Há 35 anos, a comerciante Imara Borges de Oliveira decidiu abrir uma franquia de O Boticário. Naquele tempo, as lojas da marca estavam começando a deslanchar no Brasil. A fabricante de perfumes e cosméticos, de origem paranaense, aderira ao formato apenas cinco anos antes. Para Imara, o modelo foi um suceso. Hoje, suas filhas Flávia e Fabiana, são sócias do negócio, formado por 24 unidades espalhadas em 14 cidades da região de Ribeirão Preto, no interior paulista. Acompanhando as transformações do varejo ao longo dos anos, as franquias da família Borges de Oliveira foram escolhidas pela marca em 2019 para fazer parte de um projeto piloto que buscava promover a digitalização das unidades. O objetivo era garantir a presença das franquias no mundo digital de forma gradual. No meio do caminho veio a pandemia, que acelerou a estratégia. Com as restrições ao comércio físico, foi necessário implementar o projeto em toda a rede. Aproveitando do comércio eletrônico, o formato se tornou a salvação do modelo de negócio que sustenta a operação da marca.

À primeira vista, a ideia é simples. Permitir e incentivar que as franquias tenham páginas no Instagram para promover os produtos e criar relacionamento com os clientes. Nos bastidores, porém, para que as atuais 1,6 mil páginas de franqueados funcionem, é preciso esforço de comunicação e muita tecnologia. Além de uma página na rede social, a comercialização do portfólio por canais fora da loja física exigem integração e uma estratégia omnichannel muito bem construída. Ela precisa permitir que o consumidor veja uma publicação na página de uma das franquias e decida comprar o produto no dia seguinte, pelo WhatsApp, e retirar em uma loja física.

Para Lyana Bittencourt, CEO de uma consultoria especializada em franquias, os consumidores aprenderam com a comodidade e o varejo precisa acompanhar esse movimento que não tem mais volta. “Mudou a percepção de que o fluxo da loja não depende exclusivamente de onde ela está localizada. Essa é uma mudança que interfere em todo o restante”, disse Lyana. Atualmente, 90% das franquias de O Boticário possuem páginas nas redes sociais. Até final do ano, 100% devrão estar no Instagram — seja com páginas por lojas únicas, seja por região, escolha que depende dos negócios do franqueado. Além disso, ter atuação on-line se tornou uma obrigatoriedade estipulada nos novos contratos de franquia da marca.

O projeto que começou pequeno, com convites a alguns participantes, hoje ele é tido como essencial para o funcionamento do negócio do grupo. A direção do Boticário não divulga dados de desempenho das lojas, mas ao que tudo indica, o formato tem feito sucesso. Segundo a especilista Lyana, com base em dados do mercado m gera, algumas lojas já fazem 50% do faturamento no ambiente digital. As vendas podem ter início na loja física, por meio de uma consultora ou de publicação nas redes sociais, e não necessariamente são concluídas com o cartão sendo passado na máquina do balcão.

Claudio Gatti

“Temos acelerado as nossas contratações em tecnologia, investindo em startups que nos ajudem a melhorar os processos” Rafael Marconi. diretor executivo de Franquias do grupo Boticário.

LIVE COMMERCE Uma das filha da pioneira Imara, Flávia Borges está entre as franqueadas que atestam os benefícios da estratégia digital para as suas lojas. Somando mais de 80 mil seguidores no Instagram, ela viu o tíquete médio das vendas on-line subir. “São tantas oportunidades. Vemos como uma alavanca de negócio e apostamos nisso”, disse Flávia. Segundo ela, sua principal arma de vendas é o live commerce, que vem ganhando escala no varejo brasileiro. Em 2021, somando todas as suas lojas, foram realizadas quase 350 lives. Este ano, até agora, já foram 200. Ao menos uma é realizada por mês em cada unidade. Rentáveis, elas permitem a venda de produtos com estoque sem a necessidade de aplicar grandes promoções, favorecendo o desempenho geral e permitindo a consolidação das metas.

Para que essa presença digital funcione, as franquias de Flávia têm um profissional que auxilia e treina as equipes de venda a conversar e a se comportar em frente às câmeras e no ambiente virtual. Como um case de sucesso do projeto, a diretora de marketing regional de O Boticário, Jacqueline Tobaru de Matos, entende que nem toda a cadeia de franqueados está no mesmo patamar e por isso o grupo oferece treinamentos para que essa transformação digital aconteça da melhor forma para todos. “São curvas diferentes de adoção. Acho que isso é supernatural para a gente também”, disse Jacqueline.

