Nos anos 1990, as americanas Intel e AMD protagonizaram uma briga por chips para PCs, com ampla vantagem da primeira. Duas décadas depois, essa história se repete em celulares, mas com outros atores: a americana Qualcomm e a taiwanesa Mediatek, que detêm 66% e 20%, respectivamente, do mercado mundial de processadores para smartphones. Juntas, elas dominam esse setor, fazendo a Intel, que durante muito tempo foi praticamente monopolista na indústria de desktops, comer poeira em mobilidade, reduzida a uma fatia inferior a 5%. É ainda uma briga desigual a favor da Qualcomm.

Mas, de forma discreta e com paciência, a Mediatek está ganhando posições nesta competição e atraindo a atenção de grandes fabricantes. O que explica o avanço da Mediatek, que fabrica o que podem ser considerados chips genéricos para celulares? Assim como a AMD, a empresa taiwanesa apostou em processadores de celulares com especificações de alto desempenho, mas preços mais baixos do que os da Qualcomm e de outros rivais. Essa vantagem, inicialmente, era percebida apenas por empresas de menor porte, que produziam aparelhos de qualidade duvidosa.

Tanto que o executivo Tsai Ming-kay, CEO e presidente do conselho da empresa, é chamado pela imprensa de seu país como “o rei dos celulares xing ling”. Tsai, cuja fortuna é estimada em US$ 1,5 bilhão, também é conhecido como “o poderoso chefão do chip taiwanês”, devido a sua discrição e por dificilmente ser visto em público. “É uma besteira chamar os aparelhos com nosso chip de xing ling”, disse Tsai, em uma rara entrevista ao jornal britânico Financial Times, em 2010. Apesar da fama depreciativa que seus chips carregavam, a Mediatek, baseada em Hsinchu, cidade ao norte de Taiwan, foi ganhando corpo. Primeiro, conquistou os fabricantes chineses de smartphones, como Huawei, Lenovo e Xiaomi.

Na sequência, a companhia começou a quebrar a resistência de algumas das grandes marcas globais. Atualmente, a coreana LG, a japonesa Sony, a americana Motorola (comprada pela chinesa Lenovo) e a taiwanesa Asus também passaram a adotar os chips da Mediatek. Dos principais fabricantes do mundo móvel, só as líderes Apple e Samsung não usam seus processadores. No Brasil, a Positivo lançou seu primeiro celular com processador de oito núcleos da Mediatek. CCE, Gradiente e Multilaser são outros clientes nacionais da empresa de Tsai. “Participei diretamente do processo de criação desses aparelhos”, afirma Sergio Abramoff, que comanda os negócios da empresa no País.

“Estive do lado da Positivo, por meses, tentando iniciar um projeto com smartphones.” A fórmula da Mediatek foi desenvolvida no começo dos anos 2000. A Motorola, a Ericsson e a finlandesa Nokia, que disputavam a liderança do mercado de celulares, nessa época, compravam chips e, a partir deles, desenvolviam seus aparelhos. Isso demandava uma vasta equipe de engenheiros e um investimento enorme em tecnologia. A sacada da Mediatek foi vender um processador que já vinha com um “manual de instruções”. A empresa que optasse por seu componente precisava de poucos engenheiros para fazer pequenas alterações no produto e lançá-lo rapidamente no mercado. “O modelo que a Mediatek desenvolveu popularizou o mercado de smartphones”, diz Abramoff.

Criada em 1997, a partir da divisão de chips da fabricante de semicondutores United Microelectronics Corp., a Mediatek começou como uma fabricante de chips para aparelhos de DVD e TV. Atualmente, quase todas as empresas de smart tevês contam com um chip da fabricante taiwanesa, incluindo as das coreanas Samsung e LG. Mas essa área foi, gradativamente, perdendo espaço. Nada menos de 50% do faturamento de US$ 7 bilhões no ano passado veio da venda de chips para smartphones e tablets. Estima-se que mais de 1,5 mil modelos de aparelhos usam os processadores da Mediatek. cujo valor de mercado ultrapassa os US$ 20 bilhões – a empresa é cotada na bolsa de Taiwan desde 2001. Tsai, seu presidente, já foi escolhido como um dos CEOs com melhor desempenho do mundo pela publicação americana Harvard Business Review, uma das bíblias do mundo corparativo.