A multidão de jovens buscando um espaço melhor. As filas formadas na madrugada anterior para a retirada de ingressos. Os desmaios, alguns fingidos e outros verdadeiros. Os tumultos, o corre-corre e o empurra-empurra. Relatos de histeria juvenil como esses, que normalmente costumam estar ligados à presença de pop stars da música e do cinema, multiplicaram-se na Bienal Internacional do Livro de São Paulo, realizada na segunda quinzena de agosto, contrariando a teoria de que os jovens de hoje não ligam para a literatura. Entre os principais alvos desse tratamento de estrela estavam as escritoras americanas Cassandra Clare e Kiera Cass, responsáveis pelas séries de sucesso Os instrumentos mortais e A seleção, respectivamente.

Ambas representam um fenômeno que está agitando os negócios da literatura no mundo. Trata-se de um novo filão de livros voltados aos chamados “jovens adultos”, entre 13 e 20 anos de idade, que explodiu nos últimos anos e se diferencia da tradicional literatura infanto-juvenil. Os melhores exemplos atuais desse nicho são as séries futuristas Jogos vorazes e Divergente, sobre jovens enfrentando governos autoritários, e A culpa é das estrelas, a melodramática história de uma menina que luta contra um câncer, ao mesmo tempo que inicia um namoro. Puxadas por esses fenômenos, as editoras brasileiras produziram, no ano passado, 20,3 milhões de exemplares de literatura infanto-juvenil.

Isso significa cinco milhões de exemplares a mais do que em 2012, uma expansão acima de 30%, na contramão do mercado, que sofreu uma queda de 3,6% na produção, segundo dados da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe). A indústria do livro movimentou R$ 5,4 bilhões, no País, no ano passado. Duas editoras, em especial, estão surfando nessa onda, as cariocas Intrínseca e Rocco. Esta última publica as sagas Jogos vorazes e Divergente, que já venderam 850 mil livros no Brasil e ainda têm grande potencial de expansão, devido ao lançamento de filmes baseados nelas. O sucesso é tanto que a editora criou um selo novo, a Rocco Jovens Leitores.

E agora está lançando uma nova categoria, a Fantástica Rocco, apenas para livros de fantasia. “Nós publicávamos até 60 novos livros infanto-juvenis por ano, e agora serão 180 novos títulos”, diz Paulo Rocco, o fundador da editora. Criada em 1975, a Rocco ficou conhecida por tornar Paulo Coelho um best-seller global e por trazer ao Brasil os americanos John Grisham e Michael Crichton. Mas o grande salto, seja no aumento de vendas, seja no foco da editora, aconteceu no fim da década de 1990, quando fechou contrato para publicar uma série sobre um bruxinho.

“O divisor de águas para a literatura jovem foram os livros do Harry Potter, da J.K. Rowling”, diz Rocco. “Eles acabaram com a suspeita de que o jovem não lia.” Essa saga de sete livros, lançados entre 1997 e 2007, garantiu a venda de sete milhões de livros. Se Harry Potter foi o precursor, pode-se dizer que a série que escancarou de vez o sucesso da nova literatura jovem e que causou a busca frenética das editoras por novos campeões de vendas estrondosos foi Crepúsculo, sobre uma menina que se apaixona por um vampiro. Escritos pela americana Stephene Meyer, os livros tiveram os seus direitos vendidos para a Intrínseca, fundada em 2004, apenas um ano antes do lançamento da série nos Estados Unidos.

“O que me chamou a atenção é que os jovens liam, e depois os adultos queriam conferir o motivo de tanto interesse por parte de seus filhos e acabavam virando leitores também”, afirma o fundador da Intrínseca, Jorge Oakim. De acordo com ele, foi essa confluência geracional que permitiu à obra dar um grande salto de público. Com isso, a editora negociou 5,5 milhões de exemplares da série. Surpreendentemente, Oakim não teve dificuldades em encontrar sucessores para Crespúsculo. Neste ano, a Intrínseca prevê um crescimento de 40% em relação a 2013. Entre os seus grandes sucessos para o público jovem estão os livros do autor de fantasias Rick Riordan, que já acumula quatro milhões em vendas, com três séries diferentes.

São também da editora os direitos dos livros do americano John Green, autor de A culpa é das estrelas, que acaba de passar pelo trampolim de uma bem-sucedida adaptação para o cinema e que está criando um novo nicho. Em suas obras, o foco está em histórias mais realistas, sobre dramas pessoais bastante distantes das fantasias futuristas e das tramas repletas de vampiros e bruxos. “A literatura jovem cresceu e vários públicos encontraram nela os seus temas preferidos”, diz Karine Pansa, presidente da Câmara Brasileira do Livro. “Ela atrai diversos tipos de leitores, inclusive os adultos.”