13/01/2017 - 20:00
O nome é fictício. Não cometeria a indelicadeza de expor as finanças pessoais de um parente, a menos que me autorizasse. Mas a história é real e, provavelmente, semelhante à de alguém da sua família. O tio Neco é um cara legal. Gosta de churrasco e cerveja artesanal. Bate uma bola de vez em quando, apesar do ligeiro sobrepeso e dos cinquenta e poucos anos de idade. Veste roupas de marca e nunca deixa o cabelo despenteado. Está atento ao que os outros pensam sobre ele.
É bom no marketing pessoal. Não perde a chance de contar suas conquistas financeiras e suas aventuras profissionais – que terminam, 100% das vezes, em grandes lucros. Troca de carro todo semestre, sempre por um zero quilômetro, espaçoso e de alta cilindrada. Gosta de esquiar no gelo e visitar locais inusitados nas férias. Um bon vivant. Quem olha para o tio Neco, logo percebe que se trata de um homem bem-sucedido na carreira. O problema é que, desde que me conheço por gente, o tio Neco gasta muito mais do que ganha, na interminável tarefa de manter o status social.
No final do mês, quem sofre é a diarista, o jardineiro e a secretária, que têm seus salários atrasados ou até acabam demitidos sob o argumento de fraco desempenho profissional ou a crônica crise na economia. A indisciplina do tio Neco exemplifica, em menores proporções, o comportamento da maioria dos governos estaduais. Faltaria espaço para falar de cada um, mas podemos citar os três piores, que decretaram calamidade nas contas públicas: Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul.
A exuberância financeira anunciada em microfones de inauguração de viaduto e ampliação de avenidas, nos últimos anos, não condizia com a realidade. Talvez o melhor exemplo seja o do governo fluminense, que distribuiu isenções tributárias a dezenas de empresas, sem fazer contas, projetou seu orçamento apostando no crescimento dos royalties do petróleo, uma commodity mais instável que o time do Vasco, e inflou a folha de pagamento com a distribuição de cargos comissionados. Sem falar nos desvios de recursos públicos, na corrupção endêmica e na farra do ex-governador Sergio Cabral com o dinheiro do contribuinte.
Com um déficit estimado em R$ 17,5 bilhões, sendo R$ 12 bilhões apenas do sistema previdenciário do funcionalismo, o governo está falido. Não haverá saída sem o socorro federal. O mesmo acontece, por razões parecidas, com os governos gaúcho e mineiro. É inegável que a maior crise econômica da história atingiu em cheio os cofres públicos, mas culpar apenas a recessão pelo fracasso dos Estados e dos municípios na administração dos recursos é subestimar a inteligência da nação. Nos últimos anos, inspirados por uma propaganda federal que vendia ao mundo a imagem de um “Brasil potência”, uma espécie de euforia keynesiana se propagou pelas administrações estaduais.
Gastar muito era sinal de saúde financeira. A conta chegou. E saiu caro. O maior abismo fiscal de que se tem notícia no Brasil expõe de maneira crua diversas mazelas nacionais e prenuncia dias difíceis, especialmente para o servidor público. A irresponsabilidade de governantes e a incapacidade de buscar o equilíbrio das contas fiscais geraram um colapso sem precedentes. Funcionários serão demitidos, salários serão reduzidos e benefícios serão extintos. Assim como acontece com o tio Neco, quem vai pagar a conta é a diarista, o jardineiro e a secretária.