11/04/2014 - 21:00
Depois que a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) falou por mais de 30 minutos em defesa das articulações governistas em torno da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar a Petrobras, um dos poucos senadores de oposição presentes no plenário reclamou. A mesa esclareceu que a ex-ministra, naquele momento, falava como líder do PT e, portanto, teria direito, de acordo com o regimento interno do Senado, àquele tempo ao microfone. Na teoria, Gleisi, senadora eleita em 2010, que voltou ao posto há dois meses depois de comandar por dois anos e sete meses a Casa Civil, foi líder somente naquele fim de tarde da quarta-feira 9.
Em defesa do governo: em sessão na quarta-feira 9, Gleisi defendeu diante de seus colegas
uma CPI ampla que investigue também supostos desvios dos governos de oposição
Na prática, porém, diante da inércia e estranha inapetência da maioria de seus companheiros de bancada, ela tem exercido esse papel desde que deixou o gabinete no Palácio do Planalto, cargo mais importante entre os ministros, braço direito da presidenta Dilma Rousseff, para se candidatar ao governo do Paraná. Nos bastidores, no plenário ou no diálogo com a imprensa, Gleisi tem defendido os interesses do Palácio do Planalto com intensidade. No último mês, esforçou-se para convencer os colegas a não instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar a Petrobras, que adquiriu uma refinaria nos Estados Unidos, em 2006, em condições que vêm sendo questionadas pela oposição.
Sem sucesso, ela apelou para outra estratégia: articulou para que a CPI da estatal também investigue denúncias de pagamento de propina e formação de cartel no Metrô de São Paulo e o porto de Suape (PE). Assim, a CPI ampla também poderia afetar as candidaturas oposicionistas do senador mineiro Aécio Neves (PSDB) e do governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), à Presidência de República. Na semana passada, depois que Aécio e líderes do DEM, do PSB e do Solidariedade entraram com um mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar impedir que a CPI investigue assuntos não relacionados à estatal, ela respondeu no mesmo tom.
“A mesma oposição que nos acusa de antidemocráticos utilizou todos os recursos possíveis para barrar CPIs, bloquear o debate e se manter no poder quando era governo”, disse Gleisi sobre as acusações de que o governo impunha uma ditadura da maioria no Congresso. “Infelizmente a oposição não tem o que apresentar de concreto como alternativa ao País, aos brasileiros e às brasileiras.” Entre os colegas, Gleisi é vista como “impetuosa e combativa” – e nem sempre de maneira elogiosa. Alguns acham que poderia ser mais negociadora, uma característica essencial para conseguir a formação de maiorias e ver seus projetos aprovados no Congresso.
Na semana passada, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediu ao PT que atuasse com “unhas e dentes” para impedir a CPI. “As pessoas nunca quiseram CPI pra nada”, disse Lula. “Então eu acho que nesse aspecto o PT tem que ir pra cima”, disse em entrevista a blogueiros na terça-feira 8. “Ela está se credenciando como principal interlocutora do governo dentro do Parlamento”, diz o analista Antônio Augusto de Queiroz, do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap). Para isso, Gleisi tem enfrentado uma jornada de trabalho exaustiva. De segunda a quinta, costuma chegar ao Senado por volta das nove horas da manhã e não sai antes das nove da noite.
Tropa de choque: liderados pelo senador Aécio Neves, parlamentares deixam o STF após entrarem
com mandado de segurança para impedir a ampliação do escopo da CPI da Petrobras
A rotina em Brasília, onde reside num apartamento funcional com o marido, o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, e os dois filhos, é interrompida nos fins de semana. Às sextas, costuma viajar para o Paraná, sua base eleitoral. Faz campanha até sábado e volta no domingo, para ficar com os filhos. Embora esse seja o seu primeiro mandato no Senado, Gleisi não é exatamente uma novata no Congresso. Formada em direito, foi assessora parlamentar do atual marido, quando ele era deputado federal, há 20 anos. Ao negociar com a senadora, aliados e oposição sabem que ela dá voz aos anseios da presidenta e pode ser, ao mesmo tempo, um ouvido para pedidos.
“Ela estava dentro do governo, tem muitas informações e compreende vários processos”, diz o líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE), que considera a senadora um “reforço importante” à base aliada na Casa. Além de tentar reduzir os danos políticos para o governo na CPI da Petrobras, ela terá atuação estratégica em vários projetos que chegarão ao Senado nas próximas semanas. Um deles, que está trancando a pauta da Casa nesta semana, é a Medida Provisória (MP) 630, que permite que todas as obras públicas no País utilizem o Regime Diferenciado de Contratações (RDC), flexibilizando a atual lei de licitações. Se conseguir, será um gol e tanto.
O governo tenta reformular a atual lei de licitações desde 2007, sem sucesso. Gleisi, relatora do projeto, alega que o RDC é mais rápido, barato e eficiente do que a lei atual, que tem duas décadas de existência. Já a oposição apelidou o programa de Regime Desesperado de Contratações e afirma que favorece a corrupção. A senadora também terá de se empenhar para conseguir a aprovação, no plenário, de outros projetos de interesse do governo. Entre eles a MP 627, que trata do lucro das empresas com atuação no Exterior, e o Marco Civil da Internet, que Dilma gostaria de ver aprovado até o dia 23 de abril, quando acontece um evento sobre o tema.
Ao assumir a defesa do governo, Gleisi reúne capital político para exigir que o PT faça o mesmo por sua candidatura no Paraná, que, antes mesmo de ser oficializada, já enfrenta sua primeira dificuldade. Denúncias de que o deputado André Vargas (PT-PR) teria ligações com o doleiro Alberto Youssef, preso na Operação Lava Jato, suspeito de comandar um esquema de lavagem de dinheiro na campanha eleitoral de 2010, podem respingar na senadora. Vargas vinha atuando como uma espécie de coordenador da campanha da senadora. Passado do qual Gleisi, a fera do Senado, agora tentará se desvencilhar.