Nome recorrente na lista de empresas com maior número de reclamações nos órgãos de defesa do consumidor, a operadora de telefonia TIM agora integra uma outra lista, a da Operação Zelotes. A empresa é uma das 70 investigadas pela Polícia Federal e o Ministério Público, suspeita de participação num esquema de compra de decisões favoráveis em recursos contra multas ou dívidas contra a União. O esquema vem sendo investigado há dois anos por um grupo formado por PF, Ministério Público, Corregedoria do Ministério da Fazenda e Receita Federal.

As empresas suspeitas teriam pago propina para escritórios de advocacia, que, por sua vez, subornavam conselheiros do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), um órgão ligado ao Ministério da Fazenda ao qual contribuintes podem recorrer de multas e outras dívidas. O cadastro do Carf mostra quatro processos envolvendo a TIM. O mais antigo foi iniciado em 2005 e refere-se a débitos de Cofins. Outro, de 2006, trata de IRRF (Imposto de Renda Retido na Fonte), assim como um terceiro, iniciado em 2008. Outro processo, também de 2008, não informa o tributo que gerou a dívida.

Em nota (leia a íntegra abaixo), a TIM confirmou ser “frequentemente” procurada por escritórios de advocacia interessados em assessorar a empresa em processos que tramitam no Carf, mas afirma “só trabalhar com empresas idôneas”. Esta não é a primeira vez que a operadora de telefonia se envolve em polêmicas de repercussão internacional. Em agosto de 2013, funcionários da TIM espionaram dados do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da presidente Dilma Rousseff no cadastro da Serasa. A consulta foi feita a partir de terminais de uma das lojas, sem justificativa, já que nenhum dos dois procurou a loja como cliente.

Um mês antes, em julho de 2013, o ex-CEO da empresa no Brasil, Marco Tronchetti Provera, foi condenado por receptar dados roubados no período em que esteve à frente da Telecom Itália, controladora da TIM brasileira. Os dados entregues a Provera teriam sido roubados de uma agência, que por sua vez bisbilhotava a Telecom Itália, na época numa disputa comercial com a Brasil Telecom, antigo nome da Oi. Fora do âmbito criminal, a TIM também é tema frequente entre os clientes da companhia. Segunda maior operadora de telefonia móvel do País, a empresa é a líder em reclamações na Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). No ano passado, a empresa recebeu 335,5 mil queixas de consumidores insatisfeitos com a qualidade dos serviços.

No Índice de Desempenho de Atendimento (IDA), figura em terceiro lugar no levantamento mais recente, de outubro do ano passado. O índice de reclamações da empresa, de 0,426 por mil acessos, é mais do que o dobro da meta de 0,2 estabelecida pela agência reguladora. Além dos problemas enfrentados nos órgãos reguladores e junto a seus clientes, a empresa está em uma encruzilhada em sua estratégia de mercado. Isso porque a TIM é a única companhia, entre as quadro maiores do País, que não opera nas quatro linhas de atuação: celular, telefonia fixa, banda larga e tevê por assinatura. Nesses dois últimos quesitos, a operadora possui uma base minúscula de clientes (caso da banda larga) ou sequer oferece o serviço, como acontece na tevê paga.

Tal deficiência torna a companhia extremamente dependente dos clientes pré-pagos, que são quase 80% de todas as linhas ativas do mercado e cujos gastos médios mensais são de apenas R$ 12. As contas dos chamados “combos”, que integram todos os serviços em uma única fatura, passam de R$ 100. Segundo um alto executivo do setor, que preside uma concorrente, “a estratégia da TIM não é sustentável em longo prazo”. Se não ganhar musculatura com novos serviços para aumentar a rentabilidade, a TIM acabará sem fôlego para disputar esse mercado concorrido com a Vivo, a Claro e a Oi. “Ela acabará sendo vendida ou irá se fundir a outro grupo se não aumentar a escala”, afirma.

