30/08/2013 - 21:00
Nas sedes regionais do Serviço Social da Indústria (Sesi) e do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) do Amapá vive-se um paradoxo. Enquanto faltam materiais de escritório, papel nas impressoras e até artigos de limpeza, sobram funcionários. Com um orçamento de R$ 30 milhões neste ano, os dois órgãos mantêm 491 empregados na folha de pagamento, cujo custo mensal supera os recursos disponíveis em caixa. O Sesi e o Senai são dois dos 11 órgãos que compõem o chamado Sistema S, que oferece formação profissional e serviços para vários setores da economia.
O lado bom: cursos do Senai (na foto, em SP) são muito cobiçados em várias cidades
Sustentadas pela arrecadação de 3,1% sobre a folha de pagamento bruta de empresas, essas siglas, que são administradas pelas federações patronais, no nível regional, e pelas confederações, no nacional, terão, juntas, um orçamento de R$ 27,1 bilhões neste ano, a maior parte investida em educação e qualificação profissional. Em muitas cidades, essas entidades fornecem os diplomas mais cobiçados do mercado. Em outras, dão suporte financeiro a importantes espaços culturais. Não era o caso do Amapá. Informações preliminares da auditoria apontam resultados abaixo do padrão de qualidade das unidades de outros Estados e indícios de mau uso do dinheiro.
Sob suspeita: Joziane, da Fieap, tem a sua eleição contestada
O quadro levou os conselhos nacionais das entidades a intervir, afastando a presidente da Federação das Indústrias do Estado do Amapá (Fieap), Joziane Rocha, do cargo de presidente do conselho do Senai-AP e da diretoria do Sesi-AP. Desde o início de agosto, um grupo enviado de Brasília pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), que preside os conselhos nacionais do Sesi e do Senai, interveio e assumiu a gestão regional das duas entidades. Os executivos indicados pela CNI já começaram a enxugar a folha de pagamento e a pagar indenizações passadas e contrataram a consultoria PricewaterhouseCoopers para promover um pente-fino nas contas. “Os relatórios de auditorias, abrangendo os últimos dez meses, identificaram disfunções nas gestões administrativas, financeiras e operacionais do Sesi e do Senai no Amapá”, informou a CNI.
Casada com o ex-prefeito de Santana (AP), Rosemiro Rocha – atualmente com os direitos políticos cassados por improbidade administrativa –, Joziane continua à frente da presidência da Federação das Indústrias, cargo que assumiu em fevereiro, depois de uma disputa judicial acerca da legitimidade dos sindicatos que a elegeram. O Sindicato das Indústrias de Joalheria e Ourivesaria do Amapá, pelo qual Joziane se candidatou à Fieap, teve sua origem contestada por representar uma atividade incipiente no Estado. A entidade teve seu registro concedido por influência do deputado Sebastião Bala Rocha (PDT-AP), primo do marido de Joziane, à época da passagem de Carlos Lupi (PDT) pelo Ministério do Trabalho. Segundo a CNI, o processo sucessório na Fieap foi cercado de profundos desentendimentos.
No período de julho de 2012 a fevereiro de 2013, quatro gestões distintas se sucederam no comando da Federação, sendo uma delas sob a forma de junta governativa. “Esses fatos tiveram impacto sobre a gestão dos Departamentos Regionais do Sesi e do Senai, pois o seu principal dirigente é o presidente da Federação”, informa a CNI. Nos últimos cinco anos, o Tribunal de Contas da União (TCU) aplicou cinco multas às entidades no Estado, por descumprimento do regulamento interno de compras e contratações de funcionários. O assunto já está sob investigação no Ministério Público do Trabalho. Procurada pela DINHEIRO, Joziane não quis se pronunciar. Por lidar com recursos públicos, o Sistema S é fiscalizado pela Controladoria Geral da União (CGU) e pelo Tribunal de Contas da União (TCU), os mesmos órgãos que fiscalizam os gastos do Executivo.
“Uma vez que recebem recursos públicos, os órgãos do Sistema S têm de seguir princípios semelhantes aos da administração pública, tanto na hora de contratar pessoas quanto na hora de fazer compras”, afirma o ministro-substituto do TCU, Marcos Bemquerer Costa. Para o senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO), esses controles são insuficientes. O senador acusa o Sistema S, como um todo, de falta de transparência no gasto desse dinheiro e de cobrar muito caro pelos cursos que oferece. Em abril, ele tentou criar uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar o assunto, mas até agora não conseguiu as 27 assinaturas necessárias. “O Sistema S é uma verdadeira caixa preta e ainda é pouco fiscalizado”, afirma o senador. No caso do Amapá, a CNI mandou abrir a caixa preta.