18/11/2022 - 3:50
O Chile é um país pequeno. Sua área, 756 mil km2, equivale a 8,9% do Brasil. A população, de 19,2 milhões de habitantes, caberia na Grande São Paulo, com folga. Mesmo assim, produz e exporta muito. É o maior provedor global de 26 produtos, de cerejas frescas a carbonato de lítio. Em 2019 havia 1.174 empresas chilenas exportando para o Brasil, mercado que responde por 32% das vendas do país na América Latina e maior comprador de vinhos (44% dos importados), salmão e azeite de oliva. E o futuro é promissor. Recentemente, o acordo de livre comércio entre os dois países ganhou um novo dispositivo que permite às empresas chilenas participar de licitações para compras do governo brasileiro. À frente do ProChile, vinculado ao governo de seu país, Hugo Corales Cofré falou à DINHEIRO como pretende intensificar o comércio bilateral.
O Brasil já responde por quase um terço (32%) das vendas do Chile na América Latina. Há espaço para crescer?
O Brasil é o primeiro sócio comercial do Chile na América Latina mas absorve apenas 4,5% do que exportamos para o mundo. As vendas ao Brasil cresceram 527 vezes em 60 anos, de US$ 6 milhões para US$ 3,157 bilhões. Desde 1996, os tratados de livre comércio geraram benefícios para os dois países, mas em 2018 foram adicionados dispositivos que facilitam ainda mais as relações bilaterias. Então a expectativa é crescer mais.
Quais são os principais benefícios hoje?
Em 2018 foram assinados novos protocolos no âmbito do Acordo de Complementação Econômica (ACE 35) firmado entre o Mercosul e o Chile. Um deles facilita investimentos em Instituições Financeiras. Este ano firmamos o Acordo de Compras Públicas, que permite às empresas chilenas participar de concorrências para fornecer produtos e serviços ao governo brasieiro. Isso abre um leque de oportunidades muito maior.
E como vocês pretendem aproveitá-las?
Nossa prioriade é intensificar a presença dos produtos alimentícios chilenos em mais regiões do Brasil. Queremos chegar ao Nordeste, à Amazônia, onde a participação do Chile na cesta de consumo ainda é menor. Também inauguramos recentemetne um escritório comercial em Belo Horizonte que será dedicado prioritariamente ao setor de mineração, que hoje ocupa a segunda posição no ranking das exportações chilenas ao Brasil, com vendas de US$ 1,2 bilhão anuais, atrás apenas da indústria, com US$ 1,7 bi.
Além dos acordos comerciais, a logística também oferece vantagens?
Sem dúvida. Durante a pandemia, quando houve restrições ao embarque de mercadorias por navio e por avião, o tranporte rodoviário não foi interrompido. Ele até se intensificou. Agora, uma carga de salmão do Chile chega a São Paulo em quatro dias. É estratégico ter um mercado de 210 milhões de pessoas ao nosso lado. Por isso o Brasil é o principal destino de investimento das empresas chilenas no mundo hoje, que somam um total de US$ 37 bilhões.
Isso torna o Brasil ainda mais estratégico que a Ásia, por exemplo?
Claro. Quando vendemos uma fruta para o Japão devemos prever que ela será embarcada no Chile e chegará ao destino após 45 dias. Manter suas propriedades físicas, organolépticas, envolve muito mais que refrigeração. É preciso criar tecnologias que envolvem o manuseio, a embalagem. Isso implica desenvolver capacidades. O Chile se consolidou como exportador de alimentos também por ter transmitido ao mundo confiança e qualidade. Ao exportar para mais regiões do Brasil iremos nos valer da experiência adquirida pelas empresas exportadoras chilenas.
O fato de haver uma companhia aérea com o pé nos dois países, como é o caso da Latam, ajuda de alguma forma?
Boa parte do transporte de produtos chilenos para o Brasil é feito por empresas brasileiras, que exportam carne, móveis, sucos, cosméticos, produtos de metalurgia para o Chile e retornam com cargas de frutas frescas e secas, salmão, vinho, azeite de oliva. A escala das empresas brasileiras é muito maior e isso beneficia os exportadores chilenos. O mesmo se aplica ao transporte aéreo, especialmente para as regiões onde temos menor capacidade de entregar produtos frescos, caso do Nordeste. As empresas aéreas, seja Latam ou Sky, que já oferecem várias rotas para o Brasil, terão um papel decisivo para levar cargas chilenas a mais regiões.
Essa integração logística interna é um desafio para empresas brasileiras. Como o Chile pretende resolver a questão?
A solução para isso é intregar os hubs aéreos que já existem, como Guarulhos, Confins. As empresas de transporte de carga já atuam dessa forma. E isso permitirá ao Chile fazer parte dessa malha. Hoje o Brasil já recebe aspargos do Peru que passam pelo Chile.
A proximidade geográfica facilita a entrega de produtos. Mas como isso se dá no setor de tecnologia, em que as transações são feitas de modo digital?
Um dos capítulos do acordo comercial dispõe sobre serviços e assegura o direito a um tratamento não discriminatório. Não haverá limitações ao número de provedores estrangeiros que poderão operar em cada país, assim como não será necessária a presença local para realizar essas atividades. Inclusive no comércio eletrônico. É uma medida que incentiva a competência e não a localização do prestador de serviços. O resultado será um aumento do fluxo transfronteiriço de dados. Por fim, haverá a eliminação das tarifas de roaming, com redução dos custos para o usuário.
Existe alguma possibilidade de criar novas sinergias agregando competências dos dois países?
Sem dúvida. Esperamos que no curso de dez anos esse novo acordo irá incrementar a economia circular. As competências técnicas das empresas e das instituições de pesquisa e fomento de cada país irão se somar. Cada acordo assinado pelo Chile nos últimos dez anos gerou um aumento de pelo menos 30% no faturamento das empresas exportadoras.
As mudanças de governo no Chile e no Brasil são promissoras para ambos?
As principais barreiras burocráticas já foram suprimidas, então os problemas que poderiam surgir são naturalmente menores a partir de agora. Evidentemente as estruturas dos dois países são muito complexas e sujeitas a interesses de setores, de empresas e dos governos. O importante é comunicar as vantagens que o acordo comercial traz.