Uma empresa brasileira faz um empréstimo internacional e paga juros menores do que o governo italiano. Essa situação seria impensável há alguns meses. No entanto, é o que vem ocorrendo por causa do agravamento da crise na Europa e do entusiasmo dos investidores com os países emergentes. Ao contrário do registrado em crises passadas, agora não falta dinheiro para os emissores brasileiros. Mais surpreendente, o custo permanece o mesmo. O ligeiro aumento do prêmio de risco pago em relação às taxas dos títulos do Tesouro americano foi compensado pela queda dos juros nos Estados Unidos. Assim, o País captou US$ 32,5 bilhões até o início de setembro, valor que deverá ultrapassar a casa dos US$ 42 bilhões, segundo os analistas. 

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Um bom exemplo desse movimento é o da Brasil Telecom, subsidiária da Oi. Ela inaugurou a temporada de emissões internacionais no segundo semestre, captando R$ 1,1 bilhão na primeira semana de setembro. Os papéis são denominados em reais, têm prazo de cinco anos e pagam juros de 9,9% ao ano, mais barato que os 10,8% ao ano pagos, em média, pela empresa no Brasil. Se Alex Zornig, diretor-financeiro da Oi, quisesse trazer mais, sem problemas: havia ordens dos investidores para até R$ 2,1 bilhões. “Há muito dinheiro nos Estados Unidos procurando bons rendimentos, já que lá se esperam taxas de juros baixas por um bom tempo”, diz Zornig. Os investidores internacionais também estão vendo o Brasil como um porto seguro, se comparado a alguns países europeus, afirma Pedro Bianchi, diretor do Bank of America Merrill Lynch, que coordenou a emissão.

 

A percepção de que os países emergentes são mais confiáveis cria situações inéditas. A Brasil Telecom é uma empresa privada, teoricamente um devedor mais arriscado que um governo de um país desenvolvido. Na semana passada, com os mercados de mau humor, um investidor exigiria uma remuneração de 5,8% ao ano em dólares para comprar seus títulos com vencimento em 2020. Nesse mesmo momento, o governo italiano vendeu papéis com metade do prazo – cinco anos – e pagou 5,6%. A situação italiana é ainda mais trágica, se  comparada ao governo brasileiro: os papéis de dez anos da República pagavam 3,7% anuais, na semana passada. Segundo Robert Carlson, diretor de mercado de capitais do banco Barclays, em Nova York, os títulos de países emergentes tornaram-se uma nova classe de ativos no mercado internacional, para investidores que querem diversificar suas aplicações. A captação da Brasil Telecom deve ser a primeira de uma série. O secretário do Tesouro, Arno Augustin, disse na quarta-feira 14 que o governo quer emitir títulos em dólares ou reais. 

 

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Almir Barbassa, diretor-financeiro da Petrobras, afirmou que a estatal pretende captar recursos em reais ou euros. Espera-se ainda uma emissão de até US$ 2 bilhões em bônus da Eletrobras. Seria um exagero dizer que a crise não teve efeito nenhum sobre o financiamento externo das empresas brasileiras. É claro que o apetite entre os investidores europeus diminuiu. “Está difícil convencer os europeus a comprar qualquer coisa”, diz Zornig, da Brasil Telecom. Jayme Fonseca, diretor-financeiro da construtora Norberto Odebrecht, tem a mesma percepção. “Muitos compradores tradicionais estão arredios, observando o mercado, mas relutantes em fechar negócio”, diz. Participante habitual dos mercados, a Odebrecht não planeja nenhuma emissão no curto prazo, embora tenha mantido sua rotina de apresentações a investidores internacionais. Mesmo assim, Eduardo Borges, diretor do banco Santander, prevê um grande volume de emissões neste mês. “Os investidores estão voltando para ativos de maior risco”, afirma. João Teixeira, presidente do banco Votorantim, também está otimista. “Não vemos um cenário em que não haja acesso a recursos externos.”