12/10/2013 - 7:00
O americano Peter Grauer, presidente do conselho da empresa de tecnologia e de informações Bloomberg Inc e conselheiro não executivo da mineradora e empresa de commodities Glencore Xtrata, é um interlocutor privilegiado das lideranças políticas e econômicas mundiais. Metade de seu tempo é dedicada a contatos com quem decide nos cinco continentes. Sua avaliação da economia mundial é otimista. Para ele, os Estados Unidos vão superar rapidamente o impasse político e países como China e Japão apresentam perspectivas excelentes no curto prazo. Em uma passagem de dois dias pelo Brasil, o acelerado e objetivo Grauer falou com a DINHEIRO:
Estamos presenciando um impasse político nos Estados Unidos que acabou paralisando o governo. Como o sr. avalia essa situação?
Nada indica, atualmente, que haverá uma solução definitiva para esse impasse no curto prazo. Esse acordo requer muita negociação, e isso vai demorar. No entanto, no curto prazo, os políticos republicanos e democratas vão encontrar uma maneira de se entender, de modo a conseguir elevar, ainda que provisoriamente, o teto de endividamento da economia americana e fazer o governo voltar a funcionar.
Essa paralisação poderá afetar a recuperação da economia?
Os Estados Unidos estão em um processo seguro de recuperação. Os prognósticos para o crescimento são bons. A confiança do consumidor vem melhorando consistentemente. Apesar de ter havido uma desaceleração pontual nos últimos meses, o consumidor médio americano parece bastante propenso a continuar comprando. Não podemos nos esquecer de que, nos Estados Unidos, o consumo movimenta 70% da economia, e esse é um bom sinal. Outro indicador positivo é o número do início de novas residências, que chegou a 628 mil unidades em agosto, o maior nível em cinco anos. Tudo isso indica uma recuperação, mas ainda há alguns indicadores econômicos preocupantes.
Quais, por exemplo?
Alguns números, como o do desemprego, não são bons. Em agosto, o índice de desemprego foi de 7,3%. Esse número vem caindo ao longo dos últimos meses, mas a queda tem sido lenta e o percentual permanece em um patamar assustadoramente elevado. Outro indicador importante é a força de trabalho disponível. Atualmente, a quantidade de americanos que está empregada ou procurando emprego representa 63,2% da população economicamente ativa. Esse é o menor nível desde 1978, o que mostra que, apesar de o desemprego estar elevado, a oferta de trabalhadores no mercado caiu.
Isso deverá comprometer a expansão prevista do PIB neste ano?
Não. Mesmo com esses indicadores, deveremos observar um crescimento da economia entre 2,25% e 2,5% neste ano e em 2014.
E em relação a outras regiões, como a Europa, por exemplo? Qual é a sua avaliação?
Há um componente de fragilidade na recuperação econômica no mundo todo, mas os prognósticos são bons. Veja a situação da Itália. No início de outubro, o primeiro-ministro, Enrico Letta, conseguiu obter um voto de confiança do Senado para manter seu governo e prosseguir com o programa de reformas.
Isso vale para todos os países da Europa?
De certo modo, sim. O programa de austeridade do Reino Unido continua a ser implementado, apesar de medidas desse tipo serem sempre impopulares. Isso é um bom sinal. Há um problema com a União Europeia, que tem vivenciado uma situação econômica bastante frágil nos últimos tempos. Mas está caminhando na direção certa e isso deverá garantir crescimento, ainda que moderado.
O crescimento econômico da China parece estar se desacelerando também. Qual é a sua avaliação sobre a região?
Estive na China em meados de setembro e minha impressão é de que o novo governo está administrando a economia de maneira a obter um crescimento de 7,5%. O crescimento chinês está se desacelerando. Algumas pessoas afirmam que a economia chinesa vai se reorientar, para se transformar em um sistema mais voltado ao mercado interno do que atualmente. Eu concordo, mas temos de ter em mente que ainda vai demorar algumas décadas para que a economia chinesa se transforme em uma economia de mercado nos moldes das economias ocidentais. E isso vai depender, claro, de que a nova administração chinesa continue fazendo investimentos elevados em infraestrutura. Por enquanto, o crescimento chinês vai continuar dependendo pesadamente de gastos do governo e do movimento de urbanização da população.
Há outras promessas na Ásia, além da China?
Sem dúvida. Visitei o Japão recentemente e fiquei surpreso com o dinamismo que a economia japonesa está mostrando. O primeiro-ministro, Shinzo Abe, tem uma posição forte nas duas casas do Parlamento e isso facilita muito as coisas. É um consenso entre os empresários que Abe vai permanecer pelo menos três anos no cargo, e sua permanência pode chegar a seis anos. Esse longo tempo deverá garantir a implementação das reformas, que é muito necessária. A política de estímulo japonesa, que é uma injeção de recursos na economia correspondente a 75% do pacote de ajuda dos Estados Unidos, vai garantir o crescimento econômico no longo prazo. O Japão está caminhando na direção certa. Seu governo está tomando decisões difíceis, e isso é muito positivo. Hong Kong e Cingapura são mercados muito promissores. Isso vale para o Sudeste Asiático, com exceção da Indonésia. A Índia é um problema e vai continuar a ser por muito tempo, mas o restante da região vai bem. Países como a Austrália e o Brasil, cuja economia depende muito de commodities, terão um bom desempenho.
Por quê?
Sou conselheiro não executivo da Glencore Xtrata e fazemos muitos negócios nessa área. No início do ano, o mercado para commodities estava fraco, mas houve uma leve recuperação dos preços nos últimos meses e isso deve perdurar por mais algum tempo, pois a demanda está consistente, o que é bom para o Brasil. Minha avaliação sobre o País é parecida com a dos empresários com quem conversei aqui: o crescimento da economia deverá ficar entre 2,2% e 2,3% neste ano. O que me surpreendeu foram algumas semelhanças dos problemas brasileiros com os problemas da economia americana.
Quais, por exemplo?
Os problemas da aposentadoria. No Brasil, como nos Estados Unidos, essa é uma questão que tem de ser enfrentada e resolvida, sob pena de comprometer a eficiência das decisões do governo.