INVESTIGAÇÃO Além da TIM, várias outras empresas brasileiras e contribuintes estão sendo investigados na operação Zelotes (em grego, o nome quer dizer imitador ou seguidor). Um deles é o Partido Progressista, que tem uma dívida previdenciária de R$ 9,2 milhões considerada suspeita, que ainda está sendo monitorada pela Receita e não está incluída. A Ford está sendo investigada por causa de uma alteração em uma medida provisória, que teria beneficiado a empresa. A Operação começou há dois anos, quando o procurador Frederico Paiva, coordenador do núcleo de combate à corrupção no Distrito Federal, recebeu uma carta anônima denunciando o esquema.

Embora correspondências anônimas não sejam consideradas provas para este tipo de investigação, esta tinha tantos detalhes que permitiu que a Polícia Federal e os técnicos da Receita e do Ministério da Fazenda analisassem as decisões suspeitas e, através de escutas telefônicas e quebras de sigilo de comunicação, chegassem aos primeiros suspeitos. As primeiras apreensões, autorizadas pelo juiz Ricardo Soares Leite, da 10ª Vara Federal, foram realizadas no dia 26 de abril em 41 endereços em Brasília, São Paulo e Ceará. Nesta primeira fase, elas se concentraram nos escritórios que oferecem o serviço de intermediação entre as empresas devedoras e os conselheiros do Carf que recebem dinheiro para alterar o resultado das decisões.

As empresas citadas negam conhecer ou ter envolvimento com o esquema. A quebra do sigilo bancário mostrou a movimentação de recursos milionários, inclusive com esquema de lavagem de dinheiro e transferência de valores para contas no exterior. Dez ex-conselheiros do Carf e um ainda em atividade, Paulo Roberto Cortes, estão sendo investigados. O juiz não autorizou, no entanto, prisão preventiva dos acusados. “Os suspeitos estão combinando depoimento, o que torna mais difícil a apuração”, lamenta o procurador Frederico Paiva, que também teve negado o pedido de suspensão do sigilo da documentação, para evitar vazamentos seletivos das informações.

Os 70 processos suspeitos envolvem o perdão de dívidas no valor total de R$ 19 bilhões. Há indícios mais fortes de irregularidades em R$ 5,7 bilhões. A taxa de sucesso, nos contratos já vistos pelos policiais e técnicos da Fazenda, varia entre 1,5% e 5% da dívida liberada. Após a análise dos documentos apreendidos, que deve demorar pelo menos dois meses, os investigadores esperam chegar às empresas que pagaram propina. A análise dos primeiros contratos já mostrou que os técnicos estão no caminho certo.

Para acelerar a verificação dos documentos, Paiva pediu na terça-feira 31 ao procurador-geral da República que crie uma força-tarefa para cuidar do caso. Na avaliação dele, o avanço pode mostrar um volume de corrupção muito superior ao dos contratos da Petrobras. “O esquema é muito grande, tem muito dinheiro envolvido, mas é muito difícil comprovar esses casos de corrupção”, afirmou Paiva. O Carf já estava na mira do grupo que investiga corrupção há bastante tempo. O Conselho é presidido por Carlos Alberto Barreto, ex-secretário da Receita Federal. Possui 216 integrantes, 108 representantes da Fazenda e a outra metade dos contribuintes. Por ora, novos julgamentos estão suspensos.

Leia a nota da TIM sobre a Operação Zelotes: 
 
“A TIM, assim como outras grandes empresas, possui processos em andamento no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), sendo frequentemente contatada por escritórios de advocacia interessados em assessorar a companhia nesses casos. Em linha com sua conduta ética e rigorosa, a TIM opta sempre por atuar em parceria com escritórios reconhecidos e respeitados por sua total e irrepreensível idoneidade. Dessa forma, a operadora refuta veementemente uso de práticas indevidas em seus processos junto ao CARF ou qualquer outra instância administrativa de julgamento de questões tributárias federais e não tem nenhuma informação oficial de qualquer questionamento, além de estar à disposição para colaborar com as investigações e apoiar as finalidades da operação. A companhia acompanhará o desdobramento do assunto e se resguarda ao direito de tomar as medidas legais cabíveis contra condutas difamatórias.”