15/05/2015 - 20:00
Desde o estouro da crise mundial, em 2008, a Europa teve de se acostumar a crescer menos do que os EUA, em quase todos os períodos. Em três trimestres apenas, os europeus estiveram à frente, sendo o mais recente neste ano. Puxado por um avanço robusto na França e na Espanha, o PIB da zona do euro, divulgado na quarta-feira 13, cresceu 0,4% no primeiro trimestre, acima do 0,2% registrado nos EUA, no mesmo período. O resultado produziu a percepção de que a região finalmente teria encontrado a rota do crescimento sustentado, forçando o presidente do Banco Central Europeu, Mario Draghi, a afirmar que a política de estímulos será mantida até quando for preciso.
Enquanto o enredo positivo soa como novidade na zona do euro, no Reino Unido lembra uma fotografia mais antiga. O país, que integra a União Europeia, mas não adota o euro como moeda, foi o primeiro a se descolar da prostração da crise mundial, colecionando avanços desde 2013. No ano passado, cresceu 2,6%, ante 2,4% dos EUA. Pelos resultados obtidos, o primeiro-ministro David Cameron, do Partido Conservador, foi recompensado nas urnas. Em uma vitória surpreendente, contrariando o prognóstico apertado das pesquisas, Cameron conquistou maioria no Parlamento por mais cinco anos de gestão.
A economia falou mais alto. Mesmo com a deterioração nos salários e o corte de um milhão de vagas no setor público, o nível de desemprego está bem abaixo de outros países europeus. De quebra, o Reino Unido conseguiu reduzir os gastos públicos, seguindo à risca a cartilha da austeridade combatida por manifestantes em toda a Europa. “Os impactos positivos na economia deram a impressão de que os conservadores lidam melhor com desafios econômicos”, afirma Maurits Van Rooijen, da London School of Business and Finance (LSBF). A resposta conservadora das urnas britânicas influencia outros líderes da União Europeia e gera incertezas em relação à coesão do bloco. O temor mais evidente é sobre um possível desembarque dos britânicos.
A convocação de um referendo sobre o tema foi promessa de campanha de Cameron e é vista com desconfiança pelos vizinhos. Para Ana Paula Zacarias, embaixadora da União Europeia no Brasil, a permanência dos membros no bloco é fundamental para que a região deixe a crise para trás e continue prosperando. “Trabalhamos em conjunto e com o princípio de que a união é o melhor para todos”, afirma Ana Paula. “Não estamos apenas vendo a luz no fim do túnel, mas desfrutando um pouco desse sol.” Por toda Europa, desejo semelhante de trilhar um caminho independente já vinha aparecendo e pode ganhar força com o eco de Cameron.
“A questão é como a chanceler alemã Angela Merkel vai pedir para que os eleitores concordem em salvar a Europa, se há membros de grande porte deixando o bloco”, afirma Leonardo Paz Neves, coordenador de Relações Internacionais do Ibmec-RJ. Outra questão em jogo envolve a reação dos líderes da UE às evidências de que os eleitores britânicos avalizaram a política de austeridade conduzida nos últimos anos por Cameron. Para a chanceler alemã, a vitória dos conservadores pode sinalizar que uma posição mais firme em defesa da ortodoxia renderá dividendos eleitorais. Tal interpretação teria um peso adicional nas turbulentas negociações com a Grécia, cujo desfecho segue indefinido.
Na terça-feira 12, o país teve de recorrer a um fundo emergencial depositado no FMI para pagar uma prestação vencida devidas ao próprio Fundo. Com o pagamento dos € 750 milhões devidos, o país afastou o crescente temor da saída da zona do euro, mas não conseguiu se livrar de todos os problemas, já que há prazos para quitar dívidas até agosto. O uso do mecanismo de emergência revelou o estado débil das finanças gregas. Sem contar o fraco desempenho econômico da Grécia, que voltou ao campo negativo no primeiro trimestre. Sinais de que a União Europeia, 22 anos após a sua fundação, ainda custa a se encontrar como um bloco, mesmo quando a economia parece caminhar melhor.