08/06/2011 - 21:00
Um inesperado anúncio chegou aos funcionários da Infraero na terça-feira 31, dia em que a estatal celebrava seu 38º aniversário. Em mensagem aos colaboradores, o presidente da empresa, Gustavo Vale, revelou a decisão do governo de privatizar três dos principais aeroportos administrados pela empresa: o de Cumbica, em Guarulhos, e o de Viracopos, em Campinas, ambos em São Paulo; e o Juscelino Kubitschek, em Brasília. Foi uma surpresa para o pessoal da estatal.
A sinalização, até então, era de que o novo modelo seria adotado para os novos terminais, com a concessão apenas das áreas comerciais. Mas a presidente Dilma Rousseff foi convencida pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) de que era melhor entregar à iniciativa privada toda a administração e exploração dos terminais. Agora, a Infraero será parceira obrigatória nas sociedades de propósito específico (SPEs), que serão criadas para administrar cada um dos três aeroportos.
O caos e o ideal: o Aeroporto de Cumbica (à esq.), em Guarulhos (SP), superlotado, contrasta com a tranquilidade
e organização de terminais como o de Hong Kong, na China, modelo bem-sucedido de administração de capital misto
Os detalhes ainda serão definidos nas regras do edital, que deve ser lançado em dezembro, mas já está decidido que o setor privado terá um mínimo de 51% do capital. A ideia é caracterizar a nova empresa como de capital misto e livrá-la das amarras da Lei de Licitações – na avaliação do governo, uma das principais razões da morosidade e ineficiência da Infraero. O ministro Wagner Bittencourt, da Secretaria de Aviação Civil, órgão criado para coordenar as obras do setor aéreo, acrescenta que o modelo “shopping center”, que se limita à concessão de espaços para a exploração comercial nos terminais, não garantiria o retorno financeiro para possíveis investidores.
“É preciso aproveitar a disposição de investidores, nacionais e estrangeiros, de fazer esse aporte no Brasil”, disse em audiência na Câmara dos Deputados, na quarta-feira 1º. Para o governo, manter a Infraero na administração dos aeroportos tornará a empresa mais atraente na hora de abrir seu capital, o que deve ocorrer até o fim desse governo. “É mais fácil abrir o capital da Infraero depois de se aplicar nela um choque de competitividade”, disse Dilma na reunião com governadores e prefeitos das 12 cidades-sede da Copa do Mundo de 2014, na terça-feira 31.
A participação da Infraero em cada empresa vai depender dos investimentos feitos pela estatal nesses aeroportos. Para a Copa do Mundo de 2014, Guarulhos deve receber R$ 1,2 bilhão; Brasília receberá R$ 748,4 milhões; e Viracopos, R$ 742 milhões. Parte dos recursos já foram gastos, mas a estatal ainda não tem os dados definidos. “A Infraero precisa recuperar seu investimento”, diz Vale, da Infraero. “Quanto maior for, maior será a participação da empresa no capital.”
As indefinições sobre o modelo a ser adotado têm deixado cautelosos possíveis investidores, entre empreiteiras e companhias aéreas. Empresas como Gol e Azul afirmam que estão acompanhando o assunto, enquanto a TAM não se manifesta. “A entrada da iniciativa privada é o ponto mais crucial”, disse à DINHEIRO Juan Quirós, presidente do Grupo Advento, especializado em grandes construções e interessado em Viracopos.“O investidor quer controle da gestão, e isso ainda não se sabe como será.”
Para o professor de transporte aéreo da Escola Politécnica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Respício do Espírito Santo, o grau de interesse das empresas nas concessões estará diretamente atrelado a sua autonomia nas decisões e em relação à Infraero. “É preciso saber até onde irá o poder do governo nessa SPE”, afirma.
O governo, no entanto, sabe que tem nas mãos um ativo atraente. Os aeroportos de Guarulhos, Brasília e Campinas estão entre os cinco mais lucrativos da Infraero. Juntos, lucraram R$ 456,6 milhões em 2010. Mas, como apenas 21 dos 67 aeroportos da Infraero estão no azul, mantê-los sob gestão estatal significa recursos para sustentar seus terminais deficitários. Se está claro como o governo ganha nessa equação, para o setor privado, ainda sobram dúvidas.