Nos últimos três anos, as exportações de veículos caíram quase 20% pressionadas pela sobrevalorização do câmbio, que tira a competitividade dos produtos brasileiros e já ameaça o setor de registrar seu primeiro déficit no período de dez anos. Por conta disso, entende-se a comemoração da subsidiária da americana Ford Motor Company, por ter conseguido fechar um contrato de exportação de motores da família Sigma, que equipa alguns dos carros globais da empresa, como o recém-lançado New Fiesta hatch feito no México. A produção do powertrain, conjunto que reúne motor e transmissão, será feita na fábrica da montadora em Taubaté, no Vale do Paraíba, em São Paulo. A unidade, que começou a operar em 1974, assume um papel ainda mais relevante dentro da estratégia mundial da empresa, batizada de One Ford, com a nova encomenda. “O New Fiesta é um veículo global com coração verde-amarelo”, diz Marcos de Oliveira, presidente da Ford Brasil e Mercosul, que revelou com exclusividade sua estratégia à DINHEIRO. 

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Oliveira, da Ford: ”O New Fiesta (abaixo) é um veículo global com coração verde-amarelo”

Para dar conta das encomendas, serão investidos R$ 500 milhões. O montante faz parte do pacote de R$ 4,5 bilhões projetado para o período 2011/2015. Com isso, o executivo pretende multiplicar por três a capacidade de fabricação da família Sigma. Os motores serão despachados também para os Estados Unidos e o Canadá. Para conseguir vencer a disputa com as filiais da Ford na Europa, que também produzem os motores Sigma, Oliveira teve de negociar arduamente com a matriz, situada em Dearborn, região metropolitana de Detroit. Pesou favoravelmente a capacidade, reconhecida internamente na Ford, da unidade de Taubaté, que acaba de alcançar a impressionante marca de dez milhões de powertrains fabricados. Muitos deles equipam ícones da indústria automotiva, como o Ford Mustang. “Fizemos um esforço unificado que resultou em um pacote que uniu custo competitivo, eficiência de produção e tecnologia”, afirma Oliveira. 

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Novos empregos: investimento da Ford na fábrica de Taubaté (SP) vai gerar 500 novos

postos de trabalho. Produção de motores triplicará

 

 Agora, o objetivo é usar uma parte do orçamento na capacitação de pessoal, além de reforçar as áreas de pesquisa e desenvolvimento da unidade de Taubaté. Na primeira fase, os funcionários que vão atuar nessa linha passaram por um período de 80 horas de treinamento e, até 2012, receberão mais 160 horas. Do ponto de vista de geração de emprego, o projeto é igualmente relevante, pois serão criados 500 novos postos de trabalho em uma fábrica que já conta com 1,7 mil trabalhadores. A integração cada vez maior da filial brasileira no projeto One Ford, desenhado por Alan Mullaly, CEO mundial da Ford, e o lançamento simultâneo de modelos por aqui, são avaliadas por analistas como uma forma de a companhia manter seu status de quarta maior potência local do setor no Brasil, atrás de Fiat, Volkswagen e General Motors. No ano passado, a participação da Ford brasileira chegou a 10,52% dos 3,3 milhões de automóveis e comerciais leves comercializados no País.

 

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 Essa posição, por sinal, tem sido cobiçada pelos fabricantes que desembarcaram no Brasil nos últimos 15 anos, como as japonesas Honda e  Nissan e a coreana Hyundai. Nesse período, a Ford não apenas se manteve firme, como fechou 2010 com vendas de 336,3 mil automóveis e comerciais leves, volume 1% maior que a soma de tudo que as marcas francesas Renault, Peugeot e Citroën comercializaram no Brasil, no ano passado. Com visual estiloso, o New Fiesta chega para abrir espaço para a Ford no segmento de hatch compactos premium, vendidos acima de R$ 40 mil e no qual se destacam o Punto, da Fiat, o Polo, da Volks, e o Agile, da GM. “Agora, nosso portfólio está completo”, diz Oliveira. Ele comemora, ainda, o fato de no trimestre julho-setembro a companhia ter obtido um lucro de US$ 276 milhões na América do Sul. “Estamos a 31 trimestres consecutivos apresentando resultados positivos”, afirma o executivo. A situação confortável no quesito caixa também ajuda a enfrentar a nova safra de montadoras estrangeiras que, recentemente, anunciaram planos para desembarcar por aqui, especialmente as de origem asiática. Para defender sua trincheira, a Ford pretende gastar boa parte dos R$ 4,5 bilhões na renovação da linha de produtos, item apontado como um dos trunfos da filial. 

 

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Alan Mullaly, CEO global da Ford: executivo americano é um dos criadores da estratégia One Ford,

que ajudou a montadora de Detroit a sair da crise

 

“A decisão da Ford de apostar em veículos competitivos e que cabem no bolso do brasileiro médio, tem sido decisiva para seu sucesso no Brasil”, diz Corrado Capellano, sócio-diretor da Creating Value Consultoria de Negócios. “Outro fator importante é sua ampla rede de revendas.” São atributos, de fato, importantes. Porém, eles não garantem, por si só, a manutenção do posto de quarta maior vendedora de veículos do Brasil. “Como as fabricantes asiáticas não dispõem de uma grife forte, sua opção para ganhar mercado será praticar preços abaixo do cobrado pela concorrência”, afirma o consultor Wim van Acker, sócio da americana The Hunter Group, baseada no Estado de Michigan. Oliveira, da Ford, reconhece que terá dias difíceis pela frente. No entanto, acredita que o mercado brasileiro ainda apresenta oportunidades, mesmo com a entrada de uma nova leva de competidores. “Nos Estados Unidos, existe um carro para cada habitante”, diz. “No Brasil, a proporção é de seis habitantes para cada veículo.” Não por acaso, de olho nesse mercado gigantesco, as montadoras instaladas no País anunciaram um pacote de investimentos para os próximos anos, que ultrapassam a casa dos R$ 30 bilhões.

 

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