O ritmo de verão do mês de agosto, na Alemanha, reduziu algumas vagas de trabalho temporárias, mas não a ponto de alterar uma das menores taxas de desemprego das últimas duas décadas. Com um índice de desocupação de 6,8%, os alemães são capazes de reconhecer que a nação germânica vai bem, apesar dos problemas que persistem além da fronteira. Mesmo com um pibinho previsto de 0,3% para este ano, a percepção de uma economia em movimento explica a vitória do partido social democrata da chanceler Angela Merkel, nas eleições parlamentares realizadas no domingo 22. “Vamos lidar com esta vitória com responsabilidade”, disse ela, ao receber a notícia da vitória nas urnas. 

 

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Angela Merkel: a dama de ferro alemã pode superar o reinado da inglesa Margaret

Thatcher: “Vamos lidar com essa vitória com responsabilidade”

 

Ao final do mandato, a durona Merkel terá superado o longo reinado da dama de ferro Margaret Thatcher, a líder conservadora que governou a Inglaterra por 11 anos. A mão firme da mandatária, que anunciou em 2009 a decisão de seu país de liderar a retomada da economia europeia, foi premiada com um terceiro mandato, ao conquistar 41,5% dos votos, oito pontos a mais do que há quatro anos. Se a força da economia alemã lhe garantiu uma posição de destaque no continente, Merkel exerceu como poucos a liderança num dos momentos mais delicados do bloco. Foi drástica no controle das contas públicas, fórmula estendida aos países que precisaram pedir socorro financeiro aos vizinhos ricos. 

 

A confirmação do seu nome como chanceler, portanto, sinaliza que o foco na disciplina fiscal vai novamente marcar a Europa, que ensaia os primeiros sinais de recuperação depois de ser castigada pela recessão que eclodiu com a crise financeira de 2008. Trata-se de uma boa notícia para os alemães, mas uma grande incógnita para os países que não contam com uma indústria forte. É o caso da Grécia, que aguarda uma nova parcela de empréstimos da União Europeia, até outubro. Ao contrário dos franceses, britânicos ou alemães, os gregos ainda vão amargar quedas no PIB. Neste ano, a previsão é de recuo de 3,8%. Merkel já foi mais severa em suas posições, e acabou recuando diante da paralisia dos demais países do bloco. 

 

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Pujança industrial: fábrica da inglesa Rolls-Royce em Dahlewitz, ao sul de Berlim.

Alemanha tem desemprego baixo: 6,8%

 

Agora, ela precisa encontrar o caminho do meio entre equilíbrio fiscal e incentivos para reduzir a sangria nas economias europeias. “É preciso uma liderança que invista numa política permanente de criação de empregos”, afirma o professor Georges Haour, da escola de negócios suíça IMD. “Caso contrário, a juventude voltará a ocupar as ruas na Europa.” A aposta geral é que a Alemanha vai ajudar a apontar atalhos para que o bloco, como um todo, retome o crescimento. “Isso é bom para o Brasil, pois nos interessa uma Europa com o pé no acelerador, em vez de um pé no freio”, diz Ingo Plöger, conselheiro sênior da Câmara Brasil-Alemanha de São Paulo. A busca por saídas para a crise deve incluir, também, uma política externa mais agressiva, incluindo novos acordos comerciais. 

 

A UE já está negociando um tratado de livre comércio com os Estados Unidos, e vem estreitando laços com a China. “Os alemães têm a simpatia dos chineses, a começar pelo nome do país: na Ásia, ‘Germany’ quer dizer país virtuoso”, diz Haour, do IMD. Os empresários brasileiros também esperam se beneficiar dessa abertura, com um acordo de livre comércio que está sendo discutido entre o Mercosul e os países da UE. O Brasil, contudo, já sinalizou que deve sair na frente de seus parceiros do bloco para driblar as amarras nas regras que previam negociações em conjunto. “Desta forma, poderemos reduzir tarifas até dez anos antes que os demais países para alguns produtos, se for o caso”, diz Plöger.

 

 

 

Adeus, Zona de Conforto

 

A mensagem em cadeia nacional do rei da Holanda, Willem-Alexander, no último dia 17, deixou claro que a Europa do século 21 já começou a rever alguns conceitos. “O clássico Estado do bem-estar social da segunda metade do século 20 trouxe arranjos que são insustentáveis atualmente”, afirmou o monarca. Foi dessa maneira, que Willem-Alexander começou a preparar os holandeses para o futuro, lembrando-os de que eles terão de aumentar sua poupança, pensando no longo prazo. 

 

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O posicionamento marca uma divisão de responsabilidades com a população, depois da crise que sacudiu o continente. “A tendência geral na Europa é de menor envolvimento do Estado na garantia de benefícios sociais”, diz o professor Kai Enno Lehmann, doutor em relações internacionais. Definitivamente, a zona do euro está saindo na zona de conforto.