23/05/2014 - 20:00
Os estragos econômicos provocados pelas grandes manifestações de junho do ano passado ainda estão frescos na memória dos empresários. Com inúmeras ruas interditadas e uma população assustada, compromissos e investimentos acabaram sendo adiados, vendas foram perdidas e a produção encolheu. O PIB cresceu apenas 2,3%, bem abaixo dos 4% a 5% ao ano com que sonhava o governo Dilma. Ressabiado, o setor produtivo temia que aquelas cenas se repetissem às vésperas da Copa do Mundo. Em recente reunião do Conselho Superior Estratégico da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), aproximadamente 40 integrantes passaram grande parte do tempo debatendo o assunto.
Dias depois, uma onda de protestos e greves em diversas cidades acenderia o sinal amarelo das autoridades e das empresas. Se isso persistir diante dos holofotes que a Copa proporciona, quem vai perder esse jogo, mais uma vez, é a economia. Na terça-feira 20, os paulistanos reviveram um cenário desolador. Enquanto professores da rede municipal de ensino interditavam a avenida Paulista, uma das principais vias da maior cidade da América Latina, centenas de motoristas e cobradores de ônibus realizavam uma greve surpresa que deixou milhões de pessoas sem transporte público e levou o caos ao Metrô e às linhas da CPTM.
Num efeito cascata de difícil mensuração, negócios deixaram de ser fechados e as empresas tiveram de liberar funcionários mais cedo. “É complicado que isso ocorra num ano em que o varejo não está com esse fôlego todo”, afirma Fábio Bentes, economista da Confederação Nacional do Comércio (CNC). “Causa preocupação.” Para ele, o fraco desempenho do setor no primeiro trimestre – as vendas cresceram apenas 4,5%, metade do ritmo médio de expansão registrado entre 2007 e 2012 –, aliado às manifestações, compromete o faturamento neste ano. De norte a sul do País, pipocam protestos contra a realização da Copa do Mundo e movimentos grevistas.
Na semana passada, o périplo da taça da Fifa foi alvo de manifestações em Belém e Teresina. Em Recife, a paralisação de policiais militares gerou saques a lojas e forçou o adiamento de uma partida do Campeonato Brasileiro. Em outros nove Estados e no Distrito Federal, a Polícia Civil contrariou decisão do Supremo Tribunal Federal e cruzou os braços para reivindicar reajuste salarial. Grupos de agricultores, em Recife e Porto Alegre, e pais e mães de Santo, em Salvador, engrossaram a lista dos descontentes, além dos funcionários do Metrô de São Paulo, que entraram em estado de greve na quinta-feira 22.
Outros movimentos estão programados, como a paralisação de professores das universidades paulistas Unicamp e USP. Se realizadas durante a Copa do Mundo, as paralisações vão atrapalhar ainda mais a economia, num período recheado de feriados. Isso contribuirá, segundo a Fecomercio-SP, para uma queda nas vendas de, no mínimo, 5% em dias de jogos do Brasil. O impacto sobre o faturamento causado pelo fluxo menor de pessoas nos locais de compra pode ser irrecuperável. A compra por impulso, por exemplo, deixa de ocorrer.
Além disso, a loja pode não conseguir abrir as portas, por causa da ausência do funcionário que não conseguiu chegar ao seu destino. Outra questão que se coloca é a do abastecimento de mercadorias por problemas logísticos causados por greves e protestos. Segundo o economista da Fecomercio-SP Altamiro Carvalho, ainda não há sinais de que isso esteja ocorrendo. “Mas não é de se descartar a possibilidade”, diz. Para a Fiesp, as autoridades não podem perder o controle da situação. “Tudo tem de ser tratado com certa ordem, senão a vida do cidadão se torna impossível”, afirma Paulo Francini, diretor do departamento da Fiesp.
A preocupação é ainda maior diante de uma retração de 2,9% na produção industrial de São Paulo no primeiro trimestre, segundo dados do IBGE. No Brasil, neste mesmo período, houve ligeira alta de 0,4%. Ciente do cenário desafiador para o setor produtivo, a presidenta Dilma Rousseff recebeu, em Brasília, empresários do Fórum Nacional da Indústria, que levaram ao governo inúmeras demandas. “Houve uma aceitação muito boa nas questões de políticas que podem ser implementadas sem que haja redução da carga tributária”, afirmou ao fim da reunião, na noite da quinta-feira 22, o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson de Andrade.
Após o encontro, o presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Luiz Moan, disse que ainda não dá para dimensionar o impacto dos protestos no setor. “A maior preocupação, por enquanto, é com os dias de feriado, durante a Copa do Mundo”, afirmou. Embora não tenha sido tema das conversas com a presidenta, o receio de que protestos e greves se intensifiquem, principalmente durante a Copa, já chegou ao Palácio do Planalto. Em recente entrevista, o ministro-chefe da Secretaria Geral, Gilberto Carvalho, classificou como irresponsabilidade a paralisação dos motoristas e cobradores de ônibus em São Paulo.
“As pessoas sabem que, se fizerem isso durante a Copa, elas vão ter uma grande reprovação popular”, disse. De fato, pesquisa do Datafolha publicada na quinta-feira 22 mostra que o apoio dos paulistanos a esses movimentos caiu de 89%, em junho do ano passado, para 52% (ainda um índice alto). A população pode não aguentar manifestações oportunistas. O PIB, certamente não as suportará. O sonho de “Pibão” de 4% a 5% ao ano, a partir de 2015, está ameaçado.
Colaborou: Carolina OMS