Amargando uma queda de mais de 7% até o fim de agosto, o Índice Bovespa vem refletindo o pessimismo dos investidores com a situação econômica brasileira e o mau humor do mercado internacional. As perdas têm sido sentidas com mais profundidade no setor de commodities. Empresas como a Vale viram a cotação de suas ações cair 21% nesse período. No entanto, alguns setores vêm seguindo na contramão das turbulências e mostram fôlego para novas altas. Entre eles estão os produtores de proteína animal – frangos incluídos – que, na opinião dos analistas, oferecem boas oportunidades para os investidores.

Aí incluem-se nomes como JBS, com alta de 38% no ano, Marfrig (7,2%) e Minerva (21,7%).Há dois motivos para essa alta. O primeiro é inerente ao setor. Enquanto os preços de commodities minerais, como o ferro, e industriais , como a celulose, flutuam ao sabor dos vagares da economia, a demanda por alimentos é muito mais constante e oscila bem menos que a de outros produtos. O segundo motivo é a apreciação do dólar em relação ao real. No início da tarde da quinta-feira 3, as cotações da moeda americana rondavam R$ 3,80, valor que remete aos últimos meses de 2002, quando o mercado ainda temia a posse do recém-eleito presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “Esse câmbio representa uma injeção direta de receita no faturamento das empresas”, diz o economista Aldo Moniz, analista da corretora UM Investimentos, do Rio de Janeiro.

O comportamento das ações é imprevisível por definição e a Bolsa é um investimento de risco. No entanto, é possível dizer com um razoável grau de certeza que as empresas de proteína merecem uma fatia da atenção do investidor. A alta das cotações vai além dos anabolizantes cambiais. “O setor se estruturou e se profissionalizou ao longos do últimos 20 anos”, diz o economista Luiz Carlos Mendonça de Barros, ex-presidente do BNDES, que acompanhou o surgimento de gigantes como a JBS. Segundo ele, há duas décadas, 93% da carne abatida no Brasil não tinha origem comprovada nem fiscalização sanitária. Atualmente, mais de 90% da carne é legalizada. “Nesse processo, o setor criou empresas gigantes, capazes de ser relevantes no mercado mundial” , afirma Mendonça de Barros.

Apetite pelos papéis das companhias brasileiras de proteína animal não falta. O executivo canadense Miloud Hassene, vice-presidente da Canadian Security Exchange, bolsa de valores do Canadá focada em empresas de menor capitalização e que atende investidores institucionais, passou alguns dias no Brasil procurando atrair companhias para seu pregão, localizado em Toronto. “Há cerca de 1.500 fundos de investimento no Canadá dispostos a comprar papéis de empresas brasileiras que se listem aqui”, diz ele. “As ações de empresas de proteína animal, além dos grãos e da celulose, estão no topo da lista dos investidores.”

A JBS é um bom exemplo. Segundo Moniz, da UM Investimentos, a alta do câmbio favorece a empresa. O analista afirma que, apesar de cerca de 45% das dívidas da empresa serem indexadas ao a dólar ou a outras moedas, apenas 16% das receitas são em reais. Os restantes 84% vêm de fora, e 70% do faturamento é auferido nos Estados Unidos. “Temos notado que a economia americana está se recuperando melhor do que as dos demais países desenvolvidos”, diz Moniz. “Isso favorece a JBS, que realizou aquisições interessantes e diversificou a linha de produtos.”

Os números da empresa presidida por Wesley Batista já vêm sendo engordados pela alta do câmbio. Em reais, o faturamento do segundo trimestre de 2015 aumentou 34,3%, de R$ 28,9 bilhões em 2014 para R$ 38,9 bilhões no ano passado, segundo estimativas do Banco Fator. O crescimento das vendas foi acompanhado por uma substancial melhoria das margens. A geração de caixa medida pelo Ebitda avançou 47% nesse período, subindo de R$ 2,43 bilhões em 2014 para R$ 3,57 bilhões em 2015. Não por acaso, as ações da JBS avançaram 38% no acumulado do ano. E há espaço para mais, segundo os 16 analistas que acompanham a companhia. Desses, 13 recomendam comprar a ação. O preço-alvo médio em 12 meses é de R$ 20,62, o que representa uma valorização potencial de 35% em relação ao fechamento da quarta-feira 2 (veja quadro).

As duas outras empresas mais diretamente ligadas ao setor de carne bovina cotadas em bolsa, os frigoríficos Marfrig e Minerva, têm uma situação financeira mais complicada do que o JBS, mas, mesmo assim, vêm atraindo o interesse dos investidores. Os papéis do Marfrig vêm apresentando fortes oscilações, mas ainda conseguem sustentar uma valorização de 7,2%, a partir do início do ano, e uma alta de 62% desde o fundo do poço, em maio. Segundo Moniz, o cenário para o Marfrig é mais desafiador. Isso ocorre devido à preponderância do mercado doméstico, que responde por 76% do faturamento, e do endividamento mais elevado, em sua maior parte denominado em moeda estrangeira. Mesmo assim, a companhia controlada pelo empresário Marcos Molina conseguiu elevar sua receita em 26,3% no segundo trimestre. Ela faturou R$ 6,42 bilhões, ante os R$ 5,12 bilhões do mesmo período de 2014. Dos 15 analistas que cobrem a empresa, dez recomendam a compra do papel. Na média, o preço-alvo para 12 meses é de R$ 7,59, uma alta potencial de 16% em relação aos R$ 6,54 do fechamento da quarta-feira 2.

Por sua vez, o Minerva, menos acompanhado pelos analistas do que a Marfrig, também brilhou na bolsa nos últimos seis meses, com uma valorização de 64%. Os analistas do Banco Fator recomendam a compra das ações da empresa, embora sem estabelecerem um preço-alvo para elas.

Se você se interessou, lembre-se dos riscos. O analista Flávio Conde, sócio da empresa de investimentos Whatscall, avalia que as estimativas para as ações foram calculadas com um dólar ao redor de R$ 3,20. “Por isso, a alta recente ainda não está expressa nas avaliações do mercado”, afirma Conde. Ou seja, considerando-se apenas o dólar, ainda há espaço para a alta. No entanto, o faturamento dessas empresas pode ser afetado pela criação inesperada de barreiras fitossanitárias dos países compradores, com impacto direto sobre as ações. Além disso, por ser flutuante, o câmbio pode ceder parte da valorização recente. “Se o dólar voltar para cerca de R$ 3,40, é provável que essas ações cedam parte do ganho das últimas semanas”, diz Conde.