13/11/2015 - 20:00
De quatro em quatro anos, uma gigantesca janela de oportunidades se abre para as empresas de material esportivo se tornarem protagonistas na tevê e na internet, espalhando suas marcas por todo o planeta. Cientes disso, essas companhias passaram a fazer dos Jogos Olímpicos, além de uma celebração dos esportes, uma grande vitrine de marketing. “Eventos como uma Olimpíada são enormes megafones para marcas como a nossa”, diz à DINHEIRO Cristian Corsi, diretor-geral da Nike do Brasil.
A companhia anunciou, na quarta-feira 11, as estratégias da marca para o evento, resumidas no slogan “Vem Junto”, mas o marketing está longe de ser o único foco no momento. A 250 dias do início dos Jogos, a gigante americana, que faturou US$ 30,6 bilhões no último ano, precisa ainda apagar do público a má imagem causada por suspeitas nada agradáveis ao redor da marca. A mais recente delas veio à tona na segunda-feira 9. A Agência Antidoping Mundial (Wada) divulgou um relatório em que relata um esquema de propinas envolvendo a Federação Russa de Atletismo, entidade patrocinada pela Nike.
Segundo o documento de 323 páginas, membros da Federação cobravam propina de atletas pegos no exame antidoping para destruir as provas que os prejudicariam. Com o escândalo, diversas personalidades do mundo esportivo passaram a defender o banimento da equipe de atletismo da Rússia na Olimpíada de 2016, o que causaria mais uma mancha à reputação, mesmo que indiretamente, da Nike. Para completar, o atual presidente da Associação Internacional das Federações de Atletismo (IAAF), o ex-velocista britânico Sebastian Coe, é embaixador da Nike.
Muitos defendem a saída de Coe do cargo, por conflito de interesses – afinal, o dirigente precisa aplicar punições a atletas, ao mesmo tempo que é remunerado por uma companhia que dá apoio aos suspeitos de doping. De quebra, o caso ressuscitou as críticas à Nike por ter assinado, neste ano, o patrocínio do americano Justin Gatlin, o corredor dos 100 metros já suspenso duas vezes por doping. As polêmicas envolvendo a empresa não se resumem ao atletismo.
O escândalo que vem revirando os bastidores do esporte mais popular do mundo, o futebol, com acusações de corrupção na FIFA, recolocou a marca no risco de reviver os seus piores dias no Brasil, quando, em 2000, foi instaurada a chamada CPI da Nike, cujo objetivo era investigar os contratos da empresa com a CBF. Desta vez, a marca foi citada nas investigações conduzidas pelo FBI e pelo Departamento de Justiça dos EUA. A Nike teria pago uma propina de US$ 60 milhões para garantir seu contrato de patrocínio à seleção brasileira.
Sobre envolvimento direto ou indireto da companhia em escândalos de doping ou corrupção, Corsi se esquiva como um atleta de alta performance. “Esse assunto está fora do nosso alcance, do nosso foco”, desconversa o executivo. “Nosso compromisso é apenas com o esporte e com os atletas.” Minutos depois, outros executivos da Nike repetiram, como um mantra, a mesma declaração. O marketing será, de fato, um dos grandes trunfos da Nike para virar esse jogo e driblar as polêmicas, especialmente às vésperas da Rio 2016. Afinal, de propaganda a empresa entende bem.
Mesmo sem nunca ter sido patrocinadora oficial de alguma edição da Olimpíada, a marca americana se especializou em roubar a cena, graças à estratégia conhecida como marketing de emboscada. Foi assim em Londres, em 2012, quando nenhum produto foi mais citado do que os tênis Volt, de cor amarelo fosforescente, que calçaram cerca de 400 atletas patrocinados pela marca e que se destacavam nas imagens das disputas. “Marcas como a Nike sofrem menos as oscilações de humor em relação aos eventos esportivos.
E, quando problemas acontecem, elas conseguem rapidamente ligar sua imagem aos aspectos positivos do evento”, diz Mauricio Magalhães, fundador da agência de marketing Tudo, ligada ao grupo ABC. “Empresas de outros setores, como a Samsung e P&G, por exemplo, precisam de muito mais tempo e investimentos para conseguir isso.” Para 2016, o fator surpresa na estratégia da marca ainda está guardado a sete chaves, mas o vice-presidente de marketing e Olimpíada da Nike, Henry Rabello, dá uma pista. “Usamos esses eventos para divulgar inovações”, afirma.
Se o público pode esperar da empresa avanços tecnológicos para vestir os mais de 300 atletas brasileiros que patrocina, as primeiras iniciativas da empresa voltadas aos Jogos já estão na rua. Literalmente. O slogan “Vem Junto”, criado pela agência W+K SP, está estimulando a criação de clubes de corridas pelo País. “Estudamos muito a cabeça do consumidor, em especial, do jovem, no Brasil”, diz Rabello. “E ele não espera mais que se façam as mudanças por ele. Por isso, o slogan é um convite a se movimentar.”
O foco no público de corrida também tem um motivo econômico importante para a empresa, que planeja dobrar, de 2014 para 2019, seu faturamento no Brasil para US$ 2 bilhões. Líder mundial em calçados de corrida, com uma receita de US$ 16,2 bilhões no segmento, ela já tem US$ 2,6 bilhões desse valor vindo dos países emergentes, como o Brasil e o México. Mas as rivais têm interesse em disputar com força esses mercados. “Em 2016, pretendemos dobrar de tamanho a receita com artigos de corrida no Brasil”, diz Rodrigo Messias, diretor do projeto olímpico da Adidas. “Para isso, investiremos apenas em esportes relevantes para o foco, e deixamos de fora, por exemplo, o patrocínio ao iatismo e ao hipismo.”
Na Olimpíada, a alemã também promete ocupar uma posição que era a da Nike, a de guerrilheira do marketing. Os Jogos do Rio serão os primeiros em décadas em que a Adidas não ocupa o posto de patrocinadora oficial. Dessa vez, a Nike fechou acordo para fornecer os uniformes da organização do evento e patrocina o Comitê Olímpico Brasileiro. Serão ativos importantes para conquistar destaque durante as duas semanas de disputas esportivas, em agosto de 2016. Mas a empresa poderia se beneficiar bem mais desse momento se conseguir, até lá, sumir das páginas de escândalos do esporte.
Correção: o slogan “Vem Junto” foi criado pela agência W+K SP e não pela RG/A