13/04/2011 - 21:00
Dilma Rousseff mudou. A economista que chegou a Brasília no fim de 2002 como uma técnica especialista em energia, fez mais do que retocar madeixas e cirurgia plástica para melhorar o visual. Depois de ser chamada de poste, durante a campanha eleitoral, a imagem da ministra durona e ríspida deu lugar a uma presidente que mantém a fama de exigente, mas aparece segura e sorridente em todos os eventos.
Motivos para sorrir não lhe faltam na semana em que comemora seus primeiros 100 dias de mandato. Na segunda-feira 4, a agência Fitch Ratings elevou a classificação da dívida soberana do Brasil para BBB+, um nível acima do grau de investimento obtido em 2008 que abriu as portas do capital estrangeiro para o País.
“Nosso compromisso maior nesse terceiro governo, que eu tenho a honra de representar, é a superacão da pobreza em nosso país”
Dilma Roussef, presidente da República
Ainda faltam oito degraus para o topo, mas o nível atual já é suficiente para continuar assegurando recursos dos investidores institucionais, que aceitam receber menos em troca da segurança. Nada mais natural, segundo Jim O’Neill, presidente da Goldman Sachs Asset Management. “O Brasil é o país mais popular entre os Brics”, disse ele à DINHEIRO.
A presidente Dilma já havia sido brindada por outra boa notícia alguns dias antes do anúncio da Fitch. Dilma passou no teste das comparações com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na aprovação popular, maior do que de seus dois antecessores nos primeiros três meses no cargo. Uma pesquisa encomendada ao Ibope pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostrou no início do mês que o governo Dilma Rousseff tem a aprovação de 56% dos brasileiros, mais alta que a de Fernando Henrique Cardoso e do próprio Lula.
Em vez de ficar à sombra do ex-presidente petista, Dilma agora parece fazer sombra à imagem de quem a descobriu. A pesquisa dá sinais claros de que ela se saiu bem na largada. Mas revela, também, que a caminhada daqui em diante vai colocar à prova sua fama de boa técnica. O levantamento mostra que o brasileiro está satisfeito, mas também preocupado. Para 40% dos entrevistados, o combate à inflação deveria ser a prioridade número 1 do governo.
Guido Mantega: ”Estamos vigilantes e vamos tomar medidas em relação a isso (inflação),
mesmo sabendo que daqui a pouco já está caindo”
Na verdade, a inflação já está no topo das preocupações do Planalto. A alta dos preços, especialmente em função das cotações dos alimentos e commodities minerais, como petróleo e minério de ferro, deixa o País em estado de alerta. Na quinta-feira 7, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou a inflação de março, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), uma alta de 0,79%.
No acumulado dos primeiros três meses do ano, a inflação chega a 2,44%, muito alta para quem persegue a meta anual de 4,5%, ainda que haja tolerância para um resultado de até dois pontos percentuais acima desse resultado. Na soma dos últimos 12 meses até março, o IPCA chega a 6,30%, ou seja, muito perto do teto da meta.
“Estamos vigilantes e vamos tomar medidas em relação a isso, mesmo sabendo que daqui a pouco já está caindo”, afirmou o ministro da Fazenda, Guido Mantega. A diretora de ratings para a América Latina da Fitch Rating, Shelly Shetty, diz que a inflação brasileira está alinhada com a dos demais países com rating BBB e confia nas medidas que vêm sendo adotadas pelo governo. “É importante que as autoridades mirem o centro da meta, mas isso não vai acontecer neste ano”, afirmou à DINHEIRO.“Só em 2012.”
Hoje o governo tem duas prioridades, que exigem instrumentos conflitantes. De um lado, a necessidade de controlar a inflação, normalmente combatida com a elevação dos juros. De outro, precisa monitorar a valorização do câmbio, que é agravada se os juros sobem.
Ao atrair investimentos estrangeiros – seja capital especulativo pelo diferencial de juros, seja investimento produtivo pelas boas perspectivas da economia brasileira – o País vê o real se valorizar em relação ao dólar com mais oferta de moeda estrangeira no mercado interno. Somente nos primeiros três meses deste ano, as entradas de dólares superaram as saídas em US$ 35,2 bilhões, 46,2% mais do que em todo o ano passado.
É preciso, então, tentar conter a queda do dólar e, ao mesmo tempo, esfriar um pouco a economia. Para isso, o governo Dilma vem promovendo um jogo de tentativa e erro que até agora produziu resultados modestos. “Queremos conter o consumo e não prejudicar os investimentos”, afirmou Mantega na quarta-feira 6. Para calibrar, lembrou ele, não é fácil.
