No momento em que o Brasil se esforça para aumentar a competitividade da indústria e retomar o crescimento econômico, um estudo elaborado pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), divulgado na quarta-feira 3, causou estranheza no meio empresarial. A conclusão do trabalho é de que, para continuarem vivas, muitas empresas brasileiras deveriam se transferir para o Paraguai, onde a energia, a mão de obra e os impostos são 35% mais baixos, em média. Não que a constatação seja uma novidade, mas chamou a atenção por ter saído de uma entidade que combate a desindustrialização. Para o ex-embaixador do Brasil em Washington e presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior da Fiesp, Rubens Barbosa, trata-se de uma questão de vida ou morte. “Se ficarmos parados, muitas empresas irão fechar.”

 

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Não é contraditório uma associação que, historicamente, alerta para a desindustrialização da economia brasileira estimular as empresas a deixar o País?

Não é contraditório. Eu não estou aqui de gaiato. A Fiesp não está de brincadeira. Queremos mostrar para as empresas de setores que estão indo mal que existem alternativas para não fechar. Há muito tempo, a Fiesp tem defendido a criação de medidas que devolvam a competitividade da indústria brasileira, especialmente com a redução do custo da energia e da carga tributária, mas não estamos enxergando mudanças significativas no curto prazo.

 

Se as empresas se transferirem para o Paraguai, haverá demissões aqui.

As demissões já estão ocorrendo. No ano passado, a indústria de transformação extinguiu 60 mil empregos só no Estado de São Paulo. O mesmo ocorre em todas as partes do País nos setores têxtil, calçadista, moveleiro e de cerâmica, entre muitos outros. Além disso, há cerca de 350 mil brasileiros trabalhando e vivendo no Paraguai. Se as nossas empresas forem para lá, podem gerar emprego para os próprios brasileiros, se quiserem.

 

Recomendar que os empresários se mudem para o Exterior não é um desserviço à economia brasileira?

Não. A Fiesp não está promovendo o desinvestimento, está apenas buscando alternativas. É preciso deixar claro que as empresas brasileiras não são instituições beneficentes. Os empresários não estão aqui para fazer caridade. Querem o lucro. 

 

Mas a maioria das empresas está faturando mais, correto? 

Isso não está acontecendo. O atual contexto econômico é muito negativo para a indústria. Não acredito que, da noite para o dia, as empresas nacionais se mudarão para o Paraguai. Ninguém quer sair daqui e ir para outro país. Todos os empresários querem ficar. Mas, do jeito que está, não dá. 

 

O Paraguai tem oferecido atrativos?

Sim. Nós chamamos um grupo de empresários paraguaios para nos mostrar as vantagens do país vizinho. Há muitas oportunidades lá. A energia de Itaipu, por exemplo, dá segurança aos empresários locais. Os paraguaios querem as indústrias brasileiras e o momento coincide com a vontade das empresas brasileiras de se internacionalizarem. Existem cerca de 300 empresas nacionais fazendo negócios lá fora, 20 delas no Paraguai. Trata-se de um parceiro estratégico para o Brasil, que pode ser mais bem aproveitado em vários aspectos. 

 

A recomendação de mudança para o Paraguai é uma forma de pressionar o governo brasileiro a promover mudanças no campo da competitividade?

De certa forma, sim. Quando a equipe econômica se der conta de que precisa fazer mais para garantir a competição do Brasil no mundo, pode ser que acelere as reformas que hoje são necessárias. Mas, por enquanto, a reforma tributária nem sequer está na pauta do governo. Além disso, as medidas de desoneração da folha de pagamentos, anunciadas recentemente, beneficiam um aqui, outro lá. Não é algo para todo o setor produtivo. Se ficar parada, a indústria vai quebrar.

 

Alguma vez na história um país que estimulou a saída de suas empresas, em nome da redução de custos, se deu bem?

Os Estados Unidos fazem isso com o México há muitas décadas. Mantendo a competitividade de suas empresas lá fora, o Brasil poderá receber dividendos. Podemos começar a fazer uma integração mais aprimorada da cadeia produtiva brasileira e paraguaia, exportando matérias-primas nossas ao Paraguai e importando produtos manufaturados a um custo muito menor. Então, respondendo a sua pergunta, não há perda para o Brasil.

 

Como não? Exportar matéria-prima e importar produtos industrializados parece um retrocesso. 

Retrocesso é matar a indústria. Quem olhar para os indicadores macroeconômicos verá isso. O superávit comercial deste ano deverá ser a metade do registrado em 2012. As exportações estão crescendo cada vez menos. As importações só crescem. Muito pouco tem sido feito para solucionar esse descompasso. O governo deveria estar mais preocupado com isso.

 

Uma maior integração econômica com o país vizinho tem motivações políticas?

A motivação é essencialmente econômica, mas sob a ótica política é muito positiva também. Essa é a primeira boa iniciativa brasileira com o Paraguai desde o rompimento da cordialidade entre os dois países, com a destituição do ex-presidente Fernando Lugo, em junho do ano passado.

 

E se houver um êxodo da indústria e uma onda de demissões?

A fabricante gaúcha Marcopolo produziu 42 mil ônibus no ano passado, sendo 21 mil dentro do Brasil e 21 mil fora. Suas fábricas no Exterior empregam aproximadamente seis mil funcionários, vagas que poderiam ter sido geradas aqui. Ninguém a criticou por fazer isso. Nem se pode criticar. Foi uma alternativa que a Marcopolo encontrou para continuar competitiva.