Sexta-feira, 30 de agosto. Uma manhã fria e ensolarada em Campos do Jordão, a cerca de 200 quilômetros de São Paulo. Na primeira palestra do VI Congresso Internacional de Mercados Financeiro e de Capitais, promovido pela BM&FBovespa, economistas do porte do ex-presidente do Banco Central Pérsio Arida esforçavam-se de forma empedernida para sublinhar as mazelas da economia brasileira. Arida, um dos pais do Plano Real e sócio do banco BTG Pactual, defendia um aumento de juros para conter a inflação e propunha que o País convivesse com uma taxa de desemprego mais elevada do que os atuais 5,6%. “Um crescimento acima de 2% ao ano já mostra sinais de aquecimento”, disse Arida.

 

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O otimista: Jim O’Neill: reclamar que o desemprego está baixo é absurdo

 

Durante os comentários, porém, a realidade subitamente atropelou as teorias. Naquela manhã, o IBGE divulgou um crescimento de 1,5% no PIB no segundo trimestre, em comparação com os três primeiros meses de 2013. Confrontado com o segundo trimestre do ano passado, o resultado avança para 3,3%. Em ambos os casos, o motor foi o bom desempenho do agronegócio. Não é nenhum número asiático, mas é muito superior aos prognósticos do mercado. Na tarde daquela mesma sexta-feira, os cerca de 600 convidados ouviriam uma palestra de Jim O’Neill, economista inglês que, até poucos meses atrás, era diretor da empresa de gestão de recursos do banco Goldman Sachs. 

 

O’Neill ficou famoso em 2003 por criar a sigla BRIC, unindo as economias do Brasil, da Rússia, da Índia e da China. Como ele encarou as notícias e as palestras da manhã? “Vocês, brasileiros, são pessimistas demais”, disse com exclusividade à DINHEIRO. “Em nenhum outro lugar eu ouviria economistas reclamando que o desemprego está excessivamente baixo, esse é o tipo de problema que qualquer ministro das finanças europeu reza a Deus para ter.” A confirmação do PIB acima das expectativas do mercado pode ser considerada à primeira vista um ponto fora da curva. No entanto, a grande novidade foram os números surpreendentes da indústria, que cresceu 2,8%, ante uma queda de 1,4% no trimestre anterior. 

 

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O pessimista: Pérsio Arida: defendendo a alta dos juros

e medidas de contenção ao consumo

 

Segundo o IBGE, a indústria de transformação cresceu 4,6%, turbinada pelo aumento da produção de máquinas e equipamentos e pelo setor automotivo. “O PIB confirmou o que vínhamos detectando nos setores de construção civil e eletroeletrônicos: o crescimento da indústria e a volta dos investimentos”, diz Robson Andrade, presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI). “Nossa expectativa é de que isso continue nos próximos meses.” O’Neill avalia que as perspectivas para o Brasil são melhores do que parecem quando vistas daqui. Segundo ele, muitos lamentam a redução do ritmo de crescimento da China, que diminuiu dos históricos 9,5% para algo ao redor de 7% ao ano. 

 

“Essa desaceleração não foi um acidente, ela foi promovida pelo governo chinês, que está reorientando a economia”, diz o economista. Pequim, avalia, vem dando preferência ao avanço do mercado interno, o que vai mudar a feição do consumo no país. “Mesmo crescendo menos, a China fez sua lição de casa, está ajustando os bancos e criando uma economia menos dependente das exportações”, afirma O’ Neill. E quanto ao Brasil? Para ele, a atual fase lenta é cíclica. Nos últimos tempos, os primeiros anos de cada década têm exibido um crescimento menor do que na segunda metade. Foi assim entre 2001 e 2003, e se mantém entre 2011 e 2013. 

 

Para o futuro próximo, os prognósticos são mais animadores, embora ainda seja necessário melhorar a infraestrutura, a competitividade e a segurança jurídica. E, também, evitar o pessimismo. O’Neill diz gostar de contar uma história. Ele publicou o trabalho que deu origem aos BRICs como um relatório da Goldman Sachs em 2003. “Quando eu vim ao Brasil em 2006, as pessoas me diziam: ‘Você é louco de comparar o Brasil com a China, nós nunca vamos atingir esse ritmo’”, disse ele. Ao retornar em 2010, em plena euforia do ciclo de commodities, foi diferente. “Todos me davam tapinhas nas costas e dizia: ‘Você é um gênio, um visionário, que conseguiu antecipar nossa prosperidade’”, afirmou. “Uns e outros estavam exagerando.”