17/03/2023 - 5:10
Na foto ao lado, todos aplaudem. Fora da foto, principalmente fora da China, nem todos comemoram. A reeleição para o terceiro mandato do presidente chinês Xi Jinping, na sexta-feira (10), em uma eleição a portas fechadas e só ele como candidato cumpriu um rito protocolar de renovação de mandato. Os quase 3 mil membros do Parlamento, o Congresso Nacional do Povo (NPC), votaram de forma unânime para que o chefe de 69 anos continue no comando. Assim, Xi se consolidou como o mais poderoso líder nacional desde Mao Tsé-Tung (1893-1976), que governou com unhas, dentes e pólvora durante 27 anos o país mais populoso do mundo. E, claro, Mao capitaneou a revolução comunista que resultou na formação da República Popular da China.
Mundo afora, a reeleição de Xi Jinping não recebeu o mesmo entusiasmo. Não porque ele tenha causado problemas nos últimos dez anos em que governou o país, mas pelas preocupações que surgem em relação aos seus próximos cinco anos. O líder chinês tem adotado um discurso mais provocativo, confrontador e menos diplomático com o Ocidente, especialmente no que diz respeito ao fim da autonomia da ilha da Taiwan e à influência americana no Mar do Sul. Em seu primeiro discurso, na segunda-feira (13), o presidente garantiu que vai fortalecer a segurança do país e transformar as Forças Armadas em uma “muralha de aço” para proteger efetivamente a soberania nacional. “A segurança é a base do desenvolvimento e a estabilidade é o pré-requisito para a prosperidade.” Seus dois discursos de posse anteriores destacaram o crescimento econômico, a geração de riqueza e a modernização da indústria chinesa. Eis o porquê da fonte de preocupação
Além das entrelinhas do campo retórico, o terceiro mandato de Xi é recheado de desafios reais. Internamente, ele terá de reaquecer a atividade econômica e o consumo em meio a ondas sucessivas de infecções pela Covid-19. Hoje o país enfrenta a sétima onda da pandemia, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS).
Com uma população de 1,4 bilhão de pessoas (sete vezes a do Brasil), qualquer novo surto causa superlotação de hospitais, de crematórios e de cemitérios. Diante desse cenário, em 2022 a economia chinesa cresceu 3%, o pior resultado em 50 anos. A meta do governo era crescer 5,5%. Não deu.
No mundo, a guerra do russo Vladimir Putin na Ucrânia deixou a China – histórico aliado de Moscou – em situação diplomática delicada. Hoje, os Estados Unidos são o principal parceiro comercial dos chineses, e tem cobrado posturas mais claras do governo chinês. Equilibrar esses pratos será o maior desafio externo de Xi, segundo Evandro Carvalho, coordenador do núcleo de estudos Brasil-China da FGV.
“A economia chinesa está lutando para se recuperar de três anos de duras restrições de Covid zero, a confiança dos investidores está diminuindo e uma crise demográfica se aproxima quando o país registrou seu primeiro declínio populacional em seis décadas.” E mais: para ele, a China também enfrenta uma série de eventos diplomáticos contrários de Washington e outras capitais ocidentais, já que as relações se corroeram nos últimos anos em decorrência do histórico desastroso de direitos humanos de Pequim, do reforço militar na tentativa de reincorporar a ilha de Taiwan, do tratamento da Covid e da crescente parceria com a Rússia.
E O BRASIL? Entre medos e aplausos, a reeleição de Xi Jinping pode até ser positiva para os negócios com o Brasil. O líder chinês foi um dos primeiros a parabenizar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pela vitória sobre Jair Bolsonaro. “Atribuo grande importância ao desenvolvimento das relações China-Brasil”, disse Xi, em comunicado oficial. Durante a gestão de Bolsonaro as relações comerciais até estremeceram, mas nunca deixaram de existir.“Estou disposto a trabalhar com o presidente eleito Lula, de uma perspectiva estratégica e de longo prazo, para planejar e promover conjuntamente a um novo patamar a parceria estratégica abrangente entre a China e o Brasil, em benefício dos dois países e seus povos.”
Mais do que um natural gesto diplomático, a troca de governo no Brasil soou como música aos ouvidos de Xi. Nos últimos quatros anos, o hoje autoexilado ex-presidente Bolsonaro levantou suspeitas sobre uma suposta ação premeditada da China na proliferação da pandemia, fez criticas ao modelo comunista de governo e até curtiu comentários jocosos e mal-educados de seu ministro Abraham Weintraub, da Educação, sobre a pronúncia de chineses que vivem no Brasil. Chamou de “Cebolinha” pela troca do “R” pelo “L”.
Com Xi Jinping no comando da China pelos próximos cincos anos, todos saberão que forma os chineses se farão entender na diplomacia mundial. Ao que tudo indica, ao som de “R” ou de “L”, eles estarão cada vez mais prontos para a guerra.