Há duas formas de analisar a compra da empresa de mídia Time Warner pela a de telefonia AT&T, por US$ 85,4 bilhões, anunciada no sábado, 22 de outubro, nos Estados Unidos. A primeira sob o aspecto do mercado americano. Trata-se de uma óbvia resposta à rival Verizon, que comprou a AOL, por US$ 4,4 bilhões, em 2015, e o Yahoo, por US$ 4,8 bilhões, neste ano (este acordo ainda não foi concluído). De forma mais abrangente, a bilionária transação indica que as operadoras de telecomunicações buscam um caminho para enfrentar a saturação do mercado de celulares e a competição com a plataforma de streaming de vídeos Netflix e com outros serviços de internet, como o aplicativo de mensagens WhatsApp, do Facebook. “O conteúdo premium sempre ganha”, disse Randall Stephenson, CEO da AT&T, em um comunicado. “Isso tem sido verdade na tela grande e na tevê e agora nas telas dos smartphones.”

A união de AT&T e Time Warner cria um conglomerado gigante. Juntas, ambas faturam US$ 214,5 bilhões (aproximadamente R$ 675 bilhões). A empresa de telefonia passaria a ser dona da HBO, produtora das mais aclamadas séries televisivas do momento, como a “Games of Thrones” e “Westworld”. O canal de notícias CNN e o infantil Cartoon Networks também fazem parte do portfólio da Time Warner, além do estúdio que produz filmes como Batman e Harry Porter. A AT&T, maior empresa de telefonia dos Estados Unidos, é dona da empresa de tevê por assinatura via satélite DirecTV, que controla a Sky no Brasil (leia texto ao final da reportagem). “As empresas de telefonia estão com medo de transformarem em canos burros”, diz Willy Shih, professor da prática de gestão da Havard Business School. “Por essa razão, querem possuir seu próprio conteúdo.”

Um estudo da consultoria americana EY, realizado no ano passado, mostra que as operadoras perderam 8% de seu faturamento de voz para serviços chamados “over-the-top” prestados pela internet, como Netflix e WhatsApp. Entre 2005 e 2012, o volume de chamadas celulares caiu pela metade dos Estados Unidos. No Brasil, a receita de dados superou a de voz pela primeira vez no Brasil, em 2015, de acordo com a consultoria Teleco. Qual a solução? Na pesquisa da EY, executivos de telecomunicações apontaram a área de tevê e vídeo como a mais promissora para obter crescimento de receitas. “As operadoras estão em um movimento de buscar e de ampliar a atuação para fora da área de conectividade”, diz Eduardo Tude, presidente da Teleco. “Vê-se um esforço na área de conteúdo e de internet das coisas.”

Essa tendência já pode ser observada no mercado brasileiro – em menor escala, evidentemente. A Telefônica Vivo acaba de anunciar parceria com a francesa Vivendi no aplicativo Studio +, que desenvolve séries exclusivas para celulares. “É o Netflix dos smartphones”, afirmou Amos Genish, presidente da operadora. A operadora do grupo espanhol tem mais de 80 serviços digitais, que vão desde cursos de inglês até aplicativos para shows musicais. A Oi, que está em recuperação judicial, aposta em internet das coisas. Ela lançou uma plataforma de monitoramento de residências e pequenas empresas, que pode ser controlada à distância pelo celular ou tablet. A TIM investe em serviços de big data e a Claro conta com 11 milhões de clientes de serviços digitais, como Claro Música ou Vídeo, rivais do Spotify e Netflix. A única certeza é se fosse uma série televisiva, a batalha pelo conteúdo estaria apenas em sua primeira temporada.

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O que será da Sky?

A compra da Time Warner pela AT&T, se aprovada pelas autoridades antitruste americanas, tem implicações no Brasil. A legislação brasileira diz que empresas de tevês pagas não podem deter participação superior a 50% em companhias que produzem conteúdo. A Time Warner é dona de canais pagos, como HBO, CNN e Cartoon Network, entre outros. A AT&T, por sua vez, controla a DirecTV, que detém a tevê por assinatura Sky. Com isso, a empresa resultante da união de AT&T e Time Warner teria de abrir mãos de alguns ativos. E a venda da Sky seria uma das melhores opções à mesa.

Quem poderia levar a Sky? A Telefônica Vivo já manifestou, no passado, interesse em comprá-la. A operadora de origem espanhola conta com apenas 1,7 milhão de clientes em tevê por assinatura, o que representa uma fatia de 9,3% do mercado. Está bem atrás da mexicana América Móvil, que é dona da NET, e detém 52,7% do setor, e da própria Sky, com 28,2%. Se comprar a Sky, a Telefônica triplicará sua participação. 
A tevê por assinatura vem perdendo clientes no Brasil. No primeiro trimestre de 2015, atingiu seu pico, quando somou 19,7 milhões de assinantes. Em agosto deste ano, tinha 18,9 milhões. Essa queda não pode ser atribuída exclusivamente à crise econômica. A concorrência com o serviço de streaming de vídeos americanos Netflix tem uma boa parcela de culpa para essa queda.