As corridas matinais fazem parte da rotina do executivo paranaense Paulo Rogério Caffarelli. Com a transpiração dos treinos, ele consegue organizar as ideias e tomar decisões importantes. Nunca escondeu que o esporte é diretamente responsável pela sua produtividade, pela disposição e pelo bom humor. Na semana passada, seu exercício pelas ruas de Londres, onde ele aproveitava um curto período de férias, ajudaram-no a aceitar um novo desafio profissional: voltar ao Banco do Brasil (BB), onde construiu uma carreira de 32 anos até 2014, quando saiu para assumir a secretaria executiva do Ministério da Fazenda.

No ano passado, deixou o setor público ao aceitar o convite de Benjamin Steinbruch para ser diretor executivo da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). Apesar da satisfação com sua nova fase na iniciativa privada, Caffarelli não podia deixar para trás o sonho de uma vida. Ele, que começou como menor aprendiz no BB, queria chegar à presidência. Não havia como recusar o convite do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, para comandar o maior banco do País em ativos, com R$ 1,4 trilhão.

Aos 50 anos, Caffarelli sucede o amigo Alexandre Abreu. No início de 2015, quando Aldemir Bendine foi transferido da presidência do BB para a da Petrobras, Caffarelli foi, ao lado de Abreu, um dos cotados para a sucessão. O que fez o então ministro da Fazenda Joaquim Levy decidir-se por Abreu foi sua experiência no varejo. Abreu criou o programa de crédito Bom para Todos, em 2012, reforçando a expansão dos empréstimos, em linha com a orientação do governo federal.

Agora, porém, pesou na decisão para a troca o bom o trânsito de Caffarelli com o mercado. Dentro do BB, Abreu é visto como um exímio conhecedor da máquina do banco, mas com menor capacidade para lidar com uma agenda política complexa, que exigirá interlocução com todos os públicos. “O Caffarelli é um técnico, que tem domínio do banco e conhece a estrutura, o que confere continuidade à gestão”, diz Luis Santacreu, analista de mercado financeiro da Austin Rating. “O Banco do Brasil está alinhado com o setor, com atenção ao desaquecimento da economia e o aumento de provisões, o que não vai exigir uma eventual capitalização, como é esperado na Caixa.”

Na quarta-feira 25, Meirelles anunciou o nome de Caffarelli e o de Gilberto Occhi para a presidência da Caixa. Marcos Holanda permaneceu no comando do Banco do Nordeste. Agora, caberá a Caffarelli correr por terrenos mais acidentados no BB do que os de seus antecessores. Ao divulgar os resultados do primeiro trimestre, no dia 12 de maio, José Maurício Pereira Coelho, vice-presidente de Relações com Investidores do banco, surpreendeu negativamente o mercado anunciando um lucro líquido ajustado de R$ 1,286 bilhão, uma queda 51% ante o trimestre anterior, e de 57,5% ante o primeiro trimestre do ano passado.

Coelho afirmou que, apesar de as exigências de capital do BB estarem sendo cumpridas, o banco vai procurar aumentar sua base de capital por meio do reinvestimento de lucros. Pelo menos naquele momento, disse Coelho à DINHEIRO, o BB não estava pensando em levantar recursos no mercado. No entanto, reforçar o capital do banco, eventualmente por meio de uma venda de ativos, poderá ser um dos desafios do novo presidente. “O Caffarelli é focado e tem o perfil que o banco vai precisar pelo momento atual difícil, de inadimplência crescente”, diz Carlos Takahashi, ex-presidente da BB DTVM, que conhece Caffarelli desde 1993.

“Ao longo da carreira, ele acumulou experiência com períodos difíceis, que exigiram estratégia e rapidez para as soluções.” No último ano, Caffarelli esteve mergulhado na reestruturação da CSN. Em março, quando assumiu a direção executiva da empresa, como braço direito de Steinbruch, sua missão era conseguir dar uma virada nos negócios e enfrentar um dos piores momentos do setor siderúrgico nas últimas décadas. Com experiência no setor bancário, Caffarelli começou a trabalhar no alongamento das dívidas da companhia, na venda de ativos e na eficiência operacional.

