12/09/2014 - 20:00
A quarta-feira 10 começou agitada na pirâmide que abriga a sede da Fiesp, na avenida Paulista. Cerca de 30 integrantes do Conselho Superior Estratégico da entidade, liderada pelo empresário Benjamin Steinbruch, se reuniram para debater o atual momento econômico e político do País. O noticiário daquela manhã era desfavorável ao setor produtivo. Segundo o IBGE, o emprego na indústria nacional encolhera 3,6% em julho, na comparação com o mesmo período de 2013, a 34ª queda mensal consecutiva. Em São Paulo, o resultado foi ainda pior: redução de 5,1%, a maior de toda a série histórica iniciada em 2001.
Insatisfeitos com a situação do setor, os empresários paulistas tinham mais um motivo para irritação. Três dias antes, o presidente da Vale, Murilo Ferreira, afirmara, em entrevista à Folha de S. Paulo, que a indústria paulista “está pagando uma conta mais alta do que outros lugares do Brasil”, por falta de “tecnologia e inovação” em alguns setores. “Será que o empresariado de São Paulo tem o mesmo entusiasmo do pessoal do Cerrado?”, indagou Ferreira. O presidente da Vale diz ficar preocupado quando vai ao Japão ou à Coreia, por conta do gap tecnológico que separa o Brasil desses dois países.
“Não sei se os empresários não se atualizaram ou não estão motivados, mas essa é a realidade”, afirmou Ferreira, que criticou o Fla-Flu político, que teria São Paulo como palco, protagonizado por PT e PSDB. “A política em São Paulo é muito rancorosa”, disse. Embora a Fiesp não tenha sido citada, seus dirigentes ficaram revoltados e acusaram o golpe. “Não vamos ficar respondendo a um pau-mandado que não entende nada da indústria de transformação nem da indústria de São Paulo”, diz Paulo Francini, diretor da Fiesp. Questionado sobre quem teria mandado Ferreira dar aquelas declarações, Francini respondeu: “Sei lá. Alguém pediu e ele deu”.
Procurada, a assessoria de imprensa da Vale informou que o presidente estava em viagem ao exterior na semana passada e ressaltou que suas afirmações “não têm o objetivo de polemizar nem tirar o mérito dos pleitos da indústria junto ao governo”. Ferreira está no comando da Vale desde 2011, após a demissão de Roger Agnelli, que desagradou ao governo federal por demitir funcionários em meio à crise internacional, no final da década passada. A preocupação dos industriais paulistas não é recente e, sempre que externada, gera mal-estar no governo federal. Há um mês, durante um evento em São Paulo, Steinbruch criticou a política econômica e afirmou que “só louco investe no Brasil”.
O empresário, controlador da CSN, verbalizou o que muitos líderes do setor produtivo pensam, mas evitam dizer em público. “Nunca vi, em ano de eleição, perspectiva de recessão tão forte como temos agora”, afirmou. Na terça-feira 9, o presidente da Fiesp voltou à carga ao escrever um artigo no qual critica o elevado custo do crédito e afirma que “é uma balela a história de que o estímulo ao consumo se esgotou como fórmula de ativar a economia”. Por trás das fortes declarações dos presidentes da Vale e da CSN está um debate sobre a responsabilidade do governo Dilma em relação ao atual quadro de desalento econômico.
Para Steinbruch, a solução é interna e pressupõe “tomar medidas imediatas e corajosas para baixar os juros, desvalorizar o real e injetar competitividade na economia”. Já Ferreira destaca a crise mundial e salienta que “no Brasil não prestamos atenção ao mercado internacional”. Para o presidente da Associação da Indústria Ferroviária (Abifer), Vicente Abate, os problemas internos pesam mais do que os externos. “A política anticíclica foi correta durante a crise, mas é preciso mudar a carga tributária, o câmbio, a burocracia e a infraestrutura.”
Nas últimas três décadas, a participação da indústria de transformação na economia brasileira encolheu de 24,8%, em média, entre 1973 e 1992, para 12,6%, atualmente. Essa perda de espaço, segundo os especialistas, não pode ser explicada apenas por questões conjunturais. “Nos países desenvolvidos, o setor de serviços foi ganhando mercado ao longo dos anos”, diz Milton Luiz de Melo Santos, presidente da agência de fomento Desenvolve SP. “Como São Paulo tem o maior polo industrial, a perda aqui é maior.” Para a Fiesp, no entanto, é um sinal de que o setor produtivo não vem recebendo atenção do governo. “A indústria paulista encerrará o ano com 100 mil trabalhadores a menos”, diz Francini.