acionistas, Cook, sem ter o mesmo carisma de Jobs, sofre com o mau humor dos applemaníacos, por não ter apresentado nenhum produto revolucionário até agora. Não há dúvidas de que o aparelho é a esperança de mostrar que a criatividade não morreu com Jobs e persiste no DNA da empresa.
“Fizemos o melhor relógio do mundo”, disse Cook, repetindo as famosas hipérboles de Jobs. “Inventamos novas maneiras para as pessoas se conectarem e se comunicarem diretamente de seu pulso.” Como de costume, a Apple chega com um novo produto em um mercado repleto de concorrentes, como Samsung, LG, Motorola e Sony. No começo de setembro, na IFA, principal feira tecnológica da Europa, que aconteceu em Berlim, vários deles mostraram seus “smartwatches”. “É o primeiro grande novo aparelho desde Jobs”, afirma Rob Enderle, analista-chefe da consultoria americana Enderle.
“Não há dúvidas de que ele é de suma importância.” Mas resta uma questão: o Apple Watch irá mudar o mercado, como fizeram iPod, iPhone e iPad? Há mais dúvidas do que certezas, por enquanto. Explica-se: detalhes sobre o aparelho ainda não foram divulgados, uma vez que ele só chegará às prateleiras em 2015. O relógio inteligente funciona apenas com os smartphones que foram lançados a partir do iPhone 5, restringindo seu mercado potencial a 200 milhões de consumidores. Seu uso baseia-se em um botão giratório do lado direito, obrigando o usuário a colocá-lo no braço esquerdo, um problema para os canhotos.
A duração da bateria e os detalhes técnicos também não foram revelados. Seu preço de US$ 349 é o dobro em relação ao Gear S, da Samsung. “Foram muitas funções apresentadas, parece um canivete suíço”, afirmou Katy Huberty, analista especializada em Apple do banco de investimentos americano Morgan Stanley. “Ainda estou na dúvida se este é o aparelho que vai definir o mercado.” O Apple Watch, porém, não foi recebido apenas com ceticismo. Apesar de restringir o uso ao braço direito, o botão giratório é uma mudança de interação em comparação ao que está no mercado.
O estilo do sistema operacional também é um destaque. A Apple criou um conceito diferente, que o diferencia das características apresentadas pelos smartphones da companhia. “Nós não diminuímos o iPhone e colocamos no seu pulso”, afirmou durante o evento de lançamento Phil Schiller, vice-presidente de marketing da Apple. “Isso não é funcional.” A empresa também irá colocar no mercado três edições diferentes do relógio, oferecidos em ouro e aço e dois tamanhos de tela, além de seis tipos de pulseiras.
Fazendo as contas, são 72 versões. “Com certeza, o fator design vai pesar na decisão do consumidor”, diz Paulo Guedes, especialista de produtos do comparador de preços Zoom. “Ajuda, ainda, o fato de a Apple ser uma marca que desperta desejo.” Seguindo a tradição que vem desde os tempos de Jobs, o relógio funciona integrado aos aparelhos da maçã – compatibilidade com rivais nunca foi o forte da marca. O relógio inteligente pode controlar o aparelho Apple TV e usa o recém-lançado Apple Pay (mais informações ao lado). Mas precisa estar sincronizado ao iPhone para realizar suas principais funções. Sem o smartphone, é um zero à esquerda, pois não serve nem mesmo para informar as horas.
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Querida, aumentei o iPhone
Apple segue tendência de mercado, copia rivais e lança smartphone com telas gigantes
“As pessoas não sabem o que querem, até mostrarmos a elas.” Essa frase, uma das mais famosas cunhadas por Steve Jobs, o fundador da Apple, morto em 2011, sintetiza a natureza inovadora da companhia, que não ouvia a opinião dos consumidores para desenhar produtos. Por isso, a Apple surpreendia e era seguida pelos seus concorrentes. Mas, ultimamente, a companhia de Cupertino não tem praticado esse dogma de Jobs. O iPhone 6, lançado na terça-feira 9, é um exemplo de como a Apple passou a copiar os concorrentes.
A nova família de smartphones da Apple nasce com dois modelos: o iPhone 6, com telas de 4,7 polegadas, e o iPhone 6 Plus, com “gigantescas” 5,5 polegadas. A versão 5S, que está à venda, conta com 4 polegadas. Com isso, a Apple segue concorrentes como Samsung, LG, Sony e Motorola, que já vendiam celulares inteligentes com telas grandes. Por que, então, o CEO Tim Cook resolveu aumentar o tamanho dos iPhones? Os números podem explicar essa estratégia. A venda de celulares inteligentes com mais de 5 polegadas cresceu 369% no primeiro trimestre deste ano, de acordo com a consultoria americana NPD.
Atualmente, 34% dos smartphones vendidos têm telas acima de 5 polegadas. No topo de linha, eles são praticamente uma unanimidade, chegando a 98% dos aparelhos. Os iPhones tamanho família da Apple, no entanto, são dotados de uma inovação que tem potencial para dar um novo impulso aos pagamentos por dispositivos móveis. Trate-se do Apple Pay. Não chegou a ser uma surpresa o anúncio de Cook de que a empresa fosse incluir na nova versão de seu celular inteligente a comunicação via NFC, uma tecnologia que permite que máquinas troquem informações.
Ele, no entanto, surpreendeu ao apresentar plataforma de pagamento, que será um competidor de peso para gigantes como o PayPal, do eBay, o Mercado Pago, do Mercado Livre, e AliPay, do chinês Alibaba. O Apple Pay permite que os donos de iPhone e Apple Watch incluam na plataforma uma versão virtual de seus cartões de crédito e de débito. As bandeiras American Express, MasterCard e Visa já fecharam acordo com a Apple – o que abrange 83% do mercado americano, onde o Apple Pay será inicialmente lançado.
Segundo a companhia de Cupertino, 220 mil estabelecimentos ao redor dos EUA irão aceitar o Apple Pay, com empresas como Bloomingdale’s, Disney Store, Walt Disney World Resort, Duane Reade, Macy’s, McDonald’s, Sephora, Staples, Subway, Walgreens e Whole Foods Market, entre outros nomes. “Acreditamos que o principal lançamento do evento foi o Apple Pay”, afirmou Gene Munster, analista da consultoria americana Piper Jaffray. “Ele pode aumentar o faturamento da companhia com o passar do tempo.”