“Tem que ser uma dose do remédio que evite problemas colaterais”, disse. Novos aumentos na taxa de juros estão descartados, pois atrairiam ainda mais capital estrangeiro. A Fazenda entende que, ao menos no curto prazo, o melhor a fazer é ampliar as doses do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para tentar encarecer o crédito e, desta forma, desestimular o consumo.
Na semana passada, o ministro anunciou o aumento do imposto para empréstimos à pessoa física de 1,5% para 3%. E estendeu, pela segunda vez este ano, a incidência do IOF de 6% sobre a captação de crédito de empresas no Exterior. Desta vez, para empréstimos de até dois anos.
A queda da cotação do dólar mostrou que o calibre do governo ainda não é suficiente. Do início de janeiro para cá, o dólar caiu de R$ 1,68 para R$ 1,58 no dia 7. Mantega alega que, sem as intervenções, o dólar teria caído ainda mais. O economista-chefe do banco Modal Asset Management, Felipe Tamega, concorda com a tese do ministro. “O IOF reduz a velocidade da queda, embora não mude a tendência”, diz.
Tamega acredita que o País vive um novo paradigma econômico e que o câmbio já não reage da mesma forma aos fundamentos, como risco Brasil, ou variações das commodities, o que vai exigir novas fórmulas que ainda não estão claras como vão funcionar. “O governo vai aplicando medidas e só vamos aprender fazendo, para depois julgarmos se foi bom ou não”, afirma. O Modal acredita que o dólar ainda vai manter o patamar de R$ 1,65 este ano.
A dúvida agora é se a presidente Dilma terá nervos de aço para deixar o câmbio flutuar, mesmo que o real venha a se apreciar mais um pouco. Com uma moeda mais forte, as importações acabam ficando mais baratas e até ajudam a controlar a inflação. Alguns economistas chegaram a especular um novo piso para a moeda americana, de R$ 1,51, embora a pesquisa Focus, que reúne a avaliação dos principais bancos brasileiros, ainda aponte para um dólar a R$ 1,67 em dezembro.
“A taxa de equilíbrio do real é R$ 1,85”, diz o economista William Cline, pesquisador do Instituto de Economia Internacional. Segundo ele, com a taxa de juros perto de zero nos Estados Unidos, não é surpresa o elevado volume de recursos que entra no Brasil.
No caso de o dólar continuar caindo, é preciso avaliar de que forma esse novo patamar afetará a indústria exportadora e a balança comercial com o aumento das importações. O investimento estrangeiro direto poderia fechar essa conta, caso as previsões do Banco Central se confirmem. A instituição projeta uma entrada de US$ 55 bilhões até o final do ano.
A melhora do rating brasileiro, por outro lado, tem um efeito positivo sobre o custo da dívida – tanto soberana quanto das empresas, que podem captar a um custo menor. Espera-se, desta forma, que haja um aumento dos investimentos no País, o que amplia a capacidade de oferta das empresas para atender à aquecida demanda interna. Se souber conduzir por essa trilha, Dilma tem grandes chances de manter a avaliação em alta.
“O Brasil é o mais popular entre os BRICs”
Jim O’Neall, inventor da sigla Bric, falou à DINHEIRO
Como vê a elevação da nota de rating para o Brasil pela agência de risco Fitch?
Não me surpreende. Apenas reforça o entusiasmo do mundo pelo Brasil.
Os investimentos diretos no Brasil começaram fortes neste ano. Como devem se comportar em 2011?
O Brasil é provavelmente o país mais popular hoje entre os quatro BRICs. Acho que pode haver algum risco de valorização da moeda, mas o grande desafio do Brasil até pouco tempo era atrair investimento estrangeiro direto. Agora é o contrário, ou seja, administrá-lo. É um ótimo sinal.
Você diz que Brasil, Índia, Rússia e China não são mais países emergentes. Por quê?
Esses países se tornaram tão importantes que eles não deveriam mais ser considerados emergentes. O Brasil é a sétima maior economia no mundo; a China é a segunda. É até um insulto dizer que eles são emergentes. São economias em crescimento que representam, cada, 1% ou mais do PIB global.
O mercado está preocupado com a inflação. Que risco o sr. vê?
A taxa de inflação atual é uma consequência do forte crescimento no ano passado. Penso que à medida que o País se adapta ao crescimento, a inflação vai para níveis mais baixos. Não acho que há um grande problema de inflação na verdade. Mas é realmente importante que ela se mantenha baixa.