01/05/2014 - 19:00
O apetite das grandes empresas americanas para operações de fusão e aquisição de concorrentes nunca foi tão grande como agora, passados pouco mais de cinco anos da crise de 2008. Isso vale tanto para negócios dentro de suas fronteiras quanto no Exterior. Pesquisa da consultoria britânica Dealogic mostra que apenas no bimestre janeiro-fevereiro as compras lideradas por empresas dos Estados Unidos somaram US$ 336 bilhões, um avanço de 31% em relação a igual período de 2013. E no que depender do apetite de Jeffrey Immelt, presidente da General Electric (GE), e de Ian Read, CEO da Pfizer, o maior laboratório farmacêutico do mundo, essa bolada deve crescer bastante nas próximas semanas.
O primeiro está disposto a desembolsar US$ 16,9 bilhões pela divisão de energia da francesa Alstom. Read, por sua vez fala em pagar até estratosféricos US$ 100 bilhões pelo passe do suíço-britânico AstraZeneca, o principal grupo farmacêutico europeu. A oferta formal da GE, que está mais adiantada em suas negociações, foi apresentada na quarta-feira 30 para os acionistas da empresa francesa, que têm até o final de maio para se decidir. Ate lá, o assunto deverá continuar nas páginas da imprensa econômica da Europa e nas rodas de conversa no parlamento francês. Isso porque a alemã Siemens também está disposta a comprar os ativos da Alstom.
Mas, afinal, por que todos querem a Alstom? Uma das melhores respostas partiu do próprio Immelt, no comunicado no qual formaliza a proposta. “A Alstom completa não apenas nossas prioridades estratégicas como também nossa possibilidade de crescimento na área industrial”, disse. O problema é que, ao mirar o outro lado do Oceano Atlântico como a nova fronteira de crescimento da GE, o executivo mexeu com os brios dos europeus, em geral, e dos franceses, em particular. O que acabou se transformando na senha para que os dirigentes da Siemens fossem bater às portas do governo francês. Nos bastidores, o presidente socialista François Hollande tentou minar as pretensões dos americanos, liberando seus auxiliares mais graduados para conversar com os alemães.
“A Alstom é uma espécie de jóia da indústria nacional francesa”, afirmou o ministro da economia, Arnaud Montebourg. Criadora do TGV, o famoso trem de alta velocidade, a empresa é uma noiva cobiçada porque possui um portfólio recheado de ativos estratégicos, incluindo dezenas de centrais nucleares. Apenas a divisão de energia garantiu um faturamento de US$ 15 bilhões em 2013, com serviços de geração e transmissão. “Os funcionários da Alstom vão se juntar a uma reconhecidamente grande empresa, em condições de investir em tecnologia e na criação de empregos de alto nível”, afirmou Patrick Kron, CEO da Alstom, favorável ao negócio com a GE e que vem sendo apontado como “traidor”, acusado de ter feito gestões nos bastidores em favor dos americanos.
Embora a GE tenha formalizado sua oferta, a Siemens não se considera ainda derrotada. Em um claro tom conciliador, Kron deixou claro que aguarda uma proposta firme dos alemães. O aquecimento do segmento de fusões e aquisições tem relação direta com a melhoria do cenário macroeconômico nos dois lados do Atlântico. “A expectativa é de que o ritmo de negócios se mantenha aquecido globalmente”, diz Luís Motta, líder da área de fusões e aquisições da KPMG no Brasil. Segundo ele, o fantasma da crise econômica global de 2008 já foi largamente superado. Inclusive por aqui, onde, apesar do crescimento mais modesto do PIB, o número de fusões e aquisições se mantém em um patamar elevado, ao redor de 800 transações anuais, envolvendo empresas de capital nacional e estrangeiro.
Nesse contexto, a disputa entre a GE e a Siemens para saber quem leva a Alstom, é considerada por Motta como um grande exemplo das centenas de negócios que devem ocorrer envolvendo empresas de todos os continentes ao longo deste ano. Um dos mais vistosos, certamente será a compra da AstraZeneca pela Pfizer, do CEO Read. O negócio ainda está em estágio embrionário e, ao contrário da Alstom, cuja direção está pronta para se atirar nos braços do primeiro pretendente que apareceu, os executivos do laboratório europeu não querem nem ouvir falar em casamento. O apetite da farmacêutica americana está em linha com o que mostra relatório divulgado pela consultoria Grant Thornton. Os CEOs americanos são maioria entre os que veem nas transações de fusão e aquisição uma senha para acelerar o crescimento de suas empresas.