As grandes questões da humanidade, como a pobreza e o crescimento da população, são temas que dizem respeito às empresas e precisam influenciar suas estratégias, acredita Dominique Turpin, presidente da escola suíça de negócios  IMD. Instalado na cidade de Lausanne, o IMD atrai executivos do mundo inteiro para conhecer as tendências globais de administração. Embora o modelo que tenha inspirado a criação da escola seja o da Harvard Business School, dos EUA, Turpin afirma que o foco excessivo na maximização do valor, muito presente na cultura americana, é um conceito que precisa ser aposentado. “Se todas as companhias seguissem o modelo americano, estaríamos mortos”, diz. Confira:

 

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Quais são os principais desafios para os líderes empresariais atualmente?

Os grandes CEOs têm a tarefa de trabalhar no desenvolvimento de modelos sustentáveis. Com o crescimento da população mundial, ainda é preciso tirar um bilhão de pessoas da pobreza. Isso exige que os modelos empresariais sejam repensados. Como lidar com os negócios de alimentação quando teremos nove bilhões de pessoas para alimentar dentro de duas décadas, com os recursos limitados que dispomos? Atualmente, países emergentes, como Turquia, Malásia e Indonésia, começam a crescer e se desenvolver, querendo ser como os Estados Unidos, uma sociedade consumista ao extremo. Mas isso está errado. 

 

As empresas estão efetivamente debatendo esse assunto?

O CEO mundial da Unilever, Paul Polman, diz que o maior desafio da companhia é trabalhar para ajudar a reduzir a pobreza. Nem os políticos nem a tecnologia vão resolver os problemas que o mundo enfrenta, como a necessidade de desenvolver energia renovável. Não poderemos mais contar com o combustível fóssil. Todos precisam levar isso em conta. 

 

Mas como as empresas podem ajudar a resolver questões tão complexas?

Repensando seus modelos. As empresas podem reduzir as emissões de carbono. Elas também são responsáveis por orientar o novo comportamento do consumidor. Redesenhar o modelo de negócio, inovar em estrutura de fornecimento, repensar a utilização de embalagens. Veja as lavadoras de roupa, que estão sendo consumidas como nunca em economias em crescimento, como o Brasil. As pessoas tendem a comprar as mais baratas, que consomem mais água e eletricidade e duram menos. As indústrias têm de desenvolver um equipamento mais durável e econômico. A maior responsabilidade está nas empresas. Os governos não farão nada a respeito. 

 

De modo geral, o sr. constata que há mais consciência sobre esse assunto?

Há dois grupos mais atentos ao assunto sustentabilidade. Um é o de CEOs e outro é a juventude – 60% da população mundial tem menos de 25 anos. Em 2025, tudo estará bem pior. É preciso mobilizar a juventude e a comunidade empresarial. Em 2008, 60% da economia dos EUA estava atrelada a serviços financeiros. Essa ênfase é muito perigosa.

 

Para onde as empresas deveriam evoluir?

As empresas têm de voltar ao seu objetivo original, que é contribuir para o bem-estar geral, não só fazer dinheiro para traders e para gerar serviços financeiros. Presidentes de companhias como a Nestlé tentam não se preocupar tanto com o que analistas de mercado dizem. “Meu trabalho não é fazer dinheiro para bancos, é contribuir para uma boa sociedade”, afirma Paul Bulcke, presidente mundial da Nestlé.

 

Essa mudança é mais perceptível nas grandes companhias europeias do que nas americanas?

Se seguíssemos o modelo americano, estaríamos todos mortos. A sociedade americana ainda tem muito presente o modelo de maximizar o valor do acionista, um conceito anglo-saxão. Esse era o norte de um dos CEOs-modelo dos Estados Unidos, o Jack Welch, da GE. Hoje, o crescimento da humanidade é a grande questão do mundo. 

 

Os europeus querem liderar esse debate?

Sim, são mais sensíveis a questões globais. A Unilever criou um vídeo muito emocionante, que mostra um pai indo até um templo agradecer pela vida de seu filho, e sendo seguido por vizinhos da sua comunidade. Alguém de fora vê a cena e pergunta o que há de tão especial nesse ritual. Então, um sujeito lhe explica que o pai está celebrando o fato de o seu filho estar vivo ao completar cinco anos. Isso porque algumas regiões na Índia perdem milhões de crianças para doenças simples, como diarreia, que poderiam ser evitadas apenas com bons hábitos, como lavar as mãos. A Unilever patrocionou essa campanha e não vai ganhar nada com ela. 

 

Quais são os planos do IMD para o Brasil?

Estamos trabalhando num projeto de formação de líderes globais. Vamos reunir cinco ou seis empresas para ajudá-las, de maneira prática, a desenvolver seus projetos, criar seus planos, seus balanços, ver seu potencial de crescimento, trabalhando adaptados à realidade local.

 

E qual é sua visão sobre a nossa realidade atualmente? 

Dez anos atrás, meu trabalho era convencer os europeus de que o Brasil estava finalmente começando a decolar. Agora, tento baixar as expectativas deles. Mas a presidenta Dilma tem o grande desafio de investir em infraestrutura e não investir tanto no crescimento pelo consumo. Onde está o trem-bala? Há muito para fazer e melhorar. 

 

Mas aqui não há tanta torcida pelo trem-bala. O sr. avalia que é uma obra fundamental?

Vocês precisam dele. Hoje o Brasil está focando mais em quantidade e menos em qualidade. Por isso, o IMD investe aqui, para ajudar a desenvolver talentos. A primeira tarefa dos brasileiros é investir em inovação para que sejam competitivos. Para mim, aliás, um termômetro da competitividade de um país está no tempo gasto nas filas de imigração. E aqui é muito demorado. Até a fila de Cuba é mais rápida que a do Brasil.