O Arquipélago de Galápagos tornou-se mundialmente conhecido como o lugar onde o naturalista britânico Charles Darwin fez parte das pesquisas que ajudaram a completar sua revolucionária teoria da Evolução das Espécies. Também se firmou como uma rota turística importante e que desperta a curiosidade de visitantes do mundo inteiro. Um deles é Swen Walter Lorenz, que nasceu na Alemanha e construiu uma longa carreira no mercado financeiro: comandou um fundo imobiliário em Macau (China), além de ter participado de operações para levantamento de fundos para empresas das áreas de mídia, TI e do mercado de luxo. Em 2005, Lorenz largou tudo para se tornar ambientalista em meio a uma viagem ao arquipélago. Desde 2011, ele é o CEO da Fundação Charles Darwin (CDF, da sigla em inglês). “O turismo é um motor para o desenvolvimento e a preservação dessas áreas”, afirma. “Desde que se oriente pela ótica da sustentabilidade e da preservação.” A seguir, os principais trechos da entrevista.

DINHEIRO – As Ilhas Galápagos tornaram-se mundialmente famosas, a partir de pesquisas feitas no local pelo cientista britânico Charles Darwin. O sr. acredita que é possível haver a exploração sustentável do arquipélago?
SWEN WALTER LORENZ –
De tempos em tempos surge na mídia um quadro um pouco equivocado do que acontece em Galápagos, e os problemas apontados são todos creditados à indústria do turismo. Mas, como já pontuou o naturalista britânico Sir David Attenborough, sem turismo, Galápagos já teria desaparecido. Os visitantes também geram uma receita importante para a sustentabilidade das ilhas.

DINHEIRO – Mas como mitigar os possíveis problemas advindos do turismo?
LORENZ –
Nós defendemos o conceito segundo o qual as pessoas devem visitar os locais, mas fazê-lo de forma responsável. O arquipélago conta com inúmeras regras de proteção que chegam, inclusive, a definir as rotas que podem ser acessadas pelos navios de cruzeiro. Ao escolher visitar o local, os turistas devem ter em mente essas regras e escolher agências de viagens comprometidas com a sustentabilidade. E, se assim o desejarem, se tornarem colaboradores de ONGs como a CDF.

DINHEIRO – O crescimento do turismo sustentável é uma forma de gerar tráfego para a ilha e recursos para a CDF?
LORENZ –
Como disse anteriormente, o turismo é a nossa principal fonte de recursos. Hoje, cerca de 70% de nossas receitas vêm de pessoas que já visitaram o local. A CDF é hoje a principal organização dedicada aos projetos científicos de proteção e preservação do arquipélago. Então, enquanto o turismo se orientar pela ótica da sustentabilidade e da preservação, será bem-vindo.

DINHEIRO – Qual a importância da parceria entre a CDF e a IWC Schaffhausen?
LORENZ –
A IWC (grife de relojoaria suíça, de luxo) colabora conosco desde 2009, bancando nossos projetos de pesquisa científica e de conservação. Atualmente, eles estão entre nossos cinco maiores doadores. Contudo, fazem mais que apenas doar recursos. A força da marca na mídia ajuda a difundir nossa causa e nosso trabalho em nível global. Isso é especialmente importante, pois jamais conseguiríamos essa abrangência por conta própria. Diria que se trata de um modelo de parceria a ser multiplicado.

DINHEIRO – O sr. trabalhou por um longo período no mercado financeiro. Como e por que decidiu migrar para o Terceiro Setor?
LORENZ –
Comecei a frequentar o local como turista, em 2006. Na época o arquipélago estava explodindo como rota turística, mas o setor não contava com uma regulamentação suficiente. Diante disso, entendi que o engajamento de alguém com habilidades de gestão e trânsito no setor financeiro poderia cumprir um papel de agente de mudança. Começamos auxiliando na estruturação da Escola de Gastronomia, na qual acabei investindo parte de minhas economias e que até hoje é reconhecida como uma das iniciativas mais exitosas nessa área, na América Latina.

DINHEIRO – Qual é a importância da Escola de Gastronomia para a economia do arquipélago?
LORENZ –
Ao longo dos últimos nove anos, formamos cerca de 200 chefs na Escola. Hoje, quem passa uma semana na ilha tem a oportunidade de apreciar algumas das delícias preparadas por nossos ex-alunos. Esse trabalho é simbólico do ponto de vista da economia, mas possui uma influência significativa na qualidade da experiência das pessoas que vêm à região.