Além disso, trabalhou no aumento da liquidez da CSN com uma rigorosa gestão de caixa. Se sua habilidade com as finanças não foi surpreendente, o mesmo não se pode dizer de seu trabalho como negociador. Caffarelli conseguiu resolver uma extensa e problemática negociação, de mais de um ano, envolvendo a mina Casa de Pedra, da CSN, com a Namisa, então controlada pelos japoneses da trading Itochu. A relação entre nipônicos e brasileiros era conturbada, mas o executivo conseguiu negociar a fusão dos negócios para a criação da Congonhas Minérios, que criou uma empresa avaliada em R$ 16 bilhões.

Na Usiminas, companhia na qual a CSN é sócia minoritária, Caffarelli tentou apaziguar os ânimos entre os controladores e reequilibrar as contas. Mas, para os mais próximos, dizia que a solução imediata deveria ser a troca da diretoria, que não estava funcionando. Advogado com pós-graduação em Comércio Exterior e mestrado em Economia, Caffarelli foi peça-chave em importantes decisões recentes do BB. Na área de varejo, liderou as discussões com o governo para expandir o crédito ao consumidor, uma política anticíclica que ajudou a sustentar a atividade econômica em 2009, após a crise econômica global.

Como responsável pelo varejo do banco, a carteira de pessoas físicas saltou de R$ 27,9 bilhões para R$ 122,6 bilhões do total de operações de crédito. No seu último cargo na instituição, como vice-presidente de atacado, negócios internacionais e private bank, realizou a abertura de capital da BB Seguridade, em abril de 2013, que movimentou R$ 11,5 bilhões – a mais bem sucedida do mundo naquele ano. Na ocasião do IPO, um dos poucos realizados naquele ano, Caffarelli disse à DINHEIRO que a separação das áreas de seguros e previdência, menos sujeitas às oscilações do mercado, geraria valor para o acionista. O executivo tinha razão.

Da abertura de capital até a quarta-feira 25, as ações da BB Seguridade, que reúne as atividades de seguros, previdência e capitalização do BB, haviam acumulado uma valorização de 88%. No período, as ações do próprio banco caíram cerca de 15%. Antes do IPO, Caffarelli foi o responsável por articular a entrada do BB no mercado imobiliário, em 2008, rompendo uma tradicional divisão de papeis com a Caixa Econômica Federal. Historica-mente, a Caixa cuidava dos imóveis e o BB era responsável pelo financiamento agrícola.

O concorrente estatal devolveria o golpe em 2011, quando começou a testar o financiamento ao agronegócio. Em 2009, Caffarelli coordenaria a quebra de exclusividade das bandeiras de cartão de crédito, processo que culminaria com a criação do sistema Elo, em parceria com Bradesco e Caixa. Metódico, exigente e disciplinado com horários, Caffarelli é reconhecido no BB e no mercado financeiro como um executivo que entrega e cobra resultados. Como bom corredor, Caffarelli sabe que o banco é como uma maratona: é preciso técnica e disciplina para cruzar a linha de chegada.

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Caixa Seguros é o primeiro desafio de Occhi

A indicação de Gilberto Occhi para a presidência da Caixa confirma o que o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, disse sobre os nomes de sua equipe econômica: não importa de quem seja a indicação, desde que tenha o perfil técnico para assumir o cargo. Filiado ao Partido Progressista (PP), Occhi, 57 anos, é funcionário de carreira da Caixa. Mineiro, formado em direito, com pós-graduação na área de finanças, mercado financeiro e gestão empresarial, ele também conhece o funcionamento da máquina pública.

Nos últimos dois anos, foi ministro das Cidades, ainda no primeiro mandato de Dilma Rousseff, e ministro da Integração Nacional, cargo do qual se licenciou para realizar uma cirurgia na próstata e, posteriormente, entregou quando o PP decidiu desembarcar do governo da petista em meio ao processo de impeachment. O primeiro desafio de Occhi no comando da Caixa será acabar com as desconfianças do mercado sobre uma necessária capitalização da instituição financeira com um aporte do Tesouro Nacional, em meio ao processo de ajuste fiscal.

Uma saída esperada é a retomada do processo de abertura de capital da Caixa Seguros, que teve início em abril do ano passado e foi adiado em outubro. A expectativa é conseguir levantar R$ 10 bilhões com a venda de 25% do capital da seguradora, o que traria um alívio tanto para o governo como para o banco. No primeiro trimestre deste ano, a Caixa reduziu 3,6% o crédito de liquidação duvidosa, para R$ 3,8 bilhões. A carteira de crédito de R$ 684,2 bilhões tem como principal linha o financiamento imobiliário, com participação de R$ 388,9 bilhões.

Colaborou: André Jankavski