Durante as duas últimas décadas, a coreana Kia atravessou algumas fases, no mínimo, intrigantes. Primeiro, a empresa ficou conhecida por ser a marca do furgão Besta, que era usado para transporte coletivo. Depois, passou a explorar o nascente mercado de utilitários esportivos e, recentemente, começou a disputar o segmento de luxo. Mas, diferentemente de marcas que desembarcaram no País na mesma época, nunca conseguiu alcançar números condizentes com o tamanho das vendas no mercado brasileiro. 

 

53.jpg

“A abertura de novas revendas e a renovação do portfólio devem manter nosso crescimento”

Luiz Gandini, presidente da Kia Motors do Brasil

 

A francesa Renault, por exemplo, chegou por aqui em 1992, mesmo ano da Kia, e vendeu 64,4 mil carros só no primeiro semestre de 2010. Já a Kia, pretende fechar este ano com um faturamento de R$ 3,6 bilhões e vendas de 57,6 mil unidades – salto de 136% em relação às 24,1 mil unidades comercializadas em 2009. 

 

Para ganhar status de protagonista, entretanto, a empresa tem uma carta na manga nunca usada por uma importadora de automóveis. O paulista José Luiz Gandini, 53 anos, dono da Kia Motors do Brasil, convenceu a matriz a produzir carros com motor flex para serem trazidos ao Brasil. 

 

Afinal, esse tipo de propulsor é o preferido dos brasileiros e hoje responde por 86,43% das vendas de veículos de passeio e comerciais leves no País. Em setembro, a principal estrela da marca no Salão do Automóvel de São Paulo será a versão do Kia Soul capaz de rodar com álcool ou gasolina. “Em até três anos, todos os nossos carros serão vendidos na versão flex”, disse Gandini à DINHEIRO. 

 

54.jpg

Kia Soul: o primeiro carro da Kia Motors com motor bicombustível será lançado em setembro

 

“Trata-se de uma alternativa interessante para quem ainda não dispõe de fábrica no Brasil”, opina Fernando Trujillo, analista da consultoria CSW Worldwide. Segundo ele, o grande mérito de Gandini foi conseguir antecipar os nichos que se mostrariam os preferidos dos consumidores. 

 

Ávidos por novidades, os brasileiros da classe média também usaram o aumento de renda e as facilidades de crédito para migrar do carro popular para veículos mais sofisticados. Os sedans e os utilitários esportivos (SUV, da sigla em inglês) têm sido os mais procurados. 

 

E isso fica evidente quando a performance da companhia no acumulado janeiro-agosto deste ano é analisada. O sedan Cerato, seu campeão de vendas, obteve uma participação de 7% no segmento. 

 

55.jpg

 

Na categoria SUV, a Kia possui 7,5%, somando o desempenho dos modelos Sportage, Sorrento e Mohave. Seu principal inimigo, no entanto, é a compatriota Hyundai. Apesar de pertencerem ao mesmo grupo, no Brasil elas são rivais. 

 

Tanto que, em 2009, a Kia acusou a Hyundai de propaganda enganosa ao dizer que ela havia ultrapassado a Ford em termos globais. A Kia alegou que a conta só fechava quando somados os desempenhos de Kia e Hyundai. Para se impor nessa “terra de gigantes”, Gandini faz marketing  com táticas de guerrilha. 

 

Com uma verba modesta para os padrões do setor, de R$ 180 milhões neste ano, ele apostou em ações que garantissem visibilidade. Uma delas foi o merchandising nas novelas da Globo. A outra foi a participação em reality shows, como A Fazenda, da Record. 

 

Neste ano, o empresário replicou no Brasil iniciativas globais como o Kia On Tour. É uma espécie de feirão que reúne todas as concessionárias de determinada cidade e no qual o mote é a experimentação. Já foram realizados três eventos do tipo. 

 

O último deles, ocorrido em agosto em Goiânia (GO), teve como saldo a venda de 85 veículos. Em um fim de semana normal, essa rede comercializa até 25 unidades. Para dar suporte à nova etapa de crescimento, o presidente da Kia Motors do Brasil pretende aumentar a rede de revendas, hoje formada por 140 concessionárias. Outras 20 deverão ser abertas até o fim do ano, gerando um investimento global em torno de R$ 100 milhões.

 

“A ampliação das revendas e a instalação de motores flex em todo o portfólio deverão garantir o ritmo de crescimento atual pelos próximos cinco anos”, aposta Gandini. Depois disso, o insistente Gandini deverá começar a pregar sobre a necessidade da instalação de uma fábrica da Kia no Brasil.