DINHEIRO – O convite para atuar na CDF foi resultado desse trabalho?
LORENZ –
A partir do sucesso daquela iniciativa, acabei me tornando consultor em diversos projetos na ilha. Depois, fui convidado para integrar o conselho da CDF e recebi a proposta de atuar como executivo, que aceitei na condição de ficar apenas seis meses no cargo, e lá se vão quase três anos. Sinto-me um cara de sorte. Afinal, tenho um dos mais interessantes, intensos e expressivos empregos do planeta. Posso usar minhas qualificações do mercado financeiro a favor de uma proposta desafiante de tocar uma ONG em um dos lugares mais remotos do planeta.

DINHEIRO – Qual é a verba anual da CDF e qual seria o montante ideal?
LORENZ –
Nós gastamos cerca de US$ 3,5 milhões por ano. Mas, no mundo ideal, nosso orçamento anual deveria ser entre US$ 6 milhões e US$ 8 milhões. Trata-se do montante que tínhamos há dez anos. A gestão equivocada dos recursos e a crise econômica global, desencadeada em 2008, afetaram o balanço econômico da instituição. No entanto, estamos conseguindo virar essa situação. Nos últimos 12 meses recebemos doações expressivas, com destaque para uma delas, no valor de sete dígitos, a primeira do gênero na história da CDF. A verba foi repassada por um filantropo europeu. O que mostra que nossos esforços para arrecadação de fundos estão gerando resultados. Estou confiante de que voltaremos aos nossos melhores momentos em matéria de arrecadação.

DINHEIRO – Qual é a sua impressão sobre a forma como o Brasil lida com a sustentabilidade?
LORENZ –
A exemplo do que acontece com o Equador e com as Ilhas Galápagos, eu acredito que o Brasil não recebe o crédito devido, por parte da comunidade internacional, do que tem feito pela proteção da Floresta Amazônica. É muito fácil julgar quando se está na América do Norte ou na Europa, mas quem vive o dia a dia desse debate e conhece a situação de perto tem a dimensão do que tem sido alcançado, apesar das dificuldades. Eu saúdo o Brasil por seu trabalho de preservação ambiental.

DINHEIRO – Mas o governo brasileiro se recusou a assinar o capítulo contra o desmatamento do Acordo do Clima. Qual a sua avaliação sobre essa decisão?
LORENZ –
Prefiro não me manifestar sobre esse tema.

DINHEIRO – Quais são os principais desafios dos países pobres e em desenvolvimento na tarefa de proteger ecossistemas sensíveis ?
LORENZ –
As dificuldades começam na falta de recursos, pois muitos doadores e filantropos preferem investir seus recursos perto de casa, ou seja, em projetos nos Estados Unidos e na Europa. Outra questão sensível é a falta de mão de obra qualificada, o que amplia os custos dos projetos pela necessidade de expatriar técnicos de alto nível. Não podemos nos esquecer da falta de regulamentos e instrumentos legais destinados à preservação ambiental. Por fim há a necessidade desses países de explorar recursos naturais importantes para seu desenvolvimento, o que às vezes faz com que a preservação sucumba na lista de prioridades.

DINHEIRO – Quem é o típico visitante das ilhas Galápagos?
LORENZ –
Bem, o perfil dos turistas tem mudado consideravelmente nos últimos anos. No passado eram americanos e europeus na faixa etária entre 45 anos e 65 anos. Hoje, há uma diversidade maior e atraímos muitos visitantes da América Latina, dos países asiáticos e da Rússia. Muitos jovens vão para Galápagos atraídos pela possibilidade de praticar mergulho em locais magníficos. Diria que não existe mais um visitante típico.

DINHEIRO – Quantas espécies da região se encontram em risco de extinção nesse ecossistema?
LORENZ –
Vou lhe fornecer um exemplo melhor. Todas as espécies de pássaros que são endêmicos da ilha estão preservadas, ao contrário do que acontece no Havaí, onde a perda de biodiversidade dessas espécies foi de 75%. Contudo, hoje, aqui em Galápagos, devido à entrada de espécies invasoras, convivemos com riscos dessa natureza, em relação a uma dezena de espécies. As tartarugas gigantes estão indo bem, e olha que elas estavam na lista de espécies ameaçadas, na década de 1960. Graças ao nosso trabalho, conseguiram se recuperar. De uma forma ampla e geral, Galápagos ainda é um dos mais preservados ecossistemas do planeta. Contudo, temos uma série de problemas que precisam ser equacionados.

DINHEIRO – Em geral, as pessoas dizem que os banqueiros não têm alma. E o sr. acabou deixando o mundo das finanças para gerir uma ONG. O sr. concorda com essa frase?
LORENZ –
Bem, um de nossos principais patrocinadores é um banqueiro! Ele possui um sentimento forte a respeito da ilha e por isso apoia nosso trabalho. É bom destacar que um número expressivo de instituições financeiras em todos os países ajuda entidades filantrópicas. Dito isso, gostaria de destacar que não concordo com a afirmação inicial.