Quais são os frutos que o Brasil pode colher com a nova política externa?
No longo prazo, o fruto é o aumento da respeitabilidade do País, da seriedade, da convicção a respeito da força da democracia e da disposição dos brasileiros de pôr o País no rumo do desenvolvimento. Do ponto de vista concreto e econômico, estamos procurando ampliar as possibilidades de lastros comerciais como fizemos agora na Índia. Tivemos uma rodada de liberalização de tarifas de cerca de 500 produtos com a Índia e o dobro disso com a África do Sul. Estamos abrindo, por todo lado, mais janelas para a gente poder vender mais e comprar mais. Por que queremos vender mais? Para ter emprego, que é o grande desafio do Brasil hoje. Temos uma democracia consolidada, temos medidas sérias para enfrentar a questão do desequilíbrio das contas públicas a médio e longo prazo, mas precisamos criar emprego. Isso tem que ser a curto prazo. Tem de começar já.

O caminho natural é o Brasil fazer acordos bilaterais ou através do Mercosul?
Onde puder, nós levamos o Mercosul junto. Não há problema nenhum nem os parceiros do Mercosul ficarão incomodados com isso. Trata-se de tomar a iniciativa. No passado, o Mercosul foi usado como pretexto para a inércia, para não fazer esses acordos. O ideal é o Brasil ir fazendo e levando os parceiros juntos. Dá perfeitamente para compor.

É possível avançar nas negociações para um acordo de livre comércio entre Mercosul e União Europeia?
É possível avançar, mas não é fácil porque a União Europeia tem um altíssimo nível de protecionismo agrícola. Às vezes, esse protecionismo não se traduz em tarifas, mas se traduz em restrições sanitárias, fitossanitárias, questões técnicas. Essa é, aliás, a forma mais comum de barreira no comércio internacional. O Brasil tem poucas delas comparativamente com outros países. Nós temos tarifas mais altas, mas temos menos proteção quantitativa, física, do que outros países. Se você for colocar tudo na balança, resulta que o Brasil não é, na média, um país excessivamente protecionista, não. Agora temos que ir à batalha. Dificuldades não são impossibilidades. Nós temos de contornar essas dificuldades e avançar. Nós, chanceleres do Mercosul, fizemos um apelo à União Europeia para que toquem a negociação adiante. Temos do nosso lado a Espanha, a Itália e Portugal. Eu tenho certeza de que vamos conseguir avançar.

O Brexit atrapalhou ou ajudou?
Eu acho que não ajudou, não, porque de alguma maneira estimula os movimentos nacionalistas na Europa continental. E esses movimentos estão mais ligados a práticas protecionistas.

Faz diferença para a política externa e comercial do Brasil se Hillary Clinton ou Donald Trump vai vencer as eleições nos Estados Unidos?
Faz bastante diferença, sim. Os dois candidatos têm se apresentado como defensores do mercado interno americano, de políticas industriais e tudo mais. Mas, como dizia Didi, o grande meia da nossa seleção antiga, treino é treino, jogo é jogo. Eu acho que, no poder, eles não vão ser tão protecionistas assim. Mas eu prefiro, sem dúvida nenhuma, e teria mais confiança na Hillary.

Com Mauricio Macri na Argentina, as relações com o Brasil melhoraram. No entanto, ainda há barreiras para os calçados brasileiros. É algo pontual ou há um retrocesso nesse relacionamento?
Não, não é um problema de retrocesso. Tem havido problemas nos automóveis, problemas nos têxteis e nos calçados porque a Argentina atravessa uma conjuntura econômica muito desfavorável e realmente a gente precisa entender a situação. Procurar resolver os problemas, mas sem exacerbar os ânimos. E também ver que reclamações eles têm com o Brasil e procurar atender, tendo uma atitude recíproca nessa matéria. Agora, não devemos abandonar a batalha pela liberdade de comércio dentro do Mercosul.

O sr. mencionou anteriormente que o Brasil não tem uma economia fechada. Não mesmo?
Ela não é tão fechada como se costuma pregar. Muita gente, para calcular grau de fechamento, pega as tarifas, que são os impostos de importação que são, na média, mais altos do que a média do resto do mundo. Mas se você pegar outras barreiras não tarifárias, como controles sanitários, fitossanitários, impostos que são cobrados sobre quantidades etc., você vai ver que o Brasil não é uma economia especialmente protecionista. E muitas que parecem ser de livre comércio são altamente protecionistas.

O sr. poderia citar um exemplo?
A Noruega subsidia 80% de sua agricultura, ou seja, de cada cem produzidos, 80 recebem a mais do governo. Isso não aparece em nenhuma medida de proteção comercial, mas é uma grande proteção. E tem exemplos assim por toda a parte, começando por Estados Unidos, Canadá, Europa, Sudeste Asiático e por aí vai. E a minha tese é de que nós devemos, sim, fazer concessões de abertura, mas sempre que haja concessões recíprocas. Concessão, sim, mas com reciprocidade e não a troco de banana.

Está confirmada a elevação da alíquota do Reintegra das exportações para 2% em 2017 e 3% em 2018?
Está. A Camex aprovou.

Os empresários estão preocupados com a recente valorização do câmbio. Qual é a sua avaliação?
O câmbio valorizado, sem dúvida, tira competitividade das exportações, principalmente quando valoriza de maneira sustentada, não diria de curto prazo. Por outro lado, aumenta a competitividade das importações vis-à-vis a produção interna. Mas eu creio que o governo ficará atento a isso e o que nós temos de ficar de olho é na perspectiva de médio e longo prazo. A médio e longo prazo seria indesejável uma valorização, sem dúvida nenhuma. Nós temos um sistema cambial flutuante e flutuações existem, mas é preciso ficar de olho nos determinantes mais importantes a médio e longo prazo.

O fato de o Banco Central ter reduzido os juros em 0,25 ponto percentual é uma boa notícia para o câmbio?
Sem dúvida, é uma boa notícia.

O que significa, na prática, o fato de a Apex estar sob o seu comando?
A Apex não está comigo. Ela está ligada ao Ministério das Relações Exteriores. Ela é autônoma e tem lá um embaixador que está presidindo, o Roberto Jaguaribe, que é muito bom. O que nós queremos é aumentar a integração entre a Apex e o Itamaraty, porque o Itamaraty tem embaixadas por todo o mundo, tem negociadores comerciais, e o melhor é juntar com a Apex, ter uma integração mais íntima. Com isso você economiza recursos e aumenta a eficiência.