14/08/2015 - 19:30
A nova geração de brasileiros passa, pela primeira vez na sua história, por uma crise. Aqueles que nasceram na década de 1990, por exemplo, muitas vezes sequer se lembram que existiram outras moedas além do real. Seus pais e avós, mais calejados por hiperinflações, plano Sarney, plano Collor, entre tantos outros que enfraqueceram a economia do País, podem ter se tornado superprotetores. Essa é a opinião de Jorge Paulo Lemann, o homem mais rico do Brasil e um dos sócios da 3G Capital, empresa de investimentos que tem em seu portfólio companhias estreladas do porte da AB InBev, Kraft-Heinz e Burger King, entre outras. Lemann discursou para 800 espectadores no evento Day1, da Endeavor, em São Paulo, na quinta-feira 13, e foi enfático: “Deixem seus filhos fazerem burradas, isso vai ser valioso no futuro.”
Lemann é considerado pelos jovens brasileiros um dos homens de negócios mais admirados do mundo. Em pesquisa realizada pelas consultorias Cia de Talentos e Nextview People, no ano passado, o empresário foi avaliado como o melhor líder empresarial por mais de 50 mil pessoas, entre 17 e 26 anos. Aprender a perder e tirar partido da chamada contribuição milionária dos erros é a lição que ele quer passar para a geração abaixo dos trinta anos. Para ele, essa é a melhor maneira de saírem fortalecidos do atual momento de turbulência econômica, que, para muitos, é a primeira grande crise de suas trajetórias profissionais. “O caminho para o sucesso nunca é uma linha reta: sempre haverá altos e baixos”, afirmou Lemann, por mais de uma vez, em seu discurso.
Trajando calça branca e uma blusa de lã bege, o megaempresário lembrou o início da sua carreira de tenista no Rio de Janeiro, ainda criança. “Aos 12 anos, eu perdi para um boliviano”, disse. “Vocês imaginam um brasileiro perdendo para um boliviano?” Apesar de ser um jovem adolescente, para o sócio da 3G Capital aquela derrota foi fundamental para o seu crescimento. “Desde então, eu aprendi que não ia ganhar sempre na vida”, afirmou.
Desse momento em diante, Lemann colecionou uma série de fracassos, como tantos alunos deslumbrados com as farras das universidades. Ele quase foi expulso de Harvard, quando acendeu fogos de artifício no campus da faculdade americana.
A recuperação do prestígio em uma das mais renomadas instituições do mundo veio com muito suor e trabalho. Segundo Lemann, não era nada fácil estudar dez horas diárias, ainda mais para um “surfista da praia do Arpoador”. “Nessa época, eu aprendi a ter foco”, disse. “Descobri que precisava priorizar as cinco coisas mais importantes de qualquer tema, seja qual forem, e até hoje levo esse ensinamento para o dia a dia das nossas empresas.” A falência da sua primeira financeira, a Invesco, foi outro dos duros ensinamentos na vida de Lemann. “Os meus sócios e eu só pensávamos em vender e não olhávamos a retaguarda”, disse. “Foi aí que eu aprendi a valorizar os goleiros.”
Um dos defeitos da chamada Geração Y, apontados por especialistas, é a sua excessiva autoconfiança. Na cabeça dos jovens, eles são seres especiais, donos da verdade, infalíveis, esperando apenas aquela grande oportunidade que precisa vir rapidamente. Nada mais distante do perfil de Lemann. Às vésperas de completar 76 anos, no próximo dia 26, o homem mais rico do País, embora reservado por natureza, é do tipo que ao chegar ao escritório saúda com um sonoro bom dia quem vê pela frente, da funcionária do cozinha ao mais graduado executivo. E que, apesar do sucesso, não esconde seu medo de falhar. Nesse sentido, ele lembrou de um especulador chamado de “Mendoncinha”, que era cliente da Invesco e alavancou seu portfólio com a antiga Companhia Siderúrgica Belgo-Mineira, atual ArcelorMittal. Em 1964, no entanto, a bolsa despencou 70% e Lemann viu seu cliente e a financeira perderem muito dinheiro. “A bolsa deu uma guinada pouco tempo depois e ele poderia ter sido um dos homens mais ricos do País até hoje”, disse. “Na época, aos 24 anos, ganhei uma boa noção da importância do timing.”
Mendoncinha sumiu do mapa, mas continuou bem vivo na cabeça de Lemann. Mais precisamente em 2008, o empresário se viu nos sapatos do antigo cliente. Quando a InBev fez a proposta de US$ 52 bilhões pela aquisição da americana Anheuser-Busch, dona da cerveja Budweiser, Lemann e seus sócios Marcel Herrmann Telles e Beto Sicupira se depararam com uma dívida de mais de US$ 54 bilhões. “Eu pensei que seria o novo Mendoncinha”, afirmou, arrancando risos da plateia. “Mas deu certo e estou aqui.”