26/08/2022 - 5:20
Raj Sisodia nasceu na Índia e passou parte da infância em lugares culturalmente diferentes como Barbados, Califórnia e Canadá. De volta a seu país, cursou engenharia elétrica no Birla Institute of Technology and Science (BITS, Pilani), mas não seguiu carreira. Foi para o marketing, após cursar um MBA no Jamnalal Bajaj Institute of Management Studies em Mumbai e depois obteve um Ph.D. em Marketing e Política de Negócios pela Columbia University (EUA). Foi no marketing que sua educação oriental o fez ver os muitos problemas do capitalismo. A partir daí, cocriou o movimento Capitalismo Consciente. Hoje ele se dedica a disseminar esses ideais através de seus livros, palestras, cursos e consultorias para empresas do porte de IBM, Kraft Foods, LG, McDonald’s, Nokia, Siemens, Whole Foods, Volvo e Walmart.
O que é o capitalismo consciente?
São negócios e lideranças que ajudam a construir um mundo melhor, com um propósito e impactos positivos que vão além do lucro. Muitas vezes esquecemos o que nos torna humanos, e isso é algo que deve se tornar parte dos negócios. Não é sobre colocar tanto [recurso] nesse projeto de meio ambiente, ou tanto naquele outro para a sociedade. É sobre ter um propósito alinhado ao que o mundo e a sociedade precisam. As empresas têm um papel importante em resolver os problemas da sociedade e um ótimo palco para isso.
De onde veio o conceito?
Eu trabalhava e dava aula de marketing e isso me fez enxergar muitas coisas ruins que existiam nessa área dentro das empresas. Um exemplo é a correlação entre propaganda, distúrbios alimentares e dismorfia corporal. Isso acontece pela necessidade inerente ao capitalismo de vender mais produtos e aumentar o lucro. Nós estamos tendo um impacto negativo nos consumidores e na sociedade. Foi a partir dessas percepções que eu decidi começar a escrever sobre o assunto e me dedicar a difundir essas ideias.
Ser indiano e tendo vivido no centro do capitalismo, nos Estados Unidos, te fez enxergar isso?
Com certeza. Tenho um mix de culturas que me ajuda a entender tanto o Oriente como o Ocidente. Enquanto as sociedades do Ocidente estão na frente em educação, industrialização, dinheiro e democracia, as do Oriente têm a sua cultura muito mais focada em ser consciente em relação à sociedade. Ter esses dois ideais em mente me ajudou a entender que o capitalismo é necessário para escalar e aumentar o impacto, mas é preciso ter consciência nos modelos de negócio para restringir o dano que podemos levar às pessoas e ao planeta.
O que há em comum entre empresas que praticam isso?
Hoje se vê muitas empresas que gastam muito em marketing e não têm bons retornos com sua comunidade. Do outro lado, empresas que não gastam tanto com isso e seus consumidores as adoram. Por quê? A ideia é que empresas que são centradas em resolver os problemas dos clientes não precisam de um gasto enorme em marketing, seus clientes se tornam leais e divulgam os benefícios da empresa por si só. É sobre ter os valores e ideias alinhados com seu público.
Como as companhias podem ter um propósito significativo?
É sobre realmente entender seu público e os efeitos do negócio na sociedade. É estar orientado não apenas aos clientes, ou acionistas, mas entender todos os stakeholders do processo, de ponta a ponta. Entender todos os pontos de impacto que sua empresa tem ajuda a encontrar soluções mais efetivas e melhorias para os processos, além de deixar todos os envolvidos mais satisfeitos. Isso é praticar capitalismo de forma consciente.
Como conscientizar as pessoas e empresas?
Estamos criando um movimento e a ideia é focar na educação. Ministramos cursos de 20 a 80 horas que falam sobre os conceitos do tema, para certificar empresas e pessoas. Já certificamos pelo menos 180 empresas e 4,5 mil líderes. Destes, pelo menos 300 viraram embaixadores do movimento. Agora é trazer isso para o maior número de empresas e pessoas em países diferentes para fomentar a discussão.
Como atingir o equilíbrio entre um negócio lucrativo e a sustentabilidade?
Não é sobre ter um equilíbrio. É uma troca. Minha pesquisa vem mostrando que o caminho mais efetivo para o lucro é ter uma empresa que tem um propósito alinhado a resolver problemas reais do mundo e das pessoas. O lucro não deve ser o objetivo principal. Deve ser uma consequência do impacto positivo que aquele negócio consegue ter na sociedade e no planeta. Lucrar é algo fundamental, é irresponsável deixar isso de lado, é como a sociedade funciona, mas o que realmente importa é o ‘como’ você ganha dinheiro e em o ‘que’ você gasta.
O que não deve ser exemplo?
Não dá para ser parasita nesse mundo. Não podemos ganhar dinheiro espremendo aqui e ali, pagando o mínimo para os funcionários, fazendo-os trabalhar mais e mais horas, não se preocupar com a saúde deles ou com a de suas famílias. O mesmo se dá para seus fornecedores. Se você paga o mínimo e eles não conseguem lucrar, você não está pensando conscientemente em toda a cadeia e eles não conseguirão exercitar o capitalismo consciente na empresa deles. Hoje em dia não é mais aceitável ser assim e acredito que, com o tempo, esse tipo de empresa não irá mais prosperar, porque isso gera concentração de renda e impactos catastróficos na sociedade.
As empresas têm um espaço melhor que os governos para resolver os problemas da sociedade?
Eu acho que há um papel para cada um. O governo tem a função de criar um ambiente favorável para a sociedade prosperar e ser sustentável, o que envolve educação, políticas públicas eficientes, um sistema legal adequado, segurança e deve também ajudar a manter a estabilidade desses âmbitos. Com o ambiente correto, as empresas têm espaço para agir de forma sustentável ao mesmo tempo em que lucram e atendem a toda a cadeia em que atuam.
Como as novas gerações como os millennials e a geração Z estão contribuindo para esse movimento?
Essas novas gerações a partir dos millennials já vêm com essa direção de propósito ‘de fábrica’. Nas gerações mais antigas, propósito era algo que as pessoas procuravam mais tarde na vida, por volta dos 40 anos, como uma crise de meia idade, porque até aí elas estavam preocupadas apenas com o sucesso – o que na época significava um bom carro, uma casa, um bom salário e esse tipo de coisas. Nossos sucessores já nasceram em uma época de crises, seja econômica, do meio ambiente, entre outras, então isso já está no DNA deles. E com a internet e a globalização, eles têm todas as ferramentas necessárias para entender o que está acontecendo e como ajudar da melhor maneira. O problema é que muitas desses jovens não enxergam o empreendedorismo como uma saída para resolver os problemas do mundo. Então esse é outro ponto que estamos tentando difundir com o movimento: ensinar os jovens a criarem modelos de negócio baseados nos problemas que querem resolver.