15/04/2016 - 18:43
O avanço das tecnologias e o poder de escala de grandes companhias fizeram com que algumas profissões, outrora fundamentais, fossem descartadas ou deixadas de lado. Datilógrafos e ascensoristas, por exemplo, já não se encontram mais. Por conta do crescimento das grandes grifes, tudo indicava que o serviço de alfaiate poderia seguir caminho semelhante. Não aconteceu. Atualmente, homens bem-sucedidos e preocupados com a aparência procuram os cobiçados profissionais e chegam a pagar até R$ 70 mil em um costume, que contempla calça, paletó e colete.
E eles não se importam em esperar meses para poder levar a roupa. “Para o meu público não existe crise”, diz Alexandre Won, dono de um ateliê que leva o seu nome e que recebe até 50 pedidos por mês. “Enxerguei uma grande oportunidade neste setor.” Na infância, Won assistia sua mãe produzir roupas sob medidas para clientes e a própria família. A figura materna foi a grande inspiração e a responsável por ensiná-lo a dar as primeiras agulhadas. Com um lado artístico vindo de berço, o agora alfaiate não conseguiu seguir na carreira de advogado.
Formou-se pela PUC-SP em direito, passou no exame da OAB e chegou a trabalhar em escritórios de advocacia. Seus problemas, no entanto, se iniciaram logo na hora de se arrumar para o trabalho. “Contratava alfaiates, mas os ternos chegavam a voltar para oito ajustes”, diz Won, atualmente com 34 anos. “Até o momento em que o profissional se recusava a alterar a peça por dizer que se tratava de frescura da minha parte.” Foi aí que o então advogado enxergou a oportunidade. Hoje, Won, que dispõe de 15 funcionários em seu ateliê em São Paulo, atende celebridades do porte do publicitário e apresentador Roberto Justus e do jogador de futebol Kaká. O preço inicial para se ter um costume assinado por ele é de R$ 6,9 mil.
Won é um dos expoentes da nova alfaiataria brasileira. Quem diz isso é o presidente da Associação dos Alfaiates e Camiseiros do Estado de São Paulo (AACESP), Felipe Jarnallo. Atualmente, de acordo com Jarnallo, o importante não é só o perfeccionismo na confecção, mas também o tratamento e a parceria com o cliente. “Eles não precisam se preocupar apenas em costurar, pois têm uma equipe para isso”, diz. “Nos novos tempos, o alfaiate também é um consultor de estilo.” Preocupado com esse nicho, o próprio Won conta com a ajuda da sócia Ana de Sá, responsável por atender os clientes preocupados com detalhes para compor o visual, como acessórios e até penteados.
O atendimento, inclusive, é feito por aplicativos como o WhatsApp. A tecnologia também é aliada de outros profissionais. É o caso do paulistano João Camargo, dono da Camargo Alfaiataria. A sua fábrica em São Paulo possui 70 funcionários, que se revezam nas máquinas para criar ternos sob medida e semiprontos. A capacidade de produção da grife de um bolso do paletó, por exemplo, passou três por hora, quando feito artesanalmente, para mais de dois mil por dia. “Quebramos essa barreira de que só o que era feito à mão era de qualidade”, diz Camargo. “Hoje, a praticidade conta”
Atualmente, Camargo leva até 45 dias para produzir ternos sob medida, que começam em R$ 7 mil. Mesmo não acompanhando todo o processo, ele garante estar em ao menos uma prova de todos os clientes da sua boutique. Com essa proximidade, o faturamento da empresa aumentou 23% no ano passado. “O ofício de alfaiate se perdeu na década de 1980. E era o único lugar que o homem se sentia à vontade para comprar roupa”, diz Camargo. Um dos responsáveis por esse movimento de volta dos alfaiates atende pelo nome de Ricardo Almeida.
Foi Almeida que, por exemplo, remodelou o ex-metalúrgico Lula para a disputa presidencial de 2002, ano em que foi eleito. O estilista foi responsável por vestir Lula até o fim do seu mandato, em 2010. “É um mercado que nunca vai acabar”, diz Almeida, sem entrar no mérito das deselegâncias políticas atuais. Hoje, para se ter um terno feito por ele, o comprador precisa desembolsar R$ 15 mil. “A alfaiataria brasileira é muito respeitada no mundo inteiro”, diz ele, que comemora a alta do dólar. “O número de pedidos de estrangeiros só cresce.”