Esses treinamentos integram os esforços de comunicação da marca que possibilitam o êxito do projeto. Afinal, permitir que o franqueado seja uma voz da empresa nas redes sociais em contato direto com o cliente exige confiança, mas também certo nível de controle. Seja de monitoramento, treinamento ou com a produção de conteúdo. Dar autonomia traz como ganho uma aproximação através da regionalização. Descentralizar, aqui, significa trazer mais identificação com a marca, já que além das informações gerais divulgadas nas páginas oficiais é possível trazer caras, sotaques e comunicações próximas do dia a dia de cada cliente. “É sim uma alavanca de vendas, mas também de branding e relacionamento. Não é só performance”, disse Jacqueline.

FORA DAS REDES A página no Instagram é a ponta do iceberg da digitalização. O avatar e o feed bonito representam a parte final de um processo que é indissociável da tecnologia. Sabendo disso, o Grupo Boticário tem investido no segmento. No último ano foram quatro aquisições, todas em empresas de tecnologia para o varejo, logística digital e inteligência artificial. “Temos acelerado as nossas contratações em tecnologia, investindo em startups que nos ajudem a melhorar os processos”, afirmou o diretor executivo de Franquias do grupo, Rafael Marconi. Para ele, isso permite impulsionar os negócios e conseguir atender qualquer pessoa em qualquer lugar.

Dona da maior rede de franquias do Brasil, de acordo com o Ranking da Associação Brasileira de Franchising, com mais de 3,6 mil unidades em 2021, a marca O Boticário adotou, segundo Marconi, a estratégia de construir um sistema que seja rentável e possua recursos e ferramentas digitais que integrem a experiência do cliente. Para a consultora Lyana Bittencourt, esse caminho envolve uma transformação do modelo padrão de lojas. O ponto físico passa a agregar outras funções, ampliando seu papel e mantendo a importância na jornada digital da consumidora.

Os resultados dessa transformação se refletem no desempenho do Grupo Boticário. Além da marca de mesmo nome, as operações incluem Beleza na Web, Eudora, Oui, Quem Disse Berenice?, The Beauty Box e Vult. Em 2021, o faturamento cresceu 15%, alcançando R$ 18,1 bilhões, e as vendas digitais aumentaram 33%. Ainda na soma das conquistas, em 2022, pela primeira vez, O Boticário ficou à frente da concorrente Natura no ranking das Marcas Mais Valiosas do Brasil da DINHEIRO.
Atuando em um mercado que deve chegar a R$ 129,8 bilhões em 2026, de acordo com levantamento da Euromonitor International, espaço para crescer não falta. Em uma era pós-pandemia, na qual tudo é híbrido, a atuação da empresa não é diferente. Sem abrir mão de 40 anos de desenvolvimento das franquias, O Boticário busca formas de manter o modelo saudável, ao mesmo tempo em que se adapta para as necessidades e comportamentos de compras atuais dos consumidores. Uma transformação e tanto, mesmo para uma marca que nasceu de alquimias.

FÃS PARTICIPAM DE COCRIAÇÃO NA QUEM DISSE, BERENICE?

Divulgação

Com 170 lojas pelo Brasil, a estratégia de proximidade com o cliente da Quem Disse, Berenice? é outra. Tendo como identidade a comunicação jovem e casual, a marca aposta em criar uma comunidade de clientes. Com um canal no Telegram com mais de 890 membros, a ideia é fomentar a troca entre a marca e as Berês, apelido dado às consumidoras e fãs. A comunidade é aberta e gratuita. Além de descontos, fomenta a troca de experiência entre participantes e garante uma comunicação direta com a empresa, ajudando na formatação das estratégias e lançamentos.

Apoiada nessa relação direta, a Quem Disse, Berenice? lançou em julho dois novos produtos cocriados com especialistas em beleza e fãs. Parte da linha Skin.q, o creme Pele no Auge teve a participação do boniclub, clube de assinatura da comunidade de especialistas Bonita de Pele. Eles foram os primeiros a testar e avaliar os produtos, em um processo iniciado em 2021. Além disso, puderam visitar a fábrica e conhecer as etapas de formulação e produção. Já o hidratante Toda Regenerada teve a participação dos fãs Berês, que colaboraram com feedback sobre o produto. Os dois grupos, em conjunto com a marca, escolheram os nomes finais do lançamento e quais os benefícios que seriam priorizados na comunicação.

“Sempre fazemos um estudo de mercado, associado à análise do que já temos no nosso portfólio de produtos, para definir quais serão os próximos lançamentos”, disse o Diretor Executivo das Categorias Beauty do Grupo Boticário, Paulo Alexandre dos Santos Roseiro. “Entendemos que esses dois produtos trazem propostas muito desejadas por nosso consumidor e decidimos complementar os lançamentos agregando o olhar dos experts de beleza do boniclub e também das berês para entregar resultados ainda mais compatíveis às expectativas.”