Não é mais segredo para ninguém que os maiores bancos do mundo já adaptaram os seus sistemas para um possível fim do euro. Embora isso não signifique que o renascimento de moedas como o dracma grego, o marco alemão e a peseta espanhola seja provável, o assunto foi novamente discutido, desta vez no Fórum Econômico Mundial, que começou na quarta-feira 25 em Davos, na Suíça. Em busca de soluções para a crise europeia, chefes de governo, banqueiros e economistas participaram de inúmeros debates durante o evento, cuja programação de lazer costuma ser muito atraente, com festas de arromba nos luxuosos hoteis. Logo na abertura, a todo-poderosa chanceler alemã, Angela Merkel, deixou claro que o país não está disposto a todo tipo de sacrifício para encontrar uma saída rápida para a crise econômica. 

50.jpg

Revolta: manifestante constrói um iglu em Davos para protestar

contra a elite econômica.

 

Merkel não aceita a ideia de turbinar o Fundo Europeu de Estabilização Financeira como forma de acalmar o mercado financeiro. Segundo ela, quanto mais dinheiro for oferecido, maior será a demanda dos especuladores. O fundo, que possui € 500 bilhões em caixa atingiria o número mágico de € 1 trilhão defendido por países como Espanha e Itália. A chanceler alemã disse que é plenamente solidária, mas não assumirá novos compromissos. “Se a Alemanha prometer uma coisa que não possa ser entregue, a Europa ficará com um flanco aberto em caso de ataques dos mercados”, afirmou Merkel. O economista Klaus Schwab, que preside o Fórum, não entrou na polêmica, mas alertou para o fato de que as pessoas estão perdendo a confiança nos líderes e encarando a vida apenas como um sacrifício, o que pode gerar conflitos sociais, protecionismo e nacionalismo. 

 

“Isso tudo pode precipitar a espiral de queda da economia global”, disse Schwab. A lógica por trás do jogo alemão é obrigar os países em crise a ceder mais soberania fiscal à União Europeia. “Os alemães não querem dar um cheque em branco”, diz Flávio Serrano, economista-sênior do BES Investimento. “Eles podem até pagar a conta da crise, mas os demais países também terão de dar a sua cota de sofrimento.” O megainvestidor George Soros também deu os seus pitacos em Davos e defendeu que a Itália e a Espanha refinanciem suas dívidas pagando apenas 1% de juro, contra os 7% atuais. Soros disse que uma das falhas da construção da União Europeia foi criar uma moeda única sem um Tesouro comum a todos os países. Porém, o megainvestidor não acredita que a solução da crise virá através do rigor fiscal. “O problema é que a austeridade que a Alemanha quer impor empurrará a Europa na direção de uma espiral deflacionária.” 

 

51.jpg

Debate sem-fim: Klaus Schwab, criador do Fórum Econômico, abre o evento ao lado

da chanceler alemã Angela Merkel.

 

Em outras palavras, quanto maior o aperto fiscal, mais demorada será a retomada econômica. Soros não está sozinho. O Prêmio Nobel de Economia Joseph Stiglitz aposta que o salvamento do euro será dificultado pela austeridade fiscal. O correto, diz ele, é estimular a economia. Stiglitz defendeu, na Suíça, a criação de eurobônus para reduzir o custo da dívida, além de uma atuação mais incisiva da autoridade monetária do bloco através da compra de títulos podres. “O Banco Central Europeu tem de pôr os interesses dos países à frente dos interesses dos bancos”, afirmou Stigltiz.Enquanto isso, em Porto Alegre, a milhares de quilômetros de Davos, o Fórum Social Mundial promovia debates com críticas ao capitalismo. Não faltaram ironias às elites reunidas nos Alpes Suíços, que não conseguiram prever a crise atual. 

 

O empresário Oded Grajew, que criou o encontro social em 2001, explica que o slogan “Um outro mundo é possível” é uma resposta ao Fórum Econômico. “Eles estão sempre atrasados, não viram a crise”, afirma Grajew à DINHEIRO. “No ano passado, por exemplo, o presidente americano, Barack Obama, e o presidente francês, Nicolas Sarkozy, falaram que foram pegos de surpresa com a Primavera Árabe. Nós não. Quem participou do Fórum Social na África viu essas articulações sendo feitas lá.” Como os dois eventos acontecem simultaneamente, a presidenta Dilma Rousseff não teve dúvidas na hora de escolher a qual deles iria. Entre o gelo da Europa e o calor do Brasil, ela ficou por aqui. De quebra, recebeu no mesmo dia em que participou dos debates em Porto Alegre a notícia de que o País encerrou 2011 com a menor taxa de desemprego da história: 4,7%. Os europeus devem estar se “derretendo” de inveja…